Certa vez em um filme um pintor
explicava que podemos ver um mesmo quadro de duas perspectivas diferentes. Olhando de certa distância vemos a paisagem , se chegarmos bem perto, porém,vemos as
tintas. É a mesma realidade que ora é vista enquanto ideia-paisagem, ora
como matéria-tinta. Assim é, para Espinosa, o corpo e a alma: duas perspectivas
distintas sobre uma mesma realidade viva. A tinta é a paisagem vista de uma perspectiva diferente; a
paisagem é a tinta vista de uma
perspectiva diferente. A tinta é uma realidade extensiva de fato, a paisagem é
uma realidade intensiva de direito.
Mas as tintas e paisagem que somos,
quem nos vê, a quem nos expomos? A ciência nos vê tinta, coisa extensa, matéria
dada. A arte e a filosofia nos veem paisagem
inventada unida às tintas como parte de uma obra maior de um único artista, que
de tintas infinitas produz uma paisagem também infinita que se autovê. A obra não existe para ser bela ou feia, trágica ou sublime; a obra existe para ser.
Nunca veremos tal obra absoluta ,da qual somos partes, olhando-a de fora como um observador à parte do mundo. Só vemos a obra sendo-a,
como corpo e alma, pensando e agindo. Não existe um artista exterior à obra,
muito menos espectador contemplativo de uma obra imóvel, estática, pronta. Obra e artista
são o mesmo, embora diferentes - como são diferentes a paisagem e as tintas. Enquanto
paisagem, somos também as tintas. Enquanto tintas, somos também a
paisagem .
Cezanne, A Montanha da Santa Vitória |
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