Plotino
possui uma maneira muito poética de ver o mundo, talvez uma das visões mais
poéticas que a filosofia já produziu. Na verdade, não era sua visão que era
poética, pois poético era o próprio mundo que Plotino sentiu , viveu e pensou.
Assim, para ver esse mundo poético era preciso criar em si olhos para vê-lo,
olhos também poéticos. Não se trata do poético no sentido de realidade expressa
em palavra e versos, pois poético aqui significa “produção”( poiésis ), no
sentido do pintor que produz seu quadro, ou do músico que produz sua música, ou
ainda do maestro que produz a unidade compósita, porém variada, dos diversos
instrumentos que participam de uma polifonia. Plotino , em princípio, concorda
com Platão, a quem tinha por mestre. Plotino é considerado um “neoplatônico”.
Mas “neo” , aqui, não significa que Plotino seja um “novo” Platão, e sim que
ele viu algo novo que o próprio Platão não viu , embora este fosse seu mestre.
Pois é assim que nasce , de um discípulo, um novo mestre: não exatamente
negando aquele que foi seu antigo mestre, e sim vendo uma realidade nova que o
antigo mestre não viu. Não porque Platão fosse ignorante ou cego, mas sim em
razão de ele ainda não possuir os olhos para ver o que viu Plotino. Assim,
Plotino concorda com Platão de que existem Formas Puras lá onde o céu começa.
Contudo , Plotino viu as Formas como realidade diferente daquela que viu
Platão. Para Platão, as Formas existem em si e se bastam nelas mesmas,
separadas do devir do mundo. Já Plotino concebe as Formas como uma espécie de
“abertura” celeste através da qual flui uma realidade anterior e mais potente
do que elas, como uma fonte que jorra . Essa realidade que jorra não se deixa
prender por formas , tal como o rio que transborda as margens que o
prendem.Essa realidade primeira que jorra atravessando as Formas Plotino a
chama de Luz. A Luz irradia de si mesma , atravessa as Formas e as incandesce,
fazendo-se assim estrelas. Mas a Luz vai além das Formas: ela “desce” criando a
própria realidade na qual ela se torna, virando assim cometas, sóis, planetas,
a terra e seus mares, montanhas, árvores , frutos , sementes , flores; a Luz se
torna também bicho, pássaro, inseto, peixe...devindo tudo o que vive, ao mesmo
tempo una e múltipla. A Luz se torna também a alma e o corpo do homem, para
neste ser os olhos com os quais a própria Luz busca ver-se e conhecer-se. E
aqueles que mais a veem intensamente, e mesmo sob a noite mais profunda ainda a
enxergam, fazem-se pensadores , poetas, criadores , enfim, libertários.
"A cisterna contém;
a fonte transborda."
( William Blake)
"Poeta é quem possui visão fontana."
(Manoel de Barros)
Obs.: Plotino diferia dos gregos também no seguinte ponto: os gregos achavam que Eros ( o Amor) deveria escolher entre a Alma ( Psiquê) e o Corpo ( Afrodite). Escolhendo a Alma, tal escolha conduziria ao amor à filosofia; escolhendo o Corpo, nasce dessa escolha o amor à arte e à poesia. Para Plotino, ao contrário, o autêntico Eros deve viver entre Psiquê e Afrodite, entre a Alma e o Corpo, para assim ser o elo que une a ambos. Assim, segundo Plotino, para ser filósofo é preciso ser também poeta, pois em todo poeta existe também um filósofo.
"Como quem espreita o céu
e colhe na visão um novo planeta,
assim fiquei então."
Keats
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