sexta-feira, 26 de fevereiro de 2021

espinosa , manoel e seus caderninhos...

 

Alguns biógrafos de Espinosa afirmam que o filósofo era sempre visto com um pequeno caderno. Chovesse ou fizesse sol,  inverno ou primavera, Espinosa não largava seu pequeno caderno. Quem teve a oportunidade de ver tal caderno, ainda que rapidamente, constatou que nele  havia não apenas a escrita de conceitos já nascidos ,  também havia desenhos coloridos e esboços de conceitos ainda por nascer.

O poeta Manoel de Barros dizia que , antes de virarem livro, seus poemas eram rascunhados em   “caderninhos do caos”. O próprio poeta confeccionava esses caderninhos com as mãos . Também à mão  e  a  lápis , em tais caderninhos do caos o poeta escrevia  o feto de futuros  livros. Creio ser um caderninho assim aquele no qual Espinosa esboçava suas ideias e desenhos. Na mitologia, Gaia, a Mãe-Terra, emergiu do Caos. Igualmente  do Caos emergem as poesias e filosofias que são “Novas Terras ” para o pensar e  o sentir em seus horizontamentos. Pois esse  “Caos”   poético-filosófico não é destruição ou desordem, ele é  uma realidade não  formada, pura virtualidade não domada, útero cósmico do qual nasce tudo o que escapa e resiste às  Ordens Totalitárias.

Infelizmente, esse caderninho de Espinosa se perdeu... Quando o filósofo morreu, capitalistas rapinadores foram ao seu quarto surrupiar as lentes que ele fabricava e polia, lentes já famosas pela qualidade e que valiam um bom dinheiro;  e fanáticos religiosos também  invadiram o  quarto atrás de coisas para pegar e tacar fogo. Tudo leva a crer que o caderninho  de Espinosa não escapou a esses intolerantes e sua fogueira de ódio; porém a potente, colorida e  libertária chama que do caderninho  se desprendeu ao ser queimado   ainda vive  em quem persevera com  a alma acesa , e resiste ao breu.


“Eu sou uma chama acesa!

 E rebrilho e rebrilho toda essa escuridão”. (Clarice Lispector)


( imagem: “Espinosa multicor” )








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