Evento em homenagem ao poeta Manoel de Barros. Em breve , traremos mais informações.
Agradeço ao professor Marcos Aurélio Marques, pela ajuda na organização, e a Savana Godoy, pela programação visual.
textos e desenhos : elton luiz
Evento em homenagem ao poeta Manoel de Barros. Em breve , traremos mais informações.
Agradeço ao professor Marcos Aurélio Marques, pela ajuda na organização, e a Savana Godoy, pela programação visual.
Uma letra diz
mais sozinha ou agenciada à outra, formando uma sílaba? Uma letra diz mais
sozinha ou numa sílaba que faz parte de uma palavra? E em qual tipo de palavra
as letras agenciadas teriam mais a dizer: na palavra mentirosa ou na palavra
autêntica? Na palavra que xinga ou na palavra que canta? Na palavra que sai da
boca de um milic0 que grita ordens ou na
palavra que nasce da boca de um educador que desperta autonomias?
Se uma letra
fosse como o ego de um egoísta, talvez ela imaginasse que é o indivíduo isolado
que tem primazia, tal como prega um neoliberal individualista. Porém louca
seria a letra que julgasse dizer mais sozinha do que fazendo parte de uma
sílaba, na vida de uma palavra, no coração de uma frase , dando existência a um
livro.
Pois é na
imanência de um livro, como parte de seu plural sentido, que uma letra de fato
pode ampliar-se e expressar a si mesma naquilo que expressa o livro, desde que
o livro não seja apenas letras mortas no papel , mas expressão de um dizer vivo
cujo sentido seja aberto às interpretações criativas que lhe acrescentem novas
e plurais perspectivas, como Obra Aberta.
“Minhas palavras
não se ajuntam por sintaxe, mas por afeto.”(Manoel de Barros)
“A palavra abriu
o roupão para mim : ela quer que eu a seja.” ( Manoel de Barros)
“A poesia está
guardada nas palavras, é tudo o que sei.” ( Manoel de Barros)
(Imagem: estive recentemente
visitando o Museu-Casa Quintal Manoel de Barros e tirei esta foto. Lá pude
constatar uma verdade, uma verdade poética sempre dita pelo poeta: que o
quintal dele é maior do que o mundo. Não maior em termos físicos, mas na
capacidade de horizontar a mente e o coração, transmutando-os em Obra
Aberta. A expressão “Obra Aberta” é do
filósofo Umberto Eco . Uma sociedade plural e democrática também deve ser uma “Obra
Aberta”, como antídoto a toda forma de f@scism0 e aut0ritarism0)
As ciências
humanas ensinam que o ser humano nasceu de um processo: a sublimação. O ser
humano é, ao mesmo tempo, o criador desse processo e o seu produto. A arte, a
cultura e a civilização são resultados desse ato de sublimar.
A palavra
“sublimação” não significa repressão daquilo que em nós é animal e instintivo,
pois em “sublimação” está presente a ideia de “sublime”, um afeto nascido da
ampliação ou potencialização do nosso pensamento agenciado à sensibilidade . Na
física, “sublimar” designa a passagem de uma substância de um estado sólido,
pesado, para um estado gasoso ou fluido.
Assim, sublimar
é transmutar uma energia, ampliá-la, encontrando para ela novos meios, canais e
objetos. A cultura humana é um processo de transmutação de uma energia animal,
instintiva, pulsional. Na natureza, essa energia faz-se instinto que, por intermédio
dos órgãos do corpo, busca satisfazer-se imediata e diretamente . A cultura
nasce da sublimação-potencialização dessa energia , para assim criar para ela
novos objetos, objetos simbólicos.
“Potência” e
“energia” não são termos sinônimos. A potência é uma transmutação da energia,
para assim fazê-la força criadora. Transmutar é fazer nascer, de uma realidade
dada, uma realidade nova (tal como a borboleta que se transmuta da lagarta).
A potência se
aumenta transmutando-se no produto que ela cria. A energia pulsional é uma
expressão das mesmas leis que regem e determinam o mundo físico; porém a
potência vital é criação de novos sentidos para a vida, por intermédio de
ideias, cultura e arte.
