terça-feira, 28 de dezembro de 2010
paisagem de dentro e de fora
Estou entre a porta
e a janela,
mas não no interior da casa.
Se com as mãos colho cometas,
com os pés danço sobre a terra.
Não maldigo quando me encerra um crepúsculo,
pois é nesse casulo que se fabrica uma aurora.
sexta-feira, 24 de dezembro de 2010
sábado, 18 de dezembro de 2010
quarta-feira, 15 de dezembro de 2010
sexta-feira, 19 de novembro de 2010
quarta-feira, 17 de novembro de 2010
sexta-feira, 5 de novembro de 2010
quinta-feira, 4 de novembro de 2010
sábado, 16 de outubro de 2010
sexta-feira, 15 de outubro de 2010
CONCURSO PARA DECÊNCIA SUPERIOR
Estou prestando concurso público para pombo.
Acho que tenho sérias chances de aprovação,
pois a banca é composta apenas por anjos;
e sempre tive queda para voar, mesmo com os pés no chão.
A prova teórica consiste em:
dissertar assoviando acerca dos limites da razão.
A prova prática consiste em:
ir buscar no céu o que sinceramente quer meu coração.
quinta-feira, 14 de outubro de 2010
I ENCONTRO COM TODAS AS LETRAS
ARTE E TEMPO
Organização: Mário Bruno
Dia 25/10/2009
08:40 Café da manhã
09:00 Mesa: “O tempo que (não) passa”
Prof. Dr. Auterives Maciel (PUC-Rio)
Prof. Dr. Elton Luiz (UniRio)
14:00 Mesa: “Arte-tempo na clínica”
Prof. Dr. Eduardo Passos (UFF)
15:00 Mesa: “Espirais do instante”
Isabelle Christ (Doutoranda -UFRJ)
Simone Manso Escobar (Doutoranda - UERJ)
Dia 26/10/2009
08:40 Café da manhã
09:00 Mesa: “Arte-fabulação”
Prof. Dr. Mário Bruno (UFF/UERJ)
Prof.ª Dr.ª Luci Ruas (UFRJ)
14:00 Mesa: “Tempos capitais”
Prof. Dr. Antônio Carlos Mateus
15:00 Comunicações
16:00 Mesa: “Música com todas as letras”
André Conforte (Doutorando em Letras pela UERJ e Músico)
Prof. Dr. André Valente (UERJ)
19:00 Encerramento: “Chorinho/samba”
Evento gratuito (sem nenhuma taxa)
Local: Universidade Federal Fluminense (UFF), Campus do Gragoatá, Faculdade de Letras, Auditório Macunaíma.
Data: 25 e 26 de outubro de 2009.
Duração: 2 dias
Inscrições: Serão realizadas no primeiro dia do evento no local acima, 20 minutos antes de se iniciarem as atividades.
Projeto Pop Filosofia (UFF) e Projeto Com Todas as Letras (UFF)
Mais informações: mariobrunouerj@yahoo.com.br
Visite o blog: http://mariobruno-popfilosofia.blogspot.com
sexta-feira, 8 de outubro de 2010
Não haver mais porta que nos separe da estrada,
nem janela que nos ponha aqui- e, lá, a paisagem sonhada.
Não haver mais parede, chão ou teto
que não deixem voar a alma.
Não haver mais nem eu ou tu;
nem espaço de dentro que não se abra ao de fora.
Só assim,
a todos recebendo e a todos visitando,
só assim habitaremos a mesma Casa.
terça-feira, 14 de setembro de 2010
trecho de conferência que será feita na Uff, em 25/10, às 9hrs, no evento ARTE-TEMPO
SOBRE O TEMPO QUE NÃO PASSA
Instalados no presente, olhamos para trás, para o passado. O que vemos nele? Antigos presentes nos quais estávamos. Imaginariamente, traçamos uma linha, uma linha reta, que vai dos antigos presentes a este presente, que também passa, como se a tivesse traçado uma finalidade da qual estivéssemos conscientes e fôssemos seu Sujeito. Porém, estarmos instalados no presente não significa estarmos instalados no tempo. Talvez este exija de nós um salto, um mergulho, um sobrevoar. Um sobrevoar os antigos presentes, mas em busca de algo que nunca foi presente: o passado. Somente estamos aptos a este sobrevôo quando compreendemos a diferença entre o passado e os antigos presentes, pois o passado enquanto tal não é um antigo presente. Quando relacionamos o antigo presente com o atual no qual estamos, nasce a ilusão mais entranhada na consciência: a do tempo como linha que vai dos mais antigos presentes ao atual, como num percurso que vai do mais indeterminado ao determinado.
