Certa vez, uma querida amiga me
perguntou por qual motivo eu assino “Elton Luiz Leite de Souza”, e não apenas
“Elton Souza” ou “Elton Leite”, nome e sobrenome mais fáceis, digamos
assim, de gravar. Já me fizeram essa
mesma pergunta antes, e sempre respondo assim: quando comecei a dar aula, gostava
de assinar apenas “Elton Luiz”, sem sobrenome. Eu assim o
fazia por homenagem à minha bisavó que era índia, não deixando sobrenome na história (assim como extinguiram
o nome “Pindorama”). Porém, nunca respeitavam
esse meu desejo nos diários de classe. Embora não dissessem abertamente,
pareciam considerar “Elton Luiz” um nome muito bastardo. Acontecia então uma
bagunça: às vezes escreviam “Elton Luiz Leite” nos diários de classe , noutras
“Elton Leite ”, o mais comum era
escreverem “Elton Souza”. Nos primeiros artigos que escrevi, então, ninguém
aceitava o singelo “Elton Luiz". Por considerarem “Elton Luiz Leite de Souza” muito grande,
escreviam abreviando : “Elton L L de Souza.” O curioso é que meu nome não seria
“Elton”. Meu pai, que era fanático por futebol, certa vez chegou em casa e
disse para minha mãe: “Já sei como será o nome do nosso primeiro filho!”.
Desconfiada, minha mãe pôs a mão na
cintura e perguntou: “Qual?” . “Amarildo !”, disse cheio de esperanças meu pai
( “Amarildo” era o nome de um famoso futebolista da época). Minha mãe apenas
disse: “Não”. Meu pai nem insistiu...Nada contra o “Amarildo”, mas ainda bem
que , lá em casa, quem mandava era minha mãe. Foi ela que decidiu pelo “Elton”.
Anos depois, descobri que “Elton” significa: “aquele que nasceu em Ella”.
“Ella” era uma cidade mítica céltica. Segundo tal mitologia, essa cidade tinha
uma característica: todos que lá nasciam se tratavam como iguais, com plena
justiça. Assim, eu achava que “Ella”
tinha algo de uma taba ou tribo onde viveu minha bisavó. Como boicotavam meu “nome menor” ( “menor” , ensina Deleuze, é tudo
aquilo que, por ser singular, foge ao “padrão”) decidi de uns tempos para cá assinar
o nome completo, tal como aparece aqui no face . Juro que não é por vaidade ou pretensão
que faço isso , é só mesmo por pura
consideração àqueles que escolheram meu nome e sobrenome. Quanto à minha bisavó
índia, embora ela não esteja no sobrenome, sinto que é forte sua presença em meu sangue.
Hoje é “Dia dos Avós”. Ao falar da minha querida bisavó, queria
também falar de nossos Ancestrais. Tudo o que eu queria dizer, Manoel de Barros
já diz por nós:
“Tenho em mim um sentimento de aldeia
e dos primórdios. Eu não caminho para o fim, eu caminho para as origens. Não
sei se isso é um gosto literário ou uma coisa genética. Procurei sempre chegar
ao criançamento das palavras. O conceito de Vanguarda Primitiva há de ser
virtude da minha fascinação pelo primitivo. Essa fascinação me levou a conhecer
melhor os índios.”
(nunca conheci pessoalmente essa minha bisavó, ela já era falecida quando nasci. A única coisa que vi dela foi uma foto em preto e branco muito antiga, quase se apagando. Eu era criança e a imagem me tocou muito...Anos depois, eu já adulto e trabalhando, tive um primeiro e único sonho com ela. Eu passava por uma situação difícil à época, semelhante a essa na qual vivemos agora. No sonho , ela apareceu vestida de colares e com um cocar multicolorido adornando a cabeça, cujos cabelos eram compridos e muito brancos. Havia um céu de um azul indescritível emoldurando sua cabeça. Ela só me disse uma coisa no sonho : "Abra seu olho cósmico, não há o que temer..."Após a fala dela, imediatamente acordei e me lembrei de uma carta escrita por Espinosa a um amigo que lhe indagava acerca do sentido de mensagens que nos chegam por intermédio dos sonhos. Segundo Espinosa, na vida em vigília temos a ilusão de que somos pontos descontínuos uns aos outros. Mas quando sonhamos o ego individual fica enfraquecido, e assim podemos ter a experiência, ainda que imaginativa, de que nossa vida faz parte da mesma linha dos que nos antecederam, sendo também parte da linha vital dos que nos sucederão. No sonho, é a imaginação que tenta visualizar esse processo de continuidade, porém é apenas despertos que conseguimos pensar essa continuidade e compreendê-la , desde que vençamos a limitação reativa do ego )
(nunca conheci pessoalmente essa minha bisavó, ela já era falecida quando nasci. A única coisa que vi dela foi uma foto em preto e branco muito antiga, quase se apagando. Eu era criança e a imagem me tocou muito...Anos depois, eu já adulto e trabalhando, tive um primeiro e único sonho com ela. Eu passava por uma situação difícil à época, semelhante a essa na qual vivemos agora. No sonho , ela apareceu vestida de colares e com um cocar multicolorido adornando a cabeça, cujos cabelos eram compridos e muito brancos. Havia um céu de um azul indescritível emoldurando sua cabeça. Ela só me disse uma coisa no sonho : "Abra seu olho cósmico, não há o que temer..."Após a fala dela, imediatamente acordei e me lembrei de uma carta escrita por Espinosa a um amigo que lhe indagava acerca do sentido de mensagens que nos chegam por intermédio dos sonhos. Segundo Espinosa, na vida em vigília temos a ilusão de que somos pontos descontínuos uns aos outros. Mas quando sonhamos o ego individual fica enfraquecido, e assim podemos ter a experiência, ainda que imaginativa, de que nossa vida faz parte da mesma linha dos que nos antecederam, sendo também parte da linha vital dos que nos sucederão. No sonho, é a imaginação que tenta visualizar esse processo de continuidade, porém é apenas despertos que conseguimos pensar essa continuidade e compreendê-la , desde que vençamos a limitação reativa do ego )
O livro acima é só uma sugestão
para quem desejar conhecer algumas belíssimas
histórias que narravam os povos originários. De forma interessante, o autor
prefere a expressão “histórias indígenas” do que “mitologia indígena”,
explicando que o termo “mitologia” é empregado às vezes de forma pejorativa em
contraposição à noção de “história”, como reveladora da “verdade dos fatos”. Mas
esse tipo de oposição vale para a sociedade branca-europeia, cuja história se
pretende hegemônica. No caso dos povos indígenas, não há separação entre a
fabulação narrativa e seu ethos originário. Assim, chamar essas narrativas de
“mitologia” seria colocá-las no mesmo lugar
subordinado em relação à história dominante europeia.
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