Mas a sublimação
tem seus inimigos, que são os mesmos inimigos da cultura, da arte e da ciência.
O inimigo da sublimação não é o instinto ou a pulsão, o inimigo da sublimação é
a barbárie. “Barbárie” significa “aviltamento”, no sentido de “tornar baixo”,
“vil”. A barbárie torna o homem baixo e vil , apequenando-o.
A lógica da
barbárie é a da guerra. Guerra não no sentido de meio de luta contra as
tiranias e injustiças, mas guerra como um fim nela mesma, a guerra vil como
instrumento da necr0polític4.
Enquanto a
sublimação é o esforço vital para vencer as tiranias, a barbárie faz da tirania
o seu Deus teológico-político. A barbárie não faz política, ela faz guerra
contra a política; a barbárie não promove cultura, e sim guerra contra a
cultura. A guerra deles é a guerra suja: com uma das mãos seguram armas , com a
outra celulares para bombardearem fake news , como o bolsonarista governador do
Rio Cláudio Castro e suas vilezas.
( imagem: em
protesto contra a violência , uma moradora de uma comunidade pobre do Rio
planta flores no buraco das balas...)
Há dois sentidos
para a palavra “nada”. O primeiro deles vem de “nihil.” Essa palavra é a origem
de niilismo. Além de “nihil” significar “nada”, nihil também significa “nulo”.
No Direito, por exemplo , usa-se a expressão latina “nihil” para designar atos
que são juridicamente nulos.
Nesse último sentido, niilismo
não é um culto ao “Nada” ou ao “Nirvana”, niilismo é um comportamento que é
nulo, sem autenticidade. Por exemplo, o inelegível vivia evocando a ideia de “Verdade”, porém
essa ideia de “Verdade” na boca dele é nula , pois anula a própria ideia
autêntica de verdade.
A “Verdade” dele
não é uma mentira, é uma “nulidade”: enquanto a mentira se explica no âmbito da
linguagem, a nulidade é mais grave, uma vez que ela expressa uma estreiteza
existencial.
Muitos
espertalhões evocam a palavra “Deus” como cabo eleitoral deles. Embora falem em
Deus para combater o “ateísm0 c0munist4”, esse Deus deles, porém, anula a
própria ideia do que se espera que seja Deus: esses espertalhões anulam a ideia
de Deus muito mais do que a negação feita pelos ateus.
O autêntico anarquismo
nega a necessidade de partidos, mas não nega a política; já o PSL e os partidos
do “centrão” são nulos de ideias políticas. Uma coisa é negar uma realidade,
outra bem diferente é tornar nula uma realidade pela inautenticidade com a qual
ela é usada.
Mas há outro
sentido para a palavra “nada”, originado do latim “nata” ( raiz de “natal”:
“lugar onde se nasce”). Esse sentido talvez explique por que Manoel afirma que
sua poesia vem de suas “natências” ou “nadifúndios”, enquanto riqueza de vida
para nos proteger das nulidades niilistas.
O saber que
apreende esses “nadifúndios” chama-se: ignorãça. Ignorãça não é ignorar o nome
das coisas, ignorãça é saber de coisas que ainda não têm nome : “As coisas que
ainda não têm nome são mais ditas pelas crianças”, diz o poeta. Uma caneta de
ouro nas mãos de um niilista, mesmo que ele tenha poder e dinheiro, escreve só
pobreza. Já o simples lápis do poeta retira do nada de suas natências a sua
riqueza.
O poeta põe
nascimento em seu lápis para que a gente, ao lê-lo, de vida se enriqueça:
“Na ponta do meu
lápis tem apenas nascimento.” (Manoel de Barros)
“Não há arte que
não seja uma liberação de uma força de vida. Não há arte da morte.” (Deleuze)
Tempos atrás, numa bela manhã de outubro, vi passar um senhor bem idoso,
porém firme e altivo. Vê-lo fez reviver
dentro de mim uma palavra que há muito
eu não dizia. Foi a “potência-alegria”
de que fala Espinosa o que senti ao saber
que tal palavra ainda em mim vivia , à espera de reencontrar aquele a quem ela designa e
nomeia.
