A Odisseia, de Homero, tem como
cenário o oceano com suas tempestades, calmarias, ilhas desertas, vastidões
abertas... E por personagens monstros, divindades, inimigos, armadilhas... É
nesse cenário e às voltas com esses personagens que acontece a história de
Ulisses.
Ulisses não tinha a coragem de
Aquiles, tampouco o senso de comunidade e justiça de Heitor. Porém Ulisses era
dotado de um tipo de inteligência capaz de inventar meios
para vencer e dominar. Foi assim que Ulisses teve a ideia do “Cavalo de
Troia”: um “presente” dado ao inimigo para vencê-lo com astúcia.
Após a vitória na guerra de Troia, e
vaidoso com sua inteligência astuta, Ulisses se lançou ao oceano em busca de
mais vitórias e conquistas desmedidas.
Mas o preço pago por tamanha ambição foi enlouquecer sua bússola,
quebrar seu leme, perder seus
companheiros de viagem e ter seu barco destruído pelas tempestades: sua
inteligência astuta e ambiciosa mostrou-se uma forma de ignorância e loucura diante
da força , mistério e amplidão do oceano.
Até no Hades , Reino dos Mortos,
Ulisses foi parar, parecendo estar morto
para si mesmo. Náufrago e perdido ,
Ulisses se refugiou numa ilha . Circe, a divindade dessa ilha, apaixonou-se por
Ulisses. Ela curou suas feridas e o fortaleceu.
Por fim, Circe disse: “Ulisses, se
você ficar comigo aqui na minha ilha
tornarei você imortal. Nunca mais você sentirá medo, fome, dor e saudade. Então, você deve fazer a seguinte
escolha: ou continuar sendo parte da
frágil humanidade, vivendo sob o risco
dos perigos e tempestades , ou ficar
aqui comigo , na tranquilidade segura da imortalidade ”.
Mas a resposta de Ulisses não foi
dada por sua inteligência astuta ávida por conquistas, propriedades e ouro; a
resposta foi dada por seu coração desejoso para ver de novo sua terra natal,
sua Ítaca, na qual o esperava Penélope.
Penélope simboliza a alma que resiste
ao assédio dos “pretendentes” que tentam comprá-la. Recordar vem de “re-córdis”: “trazer ao
coração”. Foi a recordação de Penélope, fazendo dela a força de sua coragem (
“coragem”: “força do coração”), foi essa recordação que levou Ulisses a escolher a humanidade e retornar à
sua terra natal , para isso se lançando em nova viagem, desta vez não temendo
as tempestades, pois Ulisses agora sabia aonde ir: de volta a si mesmo, ele que
se perdeu de si.
A humanidade não é o “Homem”, a
humanidade é um valor que somente existe se for criado por nossas escolhas éticas e políticas, pois escolher
a humanidade também precisa ser uma escolha coletiva.
Apesar das tempestades, é sempre em
direção à humanidade que precisamos ir. Ela é , ao mesmo tempo, a bússola, o
leme , a
viagem e o porto : a terra natal onde reside/resiste nossa Penélope-Psiquê
.
( para crianças e jovens, vale a pena
essa edição narrada por Ruth Rocha, porém a interpretação que fiz se inspira em
Sêneca, na carta 88 das “Cartas a
Lucílio”)
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