Platão conta
mais ou menos a seguinte história: angustiado pelas perguntas que não cabiam
dentro dele, um jovem resolveu buscar respostas nos livros. Leu livros de história , de ciências e até de matemática.
Porém, palavras escritas e números não
lhe davam as respostas. Imaginou que as respostas talvez soubessem aqueles que
já viveram muito. Assim, adquiriu a arte de abrir seus ouvidos, para
que por eles entrassem as palavras dos sábios vividos .
Contudo, quanto
mais ele lia os livros e ouvia os sábios
, mais angustiado ficava, como se o
muito saber aumentasse a percepção de que ele não sabia nada...
Até que um dia
ele sentiu algo estranho sob a parte de trás da camisa; passou a mão e percebeu
que alguma coisa lhe crescia nas costas. Era algo pontiagudo,
porém não feria ou cortava. Essa realidade desconhecida crescia mais a cada dia e, com ela, a angústia.
Ele tentava
esconder de todos aquela realidade, embora lhe fosse impossível escondê-la de
si. Até que certa manhã ele viu o que , enfim, estava nascendo nele, pois
aquilo que nascia já não podia se esconder: nasceram em suas costas um par de
asas, as asas da Razão. E é assim, segundo Platão, que nasce um
filósofo: para voar para longe do corpo. Pois quanto mais essas asas crescem,
mais esta vida que vivemos aqui parece
ser uma gaiola. “Filosofar”, segundo Platão, “é aprender a morrer.”
Espinosa pensa
diferente o que é a filosofia . Para ele, as asas pensantes não nascem apenas no
filósofo , elas nascem do que Espinosa chama, em latim, de “cupiditas”.Essa palavra vem de “Cupido” . Muitos
confundem “Cupido” com “Eros”, porém há mais em “Cupido” do que em “Eros” ( o “Amor”). Pois enquanto Eros forma
par apenas com Psiquê (a Alma) e desconsidera o corpo, Cupido une Alma e Corpo,
o Pensar e o Sentir.
Por isso, Cupido
não é asas do Amor ou da Razão, ele é “Asas do Desejo”. “Cupiditas” é como Espinosa
chama o Desejo. Quando essas asas se
abrem em alguém, também se potencializam
nesse alguém em algum grau o sentir e o pensar ,mesmo que esse alguém não seja
um poeta ou filósofo. Pois o pensar e o
sentir são Potências da Vida: filosofar é aprender a viver. Não só a angústia faz crescer as asas,
também a faz crescer a alegria.
As Asas do
Desejo lembram as asas do albatroz que,
em seu voar , voa muito longe do litoral ; por isso, depara-se com tempestades
em pleno oceano. Mas ao invés de recuar, ele segue em frente e atravessa a
tempestade pelo meio. A grandeza das asas é proporcional ao tamanho dos riscos que
se enfrenta.
“Uma única metáfora é capaz de dizer mais do que longos
discursos.”( Lamy)