Os gregos inventaram a “ágora” , a
praça pública, como espaço-símbolo da
democracia. “Ágora” vem de “agon” : “conflito” ou “disputa”. Na ágora aconteciam disputas travadas com palavras. Os romanos, por sua vez, inventaram as ruas. Não como espaço
político, mas como meio de
travessia para além dos muros das cidades: as ruas atravessavam espaços livres e não povoados. Impérios e cidades desaparecem destruídos por guerras
ou catástrofes: com eles, desaparecem também as praças. Mas as ruas que
atravessam campos e espaços abertos nunca desaparecem totalmente : se ninguém
mais passa por elas, as ruas se integram à natureza , tornando-se trilhas em
esboço que somente os andarilhos nômades sabem achar.
A Revolução Francesa se inspirou no
ideário da praça como espaço de poder a se contrapor aos templos da intolerância
religiosa e aos castelos dos senhores
feudais. Surgem então os “parlamentos”: lugar onde se “parla”. Radicalizando ainda mais a ideia de
democracia, Espinosa dizia que mais importante do que a praça é a rua como espaço comum onde a multitudo se move e
age. “Multitudo” é mais do que a mera
“multidão” ou “massa” : multitudo é o agir
instituinte de uma multiplicidade ativa. A multitudo nunca cabe
totalmente no espaço centrípeto das praças, pois somente no espaço centrífugo
das ruas cabe o existir em movimento da multiplicidade política, cuja potência
excede o poder de governos e Estados: enquanto a força destes é a da mera polícia, a potência da multitudo é o desejo comum por
justiça, igualdade , liberdade ,
democracia, vida. Da praça nasceu o parlamento para se opor aos templos e
castelos. Mas quando o próprio parlamento se torna sucursal do templo
teológico-político e de mentalidades
medievais encasteladas, somente as ruas podem nos restituir a liberdade que nos
roubaram as urnas algemadas. As praças
simbolizam o centro das cidades, porém as ruas
são rizomas que alcançam também as margens, conectando aqueles a quem o
poder centralizador exclui e marginaliza.
"A rua põe sentido em mim"(Manoel de Barros)
"A rua põe sentido em mim"(Manoel de Barros)
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