Espinosa é um dos primeiros pensadores a evocar
e defender um “direito de resistência”, que também é a base do que depois se
chamou de “desobediência civil”. O sentido original de “resistir” é : “pôr-se
novamente de pé”, após ter caído. Ninguém resiste de verdade ficando sentado, é
preciso ficar de pé. “Pôr-se de pé” não apenas no sentido físico, já que o
“permanecer de pé” é a ação que define o que é ser humano em sua dimensão
política, civilizacional, existencial e ética. Os vermes rastejam, os bovinos andam de
quatro. Mas se o homem rastejar ou se conformar a ser quadrúpede, não é mais
humano, torna-se outra coisa sem nome, inqualificável...Esse direito de
resistência não é um direito que dependa exclusivamente de juízes ou ministros
do Supremo para ser evocado e defendido. Quem o pode evocar e defender é quem
se vê em perigo, sobretudo quando o que está em perigo é a própria
sobrevivência da sociedade como um todo. Esse direito de resistência é mais do
que um direito: é um dever quando estamos sob a ameaça de um tirano. Para
Espinosa , não se esquivar a esse dever é o que caracteriza o autêntico pensar
em sua dimensão prática, ética, política. O contrário da resistência é a
obediência: esta produz ignorantes , aquela produz cidadãos. A obediência a
tiranos é sempre incivilizada ( como essas carreatas contra a quarentena ou a
greve que alguns caminhoneiros bozopatas querem fazer para desabastecer os
supermercados!), já o direito de resistência ou de desobediência é ação para
defender a civilização, em nós e nas instituições. Existe a solidão individual,
mas há também a solidão em grupo, mesmo que neste haja muitos. A solidão
individual é aquela de um indivíduo sem relações externas, já a solidão em
grupo é a de um rebanho sem relações outras que não seja a de obediência a um
tirano. Somente a multiplicidade se ligando a si mesma, reinventando-se povo,
pode pôr-se de pé e resistir aos tiranos. O direito de resistência significa
exatamente isto: o pôr-se de pé de um indivíduo na imanência de um pôr-se de pé
coletivo que não se deixa derrubar pelo arbítrio de tiranos que põem a vida sob
risco.
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