Contudo, tudo muda quando relacionamos o antigo presente não com o presente atual, mas com o passado em relação ao qual ele era presente. Visto dessa forma, o antigo presente já não é mais antigo, mas novo: diferença acrescida ao passado.
E o passado, o que é? O passado puro, livre das armadilhas psicológicas da consciência, nada tem a ver com um antigo presente, isto porque o passado nunca foi presente. Em relação a todo presente, ele é Diferença. Reportado então a esse passado puro, o presente é Repetição. O que repete a diferença nunca é o mesmo. Por isso, o presente é sempre novidade que se sobrevoa, e nunca pousa no mesmo, no já visto. De certo modo, o passado não passa, o que passa é o presente. Porém, o que faz o presente passar não é o passado, é a emergência intempestiva do futuro. O passado conserva, o presente passa, mas só o futuro cria. Originalmente, as palavras “crer” e “criar” têm uma origem comum. Somente crê quem cria. E é por isso que a verdadeira crença tem por questão não o que foi ou o que é, e sim o que ainda não existe, e que precisa ser criado. Essa exigência é, no seio mesmo do que passa, o que não passa, posto que eterna e intempestiva novidade. E o que é verdadeiramente novo o é e será sempre. O que é verdadeiramente novo nunca passa, como passam as coisas que são apenas frutos de um presente sem passado e sem futuro ( como o que vige em nossos sombrios tempos...).
quarta-feira, 1 de setembro de 2010
trecho do livro "Manoel de Barros:a poética do deslimite" (Editora 7letras/FAPERJ), a sair em dezembro
No "Livro de pré-coisas" , na prosa poética intitulada "Agroval", Manoel de Barros descreve um acontecimento ordinário do pantanal. “Ordinário”, aqui, significa a mesma coisa que comum ou regular. À idéia de “ordinário” costumamos opor a noção de “extraordinário”. Vale a pena lembrar a origem matemática destes termos. Na matemática, os “pontos ordinários” de um triângulo são os inumeráveis e indistintos pontos que ocupam cada um dos lados da figura, ao passo que seus três “pontos extraordinários”, ou singulares, localizam-se em cada ângulo do triângulo. Em uma reta, por sua vez, os pontos extraordinários são dois: aqueles que ocupam os extremos da linha.
Todavia, a diferença entre ordinário e extraordinário mostra toda a sua riqueza quando examinamos o círculo. Aparentemente, tal figura geométrica é destituída de pontos extraordinários ou singulares. Mais do que uma linha reta, geralmente costuma-se afirmar que nossa vida é um círculo: o círculo de nossa vida. Então, estaria o círculo de nossa existência destituído de momentos singulares? Estaria nossa vida refém do ordinário?
Mas o círculo guarda um segredo, tanto na matemática como na vida: qualquer ponto ordinário seu pode metamorfosear-se em ponto extraordinário, se por ele passar uma tangente. No encontro da tangente com o círculo, ambos dividirão o mesmo ponto, abrindo assim o círculo a uma força que vem de fora de seus limites e contornos. Quando o ordinário se converte em extraordinário, acontece o deslimite -renovando-se a vida.
Assim, entre o ordinário e o extraordinário não existe uma diferença intransponível: é no seio do ordinário que o extraordinário acontece. “Cada coisa ordinária é um elemento de estima”, afirma o poeta. Pois, complementa, “é no ínfimo que eu vejo a exuberância”. Em "O Guardador de águas", ele revela ainda: “No achamento do chão também foram descobertas as origens do vôo.” É no ordinário do chão que o extraordinário, como vôo, é “achado”. Enfim, “o chão é um ensino”.
"O que eu descubro ao fim da minha Estética da Ordinariedade , afirma o poeta,é que eu gostaria de redimir as pobres coisas do chão".
quinta-feira, 26 de agosto de 2010
sábado, 7 de agosto de 2010
passagem
Quem me pensava morto, destruído, acabado, vencido...
desconhece o que pode o meu escudo.
Não revido aos que a mim mostram o punho.
Mas firmemente me recolho ao que sou para ao alto tomar impulso.
Não estou onde você pensa,
nem caibo em sua mente definidora.
