sexta-feira, 7 de junho de 2019

manoel e a desfilosofia




(trecho do livro)


A poesia de  Manoel de Barros enseja uma original “desfilosofia”, isto é, um pensar que se faz não apenas com conceitos. Uma desfilosofia emerge  no ponto onde poesia e filosofia se encontram, entram em conversação. Manoel de Barros ensina: “Eu escrevo com o corpo /Poesia não é para compreender, mas para incorporar”[1]. É preciso incorporar Manoel de Barros: lê-lo é empoemar-se.  Empoemando a palavra, Manoel nos empoema: há nesse processo uma singular “clínica”. Empoemar é um verbo que toda palavra pode conjugar, desde que “abra o roupão para o poeta e o deixe sê-la”[2].Empoemar é mais que conjugação de verbos: é conjugação da palavra com a vida, para “inventar comportamentos”[3]. Manoel empoema não apenas as palavras, pois de nada vale empoemá-las se não for para nos empoemar também.Manoel empoema as palavras simples, reinventa para elas uma nova combinatória: “aproveito do povo sintaxes tortas”[4], de tal modo que as palavras do poeta “se ajuntavam uma na outra por amor e não por sintaxe” [5].  O poeta empoema as palavras mais comuns, as escova[6], para que elas sejam, eis o “milagre estético”[7], minadouro [8]de novos sentidos.
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[1]Gramática expositiva do chão — poesia quase toda. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1992 (segunda edição).  p. 212.
[2] Livro sobre nada, p. 70.                                                                                                                                               
[3] “Comportamento”, Ensaios fotográficos, p. 65.
[4]  “Pedras aprendem silêncio nele”, Gramática expositiva do chão, p. 334.
[5] Livro: Menino do Mato, Primeira Parte, II.
[6] Cf. poema “Escova”.
[7] “Biografia do orvalho”, Retrato do artista quando coisa, p. 81.
[8] Encontros: Manoel de Barros . Rio de Janeiro, Azougue, 2010(Org. Adalberto Müller), p. 145.

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