(trecho do livro)
A poesia de Manoel de Barros enseja uma original
“desfilosofia”, isto é, um pensar que se faz não apenas com conceitos. Uma
desfilosofia emerge no ponto onde poesia
e filosofia se encontram, entram em conversação. Manoel de Barros ensina: “Eu
escrevo com o corpo /Poesia não é para compreender, mas para incorporar”[1]. É
preciso incorporar Manoel de Barros: lê-lo é empoemar-se. Empoemando a palavra, Manoel nos empoema: há
nesse processo uma singular “clínica”. Empoemar é um verbo que toda palavra
pode conjugar, desde que “abra o roupão para o poeta e o deixe
sê-la”[2].Empoemar é mais que conjugação de verbos: é conjugação da palavra com
a vida, para “inventar comportamentos”[3]. Manoel empoema não apenas as
palavras, pois de nada vale empoemá-las se não for para nos empoemar
também.Manoel empoema as palavras
simples, reinventa para elas uma nova combinatória: “aproveito do povo sintaxes
tortas”[4], de tal modo que as palavras do poeta “se ajuntavam uma na outra por
amor e não por sintaxe” [5]. O poeta empoema
as palavras mais comuns, as escova[6], para que elas sejam, eis o “milagre
estético”[7], minadouro [8]de novos sentidos.
_________
[1]Gramática
expositiva do chão
— poesia quase toda. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1992 (segunda
edição). p. 212.
[2] Livro sobre nada, p. 70.
[3] “Comportamento”, Ensaios fotográficos, p. 65.
[4]
“Pedras aprendem silêncio nele”, Gramática
expositiva do chão, p. 334.
[5] Livro: Menino do Mato,
Primeira Parte, II.
[6] Cf. poema “Escova”.
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