Creio que essa situação que nos tem
paralisado é o sintoma de uma ameaça inédita que estamos sofrendo: a ameaça da
“morte do futuro”. Nunca na história da humanidade o futuro esteve tão
ameaçado. Ele já esteve ameaçado de ser destruído fisicamente por bombas
atômicas na “guerra fria” . Hoje a ameaça é ao futuro enquanto dimensão de
criação de uma outra sociedade : mais justa, menos desumana. Às vezes se diz
que é preciso “matar o passado” para continuarmos vivendo, quando nele
aconteceu algo que não superamos e nos provocou um “trauma”. Esse passado
traumático deve ser morto em nome de uma
transformação que abra o presente ao futuro. Hoje o trauma não é em relação a
algo acontecido , mas ao que acontece agora
e nos enluta por um futuro ainda
nem nascido. Politicamente, o futuro sempre foi o território para o qual se direciona o pensamento
progressista. A direita, ao contrário, é a vontade de conservar o passado.
Pensamento progressista e direita não têm
a mesma visão do presente: os progressistas pensam o presente como um momento para a
construção do futuro, ao passo que a
direita considera o presente um risco
aos valores do passado. Mas o que
vivemos hoje é uma direita que parece ter mudado de foco. Ao invés de apenas se
contrapor aos progressistas na defesa do passado, a neodireita agora resolveu
destruir aquilo que constitui a razão de ser de todo pensamento e prática em
favor do social : o futuro. Parece que para a neodireita o amor ao passado é só
uma máscara atrás da qual se esconde seu verdadeiro rosto: o ódio ao futuro (por motivos que talvez só a psicanálise explique...). A antiga direita se
pautava por um respeito ao passado , daí
sua estima pela tradição e aos idosos; hoje, a neodireita se caracteriza mais
pelo ódio ao futuro, e por isso quer encurtá-lo para
os idosos, sobretudo os idosos pobres,
ameaçando extinguir suas aposentarias , e com isso diminuindo o que tem
de futuro suas vidas. Quando olhamos para traz vemos a escravidão em nosso
passado vergonhoso. A neodireita parece querer uma nova versão dessa vergonha,
dessa vez colocando a servidão em nosso futuro próximo. A
resistência a isso é a justa indignação:
ela é a voz do futuro pedindo que a gente o defenda.
“A indignação é o afeto comum que une os justos em defesa da comunidade que o tirano
ameaça de morte ” ( Espinosa)
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