Essa palavra não estava escrita no meu cérebro
onde se acumulam teorias, ela estava
guardada em meu coração ,lugar do Afeto,
junto à lembrança dos seres que conheci e que me tornaram o que sou.
Foi então do coração que a palavra
veio subindo, já com pleno sentido, embora ainda sem se vestir com o som.
Quando ela chegou à minha boca, tornou-se voz e chamou: “Mestre!”. Aquele senhor era um querido professor que tive há muito tempo.
Coincidentemente, o Dia dos Professores estava próximo...
Ele me reconheceu , sorriu e estendeu
a mão para mim, encontrando a minha que já lhe estava estendida desde a primeira aula dele que assisti . Não sei ao certo quanto tempo conversamos, o
durar do afeto não o mede relógios.
Quando nos despedimos, fiquei parado
vendo-o ir, e pensei: “Será que ele sabe o quanto foi importante em minha
vida?”
Antes de ele ir, olhei seu rosto e tive a impressão de que ele
também estava a recordar-se do mestre
que teve e que o inspirou a ser mestre, e por isso ele entendia minha gratidão.
E esse outro mestre do mestre, se vivo estiver, também deve estar se lembrando,
hoje, daquele que o fez mestre: “O
aprender vem antes do ensinar”, lembra-nos Deleuze.
O autêntico professor gosta de
ensinar porque, antes, amou aprender com aquele que lhe ensinou lições que não estão apenas
em livros, mas também nas ações.
Creio
que nos tornamos professores quando o mestre que nos fez mestre não
vive apenas fora, ele passa a viver dentro da gente, e com ele continuamos a
aprender , mesmo enquanto ensinamos.
Por isso, hoje também é dia de cada
professor se lembrar daquele do qual foi aluno no aprendizado do mundo e de si
mesmo. Pois essas lições são o conteúdo vivo de toda aula que, crítica e
criativamente, renova o sentido emancipador , singular e coletivo, da educação.
Assim, apenas
sob certa perspectiva aquele meu antigo mestre se afastava de mim, sob outra perspectiva ele nunca de mim saiu desde que , com suas aulas, em minha vida
entrou , passando a viver na companhia de
outros queridos mestres que
igualmente entraram em mim e me tornaram
o que sou : a querida Professora Nadir (
minha primeira professora de filosofia e quem me libertou), o inesquecível Cláudio Ulpiano, o generoso Luiz
Alfredo Garcia-Roza , o grande Gerd Bornheim e o sábio Junito Brandão : “O melhor de mim sou
Eles.”(Manoel de Barros)
Um abraço às professoras e
professores por seu dia!
( imagem: o professor Deleuze na
companhia de alunas e alunos)
No poema “Achadouros”,
Manoel de Barros nos fala de uma sábia contadora de histórias que ele conheceu
quando criança. A sábia ensinava haver “achadouros” em Corumbá.
No sentido literal, os
“achadouros” eram buracos que os holandeses cavaram antes de fugirem do Brasil
séculos atrás.
Com o ouro surrupiado do
rico subsolo de nossa ancestral Pindorama, os holandeses fabricaram moedas nas
quais estamparam a coroa holandesa. Depois eles esconderam essas moedas de ouro
nos tais buracos abertos no fundo de quintais, para que não ficassem com elas
os colonizadores da coroa portuguesa, seus rivais.
Durante muito tempo em
Corumbá, movidos pelo desejo de encontrar tais tesouros, os homens escavaram
quintais para ver se ali achavam o ouro rapinado pelos colonizadores.
Mas o poeta compreendeu
que a sábia falava também de outros “achadouros”, enquanto espaços a descobrir que
guardavam diferentes tesouros.
Seguindo a lição da
sábia, o poeta aprendeu a descobrir “achadouros” onde estão guardadas
riquezas que não vêm da usurpação do
homem sobre o outro, riquezas que são, para a vida digna, verdadeiramente
preciosas: escavando a palavra, o poeta acha nela sentidos novos não
colonizados; escavando em si mesmo, o poeta acha horizontamentos libertários
que partilha com os outros.
Com sua arte que faz
pensar, sentir e desperta, o poeta “desabre” nossos habituais olhos que o leem para
que em nós achemos, quem sabe, olhares novos.
