Na mitologia, comparava-se a alma
humana à carruagem. Mesmo Platão se serve desse mito, adaptando-o. A carruagem
de Platão compõe-se de três elementos: o cocheiro e dois cavalos . O cocheiro é
a Razão: ela tem as rédeas e guia a carruagem por caminhos retos traçados com
régua. Um dos cavalos, de cor branca, é dócil
aos comandos da razão: trata-se da "Vontade". Mas o outro
cavalo, de cor preta, é indisciplinado, rebelde. Quanto mais a Razão quer
comandá-lo, mais rígida ela precisa ser. Este cavalo insubmisso é o
"Desejo".
Segundo Platão, na carruagem de nossa
alma a Razão e o desejo, o cocheiro e o cavalo preto, estão sempre em conflito.
A Razão quer “Ordem”, e por vezes fala por ela o seu chicote; porém o desejo
deseja “ir atoamente”, nomadicamente...
Carruagem diferente era a de Dioniso,
divindade das artes. Nela, Dioniso também era o cocheiro, mas sem querer ser ou
ter a “Razão”. Ao invés de cavalos, sua carruagem era puxada por panteras
não domesticadas. Apesar de feras, Dioniso as guiava sem usar chicote. A arte
não nega ou reprime a natureza ( como o cocheiro de Platão), mas a põe a seu
serviço conforme uma disciplina que não é estrangeira à potência das panteras.
Na natureza, as panteras são solitárias e jamais se unem. Porém, sob as mãos da
arte, as pulsões-panteras se tornam forças que se conjugam, que se agenciam, e
conduzem a alma por sendas onde a razão não ousa ir.
Dioniso transforma a agressividade
destrutiva e mortífera das pulsões-panteras em potência criativa afirmadora da
vida. Dioniso é o próprio desejo que se tornou guia, cocheiro, pensador;
conjugando disciplina e inventividade na condução da carruagem . Esta segue
para onde não se sabe: seu destino é o próprio percurso enquanto este é criado.
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