Sei falar a linguagem dos pássaros: é só cantar.
(Manoel de
Barros)
Nietzsche dizia que o filósofo é
semelhante ao galo que , no meio da noite cerrada, canta a manhã nova que vem.
Enquanto muitos dormem e, de olhos
fechados, apenas sonham um novo dia , o filósofo abre os olhos no meio da noite
e, sem desesperar de sua solidão, canta com estranha alegria o novo dia antes
mesmo que haja dele algum sinal ou clarão.
Hegel achava que o filósofo é como a
coruja que vê no escuro. Pois quando se extinguem as certezas do dia claro e tudo escurece deixando
todos cegos , é nesse momento que a coruja desperta e se faz guia na
escuridão do ocaso.
Deleuze e Cláudio Ulpiano comparam o filósofo
ao tordo. Este passarinho canoro canta singularmente diante de dois acontecimentos do dia: quando o sol
morre e quando o sol nasce. Ora seu
canto é despedida do passado, no fim da tarde,
ora é saudação ao futuro, no raiar da aurora. Seu despedir-se do sol que
morre não é um lamento, é um agradecimento por ter existido aquele dia, não importando o que nele aconteceu. Seu saudar o sol que nasce não é
otimismo ou esperança, é gratidão por
haver novo dia , não importando o que nele aconteça. Mas o poema que o tordo canta também o põe sob
risco: a soturna ave de rapina que o preda também fica à escuta. Apesar disso,
o tordo não cala: afirma
sua liberdade e canta à vida, como o libertário diante do
fascista.
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