quinta-feira, 24 de julho de 2025

As formas de se adquirir conhecimento

 

                                  PROGRESSÃO , CONVERSÃO , SUBVERSÃO [1]

 

Os livros de filosofia costumam dizer  que há  duas maneiras de adquirir conhecimento: por progressão e por conversão. A imagem que melhor traduz o conhecimento por progressão é a de uma escada: aprender se torna um processo de subir degraus. Começa-se no degrau do primário, passa-se ao degrau do ensino básico, depois sobe-se ao degrau do ensino médio...até chegar ao degrau da faculdade. Aqui,  há ainda os degraus dos períodos, depois o degrau do mestrado, sendo seguido pelo do doutorado até chegar ao último degrau: o do pós-doc. Contudo, o que caracteriza o conhecimento por progressão é que ele tem um começo e um fim  (  o pós- doc) , assim afirmando   a lógica de um suposto “progresso formal-intelectual” .

O conhecimento por conversão segue outra lógica: não a da escada que sobe, mas a de uma mudança de caminho, uma guinada, uma virada. Con-versão: “voltar-se para”. Em Platão, por exemplo, a conversão implica em um voltar-se para cima: para o Céu onde moram as Ideias. Mas como chegar até lá? Para lá não há degraus ou escadas. É preciso ter asas. Para Platão, o conhecimento não é um progredir, e sim um retornar: um voltar-se para a Origem Transcendente.

Inspirando-se nos pré-socráticos, Deleuze afirma que há ainda uma terceira maneira  de adquirir conhecimento: nem por subida de degraus, nem por ascensão por asas, mas por subversão. E esse processo não é puramente acadêmico ou intelectual, mas existencial e vital.

Subverter não é subir degraus e nem alçar às alturas, mas virar de cabeça para baixo uma ordem de coisas dadas. Subverter é destruir, mas destruir para criar: “Só podemos destruir/subverter sendo criadores”, afirma Nietzsche.  O subversivo faz de suas mãos mais do que asas: pois nelas, em suas mãos, ele carrega ferramentas para forjar uma realidade nova, como Espinosa polindo lentes para subverter a visão. Assim, Espinosa subverteu a imagem do filósofo: fez-se artesão.

 Enquanto a conversão busca um Céu nas alturas, o subversivo quer a Terra, ele afirma a Terra como o verdadeiro Céu. A progressão mira o alto de um podium, a conversão almeja o Céu, porém a subversão constrói o plano horizontal das conexões que ampliam e expandem.

Heráclito, Lucrécio, Espinosa, Nietzsche, Marx, Deleuze...se inscrevem na linhagem dos subversivos, cada um à sua maneira. Para eles, não se filosofa para progredir em conhecimento hierárquico ou para fugir da terra, mas para subverter os poderes que apequenam a vida, fomentam a superstição, exploram o ser humano e ameaçam o presente e o futuro da terra.

A poeta Carolina de Jesus, por exemplo, subverteu a lógica da ignorância que jogou livros no lixo: salvando os livros do lixo, Carolina de Jesus subversivamente produziu riquezas de ideias e afetos que não se compram ou vendem no “mercado”. No filme Meu amigo Nietzsche, o menino também salvou a filosofia do lixo, subvertendo assim a pobreza e a exclusão. Arthur Bispo do Rosário subverteu o lugar de louco no qual o confinaram, e com a arte subverteu nossa compreensão do que é a lucidez.  

Sem dúvida, é fundamental subverter a visão eurocentrada da filosofia, para assim afirmamos o pensar original que brota das nossas periferias e lugares de exclusão. Às vezes, para despertamos o filosofar é preciso subverter a lógica acadêmica da filosofia , e assim unir o pensamento à vida.

 



[1] Texto-aula elaborado pelo prof. Elton Luiz.









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