Tanto o sábio quanto o homem vulgar possuem em suas almas partes boas e más.
O que os distingue é que o sábio sempre se esforça para agir com sua parte boa.
Plotino
Platão acreditava que o amor é
desejo. Desejo daquilo que falta. O desejo seria a marca de uma incompletude
radical. Só desejamos porque nos falta aquilo que nos faria voltar à unidade
originária, no tempo perdida. Obtida a outra metade que nos falta, restituída
assim a unidade perdida, finda o desejo , como se extingue o fogo quando não há
mais madeira para queimar. O objetivo do desejo é encontrar aquilo que ele
deseja :uma outra metade também perdida, para assim findarem ambos em uma
unidade que apaga a diferença de cada um dos desejos em suas diferenças. O
destino do desejo é ser apagado, morto. Tornar-se completo, segundo Platão,
seria fundir-se em uma unidade que revelaria que a diferença é ilusão.
Espinosa pensa de outro modo. Para
ele, desejar é buscar um outro desejo
que se componha com o nosso. Desejar é , junto com outro desejo do nosso
diferente, criar um terceiro indivíduo, do qual meu desejo e o outro desejo
sejam partes vivas. A amizade, por exemplo, é um terceiro indivíduo nascido de Pedro e Paulo enquanto amigos. Pedro e Paulo são partes da amizade que os une, a amizade está tanto no todo quanto está nas partes. Mas a amizade não é um conjunto, uma vez que podem existir conjuntos vazios, porém não pode existir amizade sem amigos. A amizade é uma relação que acrescenta às partes que se relacionam um novo sentido. A amizade não está somente na relação, tampouco apenas nos amigos. Ela está tanto na relação quanto nos amigos, embora não esteja do mesmo modo nas partes e na relação-todo: nos amigos ela está como afeto, na relação-todo ela é ideia.
Enquanto em Platão a unidade
originária pré-existe ao desejo que a busca, em Espinosa a unidade não
pré-existe aos dois desejos que a inventam, ao se conjugarem. Mediante o
terceiro indivíduo que nasce dos dois desejos conjugados, cada desejo não é
negado ou suprimido, mas potencializado : um vive no outro por meio da Vida que
ambos inventaram em comum.Vida que se alimenta das diferenças que se
auto-enriquecem, que se auto-inventam. Quando dois desejos se unem e criam um
terceiro indivíduo superior, nasce desse terceiro indivíduo um desejo também
superior, concernente à alma e também ao corpo, desejo que não é mais de um ou
do outro, porém dos dois desejos
transformados e potencializados em um único desejo que se quer a si mesmo. Assim compreendido, o desejo não é falta, dado que ele se possui a si mesmo
ao se dar para o outro, que também o oferta. Pois é isto o amor: oferta de amor, e não cobrança.
Assim conjugados, ambos desejam a mesma coisa: manter vivo o terceiro indivíduo que só existe por ação deles . Por meio do terceiro indivíduo , ambos podem cada vez mais desejar não o que falta, mas o que potencializa o que já se é, singularmente.
Assim conjugados, ambos desejam a mesma coisa: manter vivo o terceiro indivíduo que só existe por ação deles . Por meio do terceiro indivíduo , ambos podem cada vez mais desejar não o que falta, mas o que potencializa o que já se é, singularmente.
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