O comum nunca é o idêntico. Esta é a clássica fórmula que define o Princípio de Identidade: A=A. A
é idêntico a A. A é idêntico a ele mesmo. No entanto, ser idêntico a si mesmo
pode ser, e quase sempre o é, um obstáculo, e não apenas lógico, para se ter algo
em comum com os outros.
Se digo, por exemplo, que A=B , deve haver uma terceira
coisa que os une para além de suas respectivas identidades de A e B, algo que
vença, neles, as identidades opositivas. Ou seja, deve haver um comum que agencie suas diferenças, sem negá-las.Pedro= Pedro, Paulo= Paulo. Mas Pedro poderá ser igual a Paulo sob um comum que os agencie. Por exemplo, ambos são amigos. Pedro=Paulo enquanto amigos: a amizade é o comum que os agencia.
O comum não se opõe à identidade, pois
essa terceira realidade comum a A e B confere-lhes uma identidade, uma
identidade comum, mais potente do que a identidade exclusivamente identitária a
si, como um ponto ou ego.
Na base de identidades comuns não está uma identidade
como princípio egológico ou pontual, na base das identidades comuns estão diferenças que se agenciam, para assim potencializarem, no comum, aquilo que
possuem de diferentes.O comum é sempre uma relação.
Uma diferença singular nunca é uma identidade fechada ,
igual exclusivamente a si mesma. Toda singularidade é um modo , uma maneira de
ser , uma expressão , uma diferença, um grau, de uma realidade que contém em si
todos os graus, todas as maneiras, todas as diferenças, sem que ela seja uma
Identidade Absoluta, um A absoluto idêntico apenas a si mesmo.
O azul contém
infinitos graus, e cada grau o expressa de forma diferente. O Azul Absoluto
vive imanente a cada grau como diferença sua. O Azul Absoluto não é um grau
infinitamente maior , ele é a própria realidade da qual os graus são graus .
Os
graus de azul têm algo em comum: o azul. E cada grau singular de azul é o azul
modificado. Porém, não existe um Azul Puro, um Azul existindo fora de seus
graus. É no grau que vemos um azul, e não nele mesmo, como "azul puro"; tampouco existe um grau
nele mesmo, em si, sem ser um grau de azul.
A intuição liga cada grau ao Azul
que contém nele todos os graus. Não se pode separar o Azul de seus graus ,
tampouco se pode separar os graus de azul do próprio Azul que não é um grau de
si próprio, mas o azul expresso em todos os graus que o afirmam,
diferencialmente.
Cada grau de azul possui algo em comum com outro grau de
azul, exatamente o azul. Mas o Azul Absoluto, do qual cada grau é um grau, está
em cada um de seus graus assim como está em si mesmo: Incomum.
Na gênese do
comum não está a identidade, está o Incomum. O Incomum não é o arbitrário. O
Incomum é uma medida que nunca se transforma em padrão, embora possibilite medidas
comuns a diferentes modos que se agenciam.
Na gênese da democracia não está a
lei, enquanto regra comum; a democracia é a ideia-gênese da própria regra comum
como meio a potencializar a medida-potência de cada um.
É por isso que, de todas as formas políticas, a democracia é a mais Incomum, não por ser o império da lei, e sim porque é nela que nada pode ser, em si, um império, tampouco a lei. A democracia é a forma política mais adequada ao conteúdo que nunca é apenas político ou jurídico, mas ético-ontológico.
Martha Barros, Poético Azul - 2010. |
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