E toda essa riqueza que o poeta acha, e generosamente partilha
conosco, vem da potência transbordante de vida que, empoemando-o, guardou-se
dentro do poeta como tesouro, cujo valor não se mede em moeda, capital ou ouro.
“Na ponta do meu lápis tem apenas nascimento” é um verso de Manoel.
Esse verso pode ser interpretado de muitas maneiras . O lápis expressa o
veículo de expressão do poeta, o instrumento que une sua mente e corpo. Na
ponta do lápis do poeta nascem ideias que fazem nascer também ideias em quem o
lê. Esse ato de dar nascimento a realidades que potencializam a vida pode ser
um antídoto à necropolítica, e é por
isso que esse verso também é, em sua essência, político.
Em breve, colocarei a programação completa do evento.
Segundo a mitologia, Hades é a divindade que habita a região
trevosa muito abaixo da superfície da terra. Nesse lugar nenhuma luz
entra.
Certa vez, porém, Hades ouviu uma voz cheia de vida vindo da
superfície. Ele subiu e viu que era Perséfone cantando... Ela estava com sua
mãe , a deusa Ceres. De “ceres” vem “cereal”, pois Ceres é a divindade do
plantio e colheita dos cereais.
Ceres , por sua vez, é filha de Cibele, a
divindade da fertilidade. Cibele é o Feminino Ancestral ( os povos
originários da América a chamam de Pachamama).
E foi em sua neta Perséfone que a fertilidade de Cibele se tornou
uma força criativa semelhante àquela que vemos no artista, pois Perséfone é a
divindade cuja arte é fazer nascer flores: múltiplas e heterogêneas,
flores de todas as cores.
Perséfone mata outra fome diferente daquela que Ceres mata: Perséfone
mata a fome de arte, de poesia e de criatividade.
Hades se apaixonou pelas flores e quis levá-las para enfeitar sua noite
eterna. Foi uma imensa surpresa, ninguém imaginava que pudesse
nascer no taciturno Hades um desejo por cores.
Num ato condenável, Hades raptou então Perséfone para fazê-la morar lá
embaixo . Porém, naquele mundo carente de luz , de Perséfone nasciam rosas só
com espinhos , sem as pétalas, flores da dor que elas eram.
Enquanto isso, sentindo a falta de Perséfone, Ceres ficou deserta : o
grão não mais germinava nela. Havia agora fome de pão e de beleza, de pão e de
poesia, e ninguém sabia qual das duas fomes doía mais: a primeira esvaziava o
estômago, a segunda ao coração secava.
A pedido de Ceres, Zeus interveio e foi feito então um acordo. Durante
parte do ano Perséfone viveria lá embaixo com Hades : sua ausência entre nós
recebeu o nome de inverno.
Até que vem o ansiado tempo em que Perséfone sobe de volta e
enche de vida a terra : tudo recomeça , renovado.
Hoje, as sombras não reinam somente lá
embaixo, mentalidades sombrias piores nos
ameaçam aqui em cima . Apesar disso, nada detém Perséfone
e sua primavera, tempo em
que Perséfone chega para florir de vida a terra.
“O céu da teoria é cinza;
mas sempre verdejante é a árvore da vida.”
(Goethe)
“Eram os passarinhos que colocavam
primaveras nas palavras.”
(Manoel de Barros)
( imagem:“O abraço amoroso de Pachamama”/Frida Kahlo)
Muito se fala,
com razão, das flores. Girassóis, crisântemos, margaridas...Essas e outras
flores já foram homenageadas em poemas , músicas e pinturas.
Flores também
são empregadas como símbolos: o lírio é símbolo da pureza e Iluminação; a rosa
vermelha, das revoluções igualitárias.
Com a chegada da
primavera, essas flores são ainda mais lembradas...
Mas pouco se
fala das flores que o cacto também sabe produzir. Considero essa omissão uma
injustiça com esse artista da resistência. Na dele, sem chamar a atenção ou
fazer propaganda de si, o cacto é capaz de atos que expressam rara beleza e
simbolizam generosidade.