Nunca estou pronto: sou só rascunho.
Não me atrai ouro, título ou palavra que desperdiça o sentido.
Cativam-me gestos simples , pois só estes são amigos.
O camaleão é meu mestre.
E quem não fala de si, o monge que sigo.
Sou para fora, mas brotando de dentro.
Não conto quantos sou,
mas sei que sou muitos.
Já perdi quando ganhei,
e ganhei mesmo tendo perdido.
E tudo o que aprendi lhe ofereço,
e de graça,
pois mais falsa é a lição quanto maior for seu preço.
Não preciso mais ir,
pois já estou onde quero.
E preferiria a madeira mais simples ao mármore,
se fosse para me fazer esculpido.
Despi-me de toda leitura,
para em minha boca falar o simples.
Pois quem só diz palavra no que diz,
é porque já não nasce do coração o sentido.
segunda-feira, 5 de julho de 2010
o sonho de adão
Adão, o primeiro homem, conhecia apenas o dormir: o entrar dentro do sono e nada mais ver ou sentir. O sono era, dentro de Adão, a expressão da escuridão que existia antes de a Luz realizar sua obra. Na mitologia grega, Hipnos, o Deus do Sono , é irmão gêmeo de Thânatos, o Deus da Morte. Quem entra no sono , assim nos parece, morre de alguma maneira.
Porém, dentro de Adão aconteceu , certa vez, algo misterioso. E isto aconteceu enquanto ele dormia. No meio do sono, uma Luz se acendeu. No meio da morte que o sono era, Adão renasceu: a referida Luz atingiu seus olhos, mas não os da carne, e os invisíveis olhos se abriram pela primeira vez. Como uma aurora anunciando um novo dia , despontou ,na noite do sono, as cores do primeiro sonho. Algo em Adão se fez dia, paisagem, vida - embora ele dormisse ainda. Sonhando, pela primeira vez Adão via. E ele viu mais claro do que sob a luz do dia que Deus fez. E o que ele viu? Adão viu, pela primeira vez, Eva. Nunca antes ele a vira, pois Eva não fora feita pela Luz que fizera os dias. E estes, outrora perfeitos, incompletos agora se revelavam, pois nestes Eva não vivia . Mas ali estava ela agora, luz nascida do desejo e do sonho de Adão. Não houve antes o sonho e depois Eva, pois Eva era o sonho que nascia de dentro do sono, apagando-o por completo , dando ao sono um sentido. Eva era a luz que iluminava, por completo, a face interna de Adão.
Então, Deus viu Eva, a viu através dos olhos fechados de Adão, que estavam como nunca abertos. De olhos fechados, Adão sorriu pela primeira vez; e falava com as palavras que Deus lhe ensinara , e só agora elas pareciam realmente terem completo sentido, vez que eram ditas para Eva. Assim nasceu o poema, como palavra que se diz para o ser que nasce no sonho, e neste vive.
Enquanto Adão sonhava, Deus retirou-lhe uma costela, uma porção de sua matéria, e ali esculpiu o que Ele, através de Adão, via. E assim nasceu Eva, não como simples fruto da costela, como erradamente se interpreta, mas como fruto que nasceu do desejo de Adão. E neste desejo não havia, como não há, pecado. Nas asas desse desejo Adão, como um anjo, voou. E este Adão que assim voou, o Adão-Poeta, nunca o alcançará o Adão que nunca sonha, e que do voo só conhece a queda.
segunda-feira, 10 de maio de 2010
a calça
Quando eu era adolescente, não querendo dar trabalho à minha mãe e desejando exercer um pouco de autonomia, fui eu mesmo, certo dia, lavar uma calça jeans minha. Como não tínhamos máquina de lavar, fiz a tarefa à mão.Após lavá-la, coloquei então a calça para secar, estendida no varal de nosso pequeno quintal.
Na manhã do dia seguinte, notei que a calça havia caído do varal, provavelmente arremessada por algum vento mais forte. Uma das pernas caiu dentro de uma bacia com um líquido que eu pensara ser apenas água. Peguei a calça e a pus novamente para secar.
Horas depois, percebi que o líquido da bacia não era apenas água, mas sim água sanitária, pois a perna que caíra no recipiente estava completamente desbotada.
Minha percepção se sentira atraída por aquele efeito diferente, que nunca antes eu vira em calça alguma. Peguei a calça e resolvi mergulhá-la por inteiro na bacia com água sanitária...
