Era fim de tarde, já anoitecia.
Soava em um rádio a
Ave-Maria.
Eu voltava para casa após um longo dia.
Pela manhã fiz parte de uma banca de doutorado,
ouvi e falei inúmeras teorias.
À tarde, em aulas,
muitas horas ocupei
com filosofias.
Foi um longo dia...
Perto de minha casa,
reparei metros adiante uma mendiga.
Ela caminhava embalando algo
que um trapo sujo
envolvia.
A quem por ela passava,
ela se dirigia.
Imaginei que ela pedia moedas ,
comida.
E que naqueles trapos estivesse
uma criança muito sofrida.
Pus as mãos no bolso,
senti o frio de moedas.
Eu já estava próximo dela,
pensei que moedas ela me pediria.
Mas quando cheguei bem perto,
olhei para ver a criança que o trapo escondia.
Não havia nada ali...
Havia , sim, um nada amorosamente embalado,
com cuidado segurado,
não sem agonia.
Ela embalava um vazio,
como se ali estivesse uma vida.
Uma vida que foi,
uma vida que seria.
Olhei então seu rosto.
Um rosto de mãe eu via,
como no rádio outra mãe se ouvia.
Sem me olhar nos olhos,
ela me disse então as palavras que a todos dirigia:
- “Deus existe?”
Ela apenas perguntava, sem esperar por resposta.
Não há moeda que compre o que ela pedia como comida.
Em passos lentos ela prosseguia,
tendo nos braços a dor que ela envolvia.
Nada do que falei , li ou ouvi naquele dia,
nenhuma filosofia,
tampouco teorias que a tudo querem explicar;
nada poderia pôr
naquele vazio uma criança.
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