Assim age esse
perseverante e resistente poeta da natureza : o cacto é a planta que possui a
maior raiz. Em alguns cactos, a extensão de sua raiz chega a nove ou dez vezes
o tamanho do corpo do cacto que vemos à superfície do chão!
Quem mede o
cacto apenas pela sua parte visível, e pensa que a parte que vê é todo o ser do
cacto, por certo ignora o que o cacto é capaz de fazer. O cacto cria imensas
raízes para sondar o subsolo , não se deixando vencer pela aridez que o cerca.
As raízes do
cacto tateiam procurando veios d’água metros abaixo da paisagem seca. Ele
persevera procurando no coração da Mãe-Terra a água que o Céu lhe nega.
Quando encontra
a água, o cacto anuncia sua descoberta brotando flores: em pleno árido , ele
inaugura uma primavera. Então, ele sorve o líquido e se intumesce, de água
fresca ficando grávido. Basta um pequeno furo para a água jorrar matando a sede
dos necessitados.
Foram os cactos
do sertão nordestino que, no passado, não deixaram morrer de sede a rebeldia de
Lampião e seu cangaço ; e a flor que Maria Bonita punha no cabelo também
floresceu de um cacto : o mandacaru, símbolo da força do povo nordestino.
O cacto
mandacaru expressa a resistência da vida, uma resistência que também se faz com
poesia e beleza, apesar da aridez que a cerca. O mandacaru matou a sede de
Lampião e deixou a Maria ainda mais Bonita.
Como ensina o
grande poeta nordestino: “Quando não pode ser cristal, a poesia vale pelo que
tem de cacto.”(João Cabral de Melo Neto)
(imagem: os
cactos-poemas de João Cabral / o mandacaru e sua flor)
Em suas obras políticas, Espinosa
critica a ideia de liberdade como “independência”. Para ele, ao contrário, toda
liberdade autêntica é sempre a construção e afirmação de algum tipo de relação
da qual dependemos para sermos livres.
Pois nada é livre vivendo à
parte, toda liberdade é uma forma de relação ou agenciamento. Ser livre não é não
depender de nada, ser livre é depender, antes de tudo , de nós mesmos para
sermos livres, uma vez que a primeira das relações fundamentais é a relação
consigo mesmo.
Um povo livre não é aquele
que se coloca à margem do mundo e em guerra com todos. Um povo livre é aquele
que mais depende de si mesmo para governar a si mesmo.
Um povo que sabe que depende de
si mesmo para construir sua liberdade nunca imagina que sua liberdade dependerá
do Mercado, da Religião , do Patrão, da Mídia, do Capital... e muito menos da
Casa-grande.
Quem governa um povo livre
é ele mesmo, pois um povo livre é aquele que mais depende de si mesmo para
construir sua história.
Um povo livre não é aquele
que imagina que houve uma data histórica no passado onde ocorreu sua
suposta “independência’. Um povo livre é aquele que a cada vez cria a
compreensão, aqui e agora, de que depende de si a construção de sua liberdade,
para assim afastar milicos aproveitadores que se imaginam “donos da
Independência”.
O governo mais favorável à luta
do povo não é aquele que se coloca “acima do povo”, como um “pai” ou
“padrasto”.
Um governo autoritário
teológico-político de pretensos “ungidos” sempre teme um povo esclarecido
e autodeterminado.
O governo mais favorável à
liberdade do povo é aquele que, vindo do próprio povo, age para que
o povo mesmo compreenda que é ele que governa ao escolher os governantes.
E que depende antes de tudo dele, do próprio povo em sua heterogeneidade,
escolher quem o auxiliará a depender cada vez mais de si mesmo na construção
histórica de seu destino.
Um povo que depende cada vez mais
de si para ser e construir a si mesmo é um povo que se educa, que cria sua
arte, sua memória e seu futuro.
Não existe “Independência do
Brasil” como se fosse um fato consumado. O que existe é a necessidade de
construção da nossa liberdade coletiva com a compreensão de que depende de nós
mesmos construirmos a nossa soberania, e que isso requer decisão, perseverança e
coragem.
E melhor ainda se pudermos fazer
isso cantando juntos, com Gil, Chico e Caetano.