Muito se fala, com razão, das
borboletas. São exaltadas sua beleza,
cores e destreza alada. Na Grécia, por exemplo, as asas das borboletas
eram consideradas símbolos de Eros, o Deus do Amor.
Porém, pouco se fala da lagarta nesse
processo. Muitos a tratam como uma roupa velha e carcomida , abandonada pela borboleta que voa colorida. Considero isso uma injustiça contra essa artista. Sim, pois a
lagarta é uma artista , uma artista que trabalha em silêncio, longe dos
holofotes e das vistas, como Espinosa cuidadosamente polindo as lentes que
fabricava , até poderem ser lunetas
mirando as estrelas infinitas .
De tudo o que ingere da natureza, a
lagarta depura e destila um fio de seda. Com esse fio, sem que ninguém veja , ela vai bordando dentro de si uma
arte, um rascunho de vida futura, como a natureza cheia de vida e cores que
Maud Lewis criou com sua pintura, apesar das imensas dificuldades físicas e
sociais que sofria. O fio de seda é
,para a lagarta, o mesmo que as cores são
para a artista : linha de fuga e liberdade. Com o fio das cores, a artista reinventou-se gato, borboleta,
flores, paisagens...vida expressa de forma singular e variada, simples e complexa. Com arte e cores
também se afirma e se luta.
Pois
chega enfim o dia em que a arte fica
pronta, a lagarta não pode mais esconder de ninguém a artista que é por
dentro . Confiante , ela parteja a si mesma do casulo-útero que fabricou ,
vestindo-se com a arte que agora também
é sua pele verdadeira . Já não há mais
contradição consigo mesma : agora, ela é
por fora como já era por dentro, todo mundo agora vê a borboleta. E com as asas
que bordou com o fio de seda, ensina a reinventar-se, para que assim , quem
sabe, a gente também seja.
“Penso renovar os homens usando
borboletas.” (Manoel de Barros)
( imagem: “O gato ”, obra de Maud
Lewis )
- outras obras:
- filme sobre a vida e obra de Maud Lewis:
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