No dia seguinte, vi o resultado: aquela calça , paradoxalmente, era e não era mais uma calça, pois ela se tornara um signo através do qual eu poderia expressar o mundo que eu trazia dentro. Nunca antes eu havia visto uma calça assim, e era isso que me fazia ver algo de novo nela. Subtraída do comum ao qual pertencia, a calça agora se tornara um ser singular cuja positividade maior era a sua diferença.
Ao pôr a calça, eu vestia não apenas meu corpo, mas também meu espírito - pois este, por ser diferente, somente por algo diferente pode ser vestido.
Quando sai à rua, algumas pessoas me interrogavam com um olhar curioso, enquanto outras me julgavam com um olhar de reprovação. Percebi então a tirania do senso comum, que logo se mostra quando algo destoa de seu olhar homogenizador e padronizante. Tive que tomar naquela breve situação a mais importante decisão, que certamente determinaria minha vida dali por diante: ou voltar para casa e colocar uma calça/alma igual a de todos, ou continuar sendo o que era, e enfrentar o inimigo que também estava dentro de mim... Decidi seguir meu caminho e afirmar minha diferença enfim vestida .
Chegando ao colégio, um amigo do peito gostou do efeito, pois a alma dele, como a alma de quase todos, estava nua e queria também vestir-se. Mostrei-lhe como se fazia, a alma dele também se vestiu, e assim eu já não estava mais sozinho.
sábado, 17 de abril de 2010
Dioniso
A história de Dioniso começa com a paixão de Zeus por uma simples mortal, a princesa Sêmele. Seduzida pelo deus, a mortal engravidara. Desse amor entre Zeus e Sêmele nasceu então Dioniso. A natureza de Dioniso se compunha desses dois mundos, nele misturados: o mundo eterno dos deuses e o mundo temporal dos homens.
Quando Dioniso era ainda uma pequena criança, fora vítima de terrível violência: seus irmãos da parte divina, enciumados com a beleza do deus-criança, avançaram sobre ele e, com atroz fúria, o fizeram em pedaços. Quando Zeus chegou, diante dele apresentou-se a sinistra cena: esquartejado, o corpo do deus-criança estava a um canto jogado. De súbito, Zeus perguntou a si mesmo: “Em qual dessas partes Dioniso está por inteiro? Pois a partir dela posso fazer renascer o deus”. Zeus descobriu então que a parte do corpo que guardava Dioniso era exatamente o coração, pois o coração era a sua parte eterna. O coração enquanto sensibilidade e afeto,ponto onde vida e arte estão inseparáveis.O coração não se explica pela quantidade material que se pode despedaçar,pois ele é a integridade de uma qualidade indestrutível. Zeus recriou novamente o deus Dioniso, fazendo este nascer de novo a partir do coração do deus-criança. Esse fato explica o nome do deus: Di-oniso, “aquele que nasceu duas vezes”.
Contudo, o segundo nascimento foi, na verdade, um renascimento. Isto explica a grande força desse deus: a todos aqueles cuja vida foi despedaçada ou violentada por algum motivo, Dioniso socorre com a crença em uma vida renovada, intensificada. Enquanto o nascimento biológico ocorre uma única vez, o renascimento através do coração pode acontecer inúmeras vezes, pois o coração, enquanto morada do desejo, nele nos mantém inteiros .
segunda-feira, 29 de março de 2010
as duas paisagens
"Na plenitude da felicidade cada dia é uma vida inteira".
Goethe
Segundo Fernando Pessoa, existem duas paisagens: a paisagem de dentro e a paisagem de fora. Cada uma delas possui um sol: o sol da paisagem de fora é esse astro incandescente que vemos no céu todos os dias (às vezes inclemente, como em dezembro; noutras, atrás de nuvens que o encobrem, como acontece em junho).
O sol da paisagem de dentro é o coração. No entanto, enquanto na paisagem de fora há uma lei férrea de sucessão das estações (o inverno sucede ao outono, este por sua vez sucede ao verão, e este último se segue à primavera), na paisagem de dentro uma outra lógica se opera: por vezes, dura dentro de nós um verão interminável:sob o crivo de seu meio-dia, tudo o que é sombra se desfaz. Noutras vezes, ao contrário, se instala na paisagem de dentro um inverno de densas tempestades e bruscas nevascas: em pleno meio-dia, já é noite... Some de nossas vistas espirituais o caminho que nos levava ao que desejávamos, tateamos numa noite que nos vai dentro. Mesmo que na paisagem de fora esteja a brilhar um sol de dezembro, em plena Ipanema, o inverno de dentro às vezes perdura, invencível ─ achamo-nos no Alaska.
