O ódio é como a chama que vai devorando um pavio.
Ele não cessa de destruir o que o mantém vivo, exatamente o fio. O ódio só para
quando atinge a bomba. Talvez vivamos a época em que há uma bomba no meio de um
pavio que se estende à direita e à esquerda da bomba. As duas extremidades do
pavio estão acesas, e cada extremo vai consumindo seu pavio com o fito de
ameaçar o outro extremo. O encontro desses extremos odiantes coincide com a
vitória da bomba.
O afeto que afirma a vida não é como o fio do
pavio, talvez se assemelhe ao fio que sai de um novelo , e se oferece como
linha de fuga aos que estão em perigo, perdidos. Expandir o novelo através de
si, criando conexões e bordaduras , é essa a maneira que a vida tem de
resistir.
O fio do pavio existe em razão de uma bomba, de
uma destruição. O fio do novelo se expande e se amplia como trama,
agenciamento, rizoma, conexão. A bomba se expande destruindo tudo , o novelo se
expande construindo a tessitura de um mundo, mesmo que ainda por vir . Poesia,
filosofia, educação, cultura, arte, ideias...são fios de cores diferentes que
se ligam ao mesmo novelo democrático multicor. Os que fazem apologia do ódio,
da intolerância, do preconceito... são como fios ligados a uma bomba: cedo ou
tarde, a bomba explodirá perto dele, às vezes sob a forma de uma faca.
( imagem: Arthur
Bispo do Rosário. Muitas vezes, Bispo do Rosário desfazia a forma acostumada
das coisas prontas, como lençóis, toalhas e até mesmo o uniforme de louco que
punham nele, para achar nelas o fio de que elas eram feitas. De posse desse
fio, ele o ligava ao novelo que estava dentro dele e do qual ele havia se
perdido, para assim reinventar, bordando, o sentido das coisas e de si mesmo,
com arte)
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