Segundo a mitologia, Hades é o deus
que habita a região escura muito abaixo da superfície da terra. Nesse lugar
nenhuma luz entra. Certa vez, porém, Hades ouviu risos vindo da superfície. Ele
subiu e viu Perséfone... Ela estava com sua mãe , a deusa Ceres. De “ceres” vem
“cereal”, pois Ceres é a divindade do plantio e colheita dos cereais. Ceres é
filha de Cronos, o Tempo, com Cibele, a deusa da fertilidade. E foi em sua neta
Perséfone que a fertilidade de Cibele se tornou uma força criativa semelhante
àquela que vemos no artista, pois Perséfone é a deusa cuja arte é fazer nascer
flores. Perséfone mata outra fome diferente daquela que Ceres mata: Perséfone
mata a fome de beleza, de poesia e de cores. Hades se apaixonou pelas flores e
quis levá-las para enfeitar sua noite eterna. Foi uma imensa surpresa, pois
ninguém imaginava que pudesse nascer em Hades um desejo por cores. Ele raptou
então Perséfone para fazê-la morar lá embaixo . Porém, naquele mundo carente de
luz , de Perséfone nasciam rosas só com espinhos , sem as pétalas, flores da
dor que elas eram. Enquanto isso, sentindo a falta de Perséfone, Ceres ficou
deserta : o grão não mais germinava nela. Havia agora fome de pão e beleza, de
pão e poesia, e ninguém sabia qual das duas fomes doía mais: a primeira
esvaziava o estômago, a segunda ao coração secava . Zeus interveio e foi feito
então um acordo. Durante parte do ano Perséfone viveria entre a gente, de sua
presença nascendo a primavera , o verão e o outono. Durante outra parte do ano,
uma parte mais breve porém doída para nós, Perséfone viveria lá embaixo . Desta
maneira nasceu o inverno: o período em que Perséfone desce para ir morar com
Hades. Mas para nos confortar um pouco e minorar a tristeza pela sua ausência,
Perséfone criou flores que florescem no inverno. Foi assim que nasceram a
Tulipa, a Angélica , o Crisântemo , a Orquídea e o Lírio. Hoje, 20 de junho,
começa o inverno. Vendo chegar ao fim sua saudade por Perséfone , Hades lá
embaixo a recebe, ao mesmo tempo que começa a nossa saudade por ela , até que
em setembro ela retorne.
Ainda bem que pode nos socorrer outra
mitologia, a tupi-guarani, que considera a nossa árvore do ipê a própria Árvore
da Vida e expressão perseverante da Mãe-Terra: florescendo o ano inteiro, ela
nos protege de todo inverno com uma resistente primavera.
“O céu da teoria é cinza;
mas sempre verdejante é a árvore da
vida.” (Goethe)
- imagem: “Roots” ( “raízes”), de
Frida Kahlo.
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