E o mais estranho é que, na paisagem de dentro, por vezes esse mesmo inverno é substituído por um verão que chega sem aviso. Então, a neve que antes nos imobilizava, prontamente se derrete: torna-se a poça d’água na qual vemos refletido o céu azul que , de tanto andarmos de cabeça baixa, esquecemos que existia.
A felicidade suprema talvez seja quando os dois sóis (o sol de fora girando em seu céu misterioso e o sol de dentro pulsando em seu céu mais misterioso ainda) brilham juntos numa primavera de renovação ou num outono sem pressa , onde aquece o lume de uma felicidade conquistada , contentemente viva : beatitude.
domingo, 21 de março de 2010
sexta-feira, 12 de março de 2010
quinta-feira, 11 de março de 2010
sábado, 27 de fevereiro de 2010
quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010
A VERDADEIRA NOBREZA
Ele se chamava Angenor, com esse nome nasceu.Angenor era um homem negro, simples , que mal fizera o primário. Morava na Mangueira; a Mangueira morava nele.Aprendeu a traduzir no violão o que lhe falavam as rosas. Escrevia poemas; via poesia onde todo mundo só via pobreza e miséria. Aos que só olham o chão, ele aconselhava:"Corra e olha o céu...", o "céu que a todos cobre" de forma igual.
Para ganhar a vida,já que de poesia não dava, foi trabalhar como operário de obras.O chapéu que ele usava nas obras era igual ao de todos: chapéu de operário, ordinariamente comum. Porém, o modo como ele punha o chapéu, a maneira como ele andava ,cheio de classe e elegância, fez um companheiro de obras ironizar:"Angenor,acorda: isso é só um chapéu de operário, não é uma cartola!".
E foi desse útero poeticamente subversivo, que subvertia o sentido ordinário das coisas, que nasceu Cartola, cuja nobreza de alma tornava nobre tudo o que tocava. Mesmo os que têm bom nascimento, doutoramentos acadêmicos e posses materiais, mas se lhes faltar nobreza de alma, quando estes põem uma cartola de fato, esta se transforma em um triste chapéu ordinário, espelho que se torna de uma alma assim.
Cartola, ao contrário, não nasceu nobre de sangue, mas fez a nobreza nascer em seu sangue de poeta:nascido Angenor, renascido Cartola.
sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010
quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010
ACONTECIMENTOS
Quando chove, diz a criança,
caem no chão as sementes do mar.
***
Quando confiante,
a rosa abre as pétalas e sorri sem medo.
***
O camaleão sabe em sua pele
os mistérios da paisagem.
***
O amor,
para a orquídea flor,
tem o rosto de uma vespa:
em sua impaciente espera,
enquanto o amado não chega,
não sofre ela menos do que sofreu, por Romeu,
a doce Julieta.
***
Os bons livros não podem ser lidos
sem que eles também nos leiam.
***
Quando a alma anda perdida na memória,
é o olho do corpo que a salva,
mostrando-lhe um novo presente que nasce agora.
***
A vida nos dá a folha branca,
mas uma segunda não nos dá para esboço.
***
Acho que já vi a eternidade umas cinco vezes:
pedras sob a corrente ligeira que passa,
sobre as quais pude atravessar à outra margem.
***
Só valem a pena os carnavais que nascem da alma,
cujas cinzas não vem depois, mas antes de nascer a festa.
sábado, 13 de fevereiro de 2010
MÍNIMAS XIII
A seda do coração é azul,
e tem o cheiro das maçãs que se embrulham nela.
***
Quando o passado fica adiante,
esquiva-se o futuro às nossas costas.
***
O silêncio não reclama,
mas de nossas palavras em verdade ele não gosta.
***
Ao retornar ao ponto onde nasceu,
o salmão faz de seu berço o seu porto.
***
O labirinto mais difícil de se vencer
é aquele que tem no seu centro o que mais desejamos.
***
Quando lançada sem cuidado,
a palavra crava na alma e nunca solta.
***
O temor do futuro
diminui o horizonte nos olhos.
***
A pérola nasce dentro da ostra
porque sua confiança não depende do que lhe está fora.
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