"Criar” e “inventar” são atos
diferentes. A diferença entre ambos fica mais clara nas realidades que tais
atos produzem. “Inventar” aplica-se a coisas. Celular , automóvel, relógio ,
etc. existem porque foram inventados. Já o “criar” é um ato que gera tudo
aquilo cujo sentido se explica como arte, na acepção ampla da palavra . “Criar”
tem origem na antiga palavra “creare”. De “creare” também provém “crer” .
“Creare” significava tanto crer como criar. É por isso que somente cria quem
crê, e quem crê sempre cria, mesmo diante das maiores impossibilidades. Não só
um poema é criado , uma filosofia também o é, na medida em que filosofia e
poesia criam ideias: ideias para pensar e para sentir . Criar uma filosofia é
crer no pensar, criar um poema é crer no sentir. Só cria novas possibilidades
para a vida que crê na liberdade; quem não crê , resigna-se e chora as
impossibilidades.
É por isso que também se diz: “criei
um filho”, e não “inventei um filho”; ou “criei um laço de amizade”, e não
“inventei um laço de amizade”; ou “criei um jardim” ,e não “inventei um
jardim”. Pois tais realidades que criamos também são formas de arte nas quais
acreditamos , nada tendo a ver com coisa mecânica. Já um revólver, enquanto
objeto técnico, é fruto de invenção e, por isso, pode estar a serviço de um
bandido ou de um fascista. A inventividade produz apenas coisas; e as coisas ,
por não possuírem vida, podem virar instrumento de morte a serviço de uma
mentalidade mórbida . Porém a criatividade produz ideias, e as ideias são a
vida e a saúde do pensamento. Em todo totalitarismo , não importando se
político , comportamental ou acadêmico, são sempre os criativos os que sofrerão
as maiores consequências. E são sempre deles, e neles, que nascem e perseveram
as resistências.
"É possível que crer nesse mundo, nessa vida, tenha-se convertido
na nossa tarefa mais difícil, a tarefa de um modo de existência por descobrir
sobre o nosso plano de imanência hoje." (Deleuze & Guattari, "O
que é a filosofia?")
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