No poema
"Aventura", o personagem é um pote que Manoel de Barros encontra
jogado fora de "barriga vazia para cima", “encostado à natureza”. Nesse estado de abandono, o pote
continha apenas o vazio. Talvez o pote
já tenha guardado um dia algo muito desejável, e que com
avidez os homens devoraram.Enquanto durou
esse conteúdo , o pote foi amado – ou
imaginou que o fosse. Depois
de lhe tirarem tudo , ele foi então
abandonado pelos mesmos homens que
dele se alimentaram. “Inútil”, o pote já não servia para nada, a não ser
para metamorfoses, pois é isto que a natureza produz em tudo aquilo que, ao
encostar nela, sofre um contágio, uma comunhão: "depois desse desmanche em
natureza, as latas podem até namorar com as borboletas", pressagiou o poeta. Mas assim ele se foi: pensando no triste fim daquele pote...
Tempos depois, o
poeta teve que passar pelo mesmo lugar ermo.Lembrou do pote e
preparou-se para ver de novo aquela imagem do sofrimento. Porém, nesse
intervalo de tempo , sem que o poeta soubesse,um passarinho passou voando
“atoamente” sobre o pote e cuspiu uma semente em seu ventre vazio. Ali já
havia areia e cisco que a natureza depositou."As
chuvas e os ventos deram à gravidez do pote forças de parir". E onde antes
crescia o vazio, agora um vivo poema
aflorou: nasceu do ventre um pé de rosas .E repleto ficou o pote com a beleza que se oferta sem nada pedir em troca.
(Vaso com Zinnias e Geraniums, 1886 - van Gogh) |
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