No poema “Achadouros”,
Manoel de Barros nos fala de uma sábia contadora de histórias que ele conheceu
quando criança. A sábia ensinava haver “achadouros” em Corumbá.
No sentido literal, os
“achadouros” eram buracos que os holandeses cavaram antes de fugirem do Brasil
séculos atrás.
Com o ouro surrupiado do
rico subsolo de nossa ancestral Pindorama, os holandeses fabricaram moedas nas
quais estamparam a coroa holandesa. Depois eles esconderam essas moedas de ouro
nos tais buracos abertos no fundo de quintais, para que não ficassem com elas
os colonizadores da coroa portuguesa, seus rivais.
Durante muito tempo em
Corumbá, movidos pelo desejo de encontrar tais tesouros, os homens escavaram
quintais para ver se ali achavam o ouro rapinado pelos colonizadores.
Mas o poeta compreendeu
que a sábia falava também de outros “achadouros”, enquanto espaços a descobrir que
guardavam diferentes tesouros.
Seguindo a lição da
sábia, o poeta aprendeu a descobrir “achadouros” onde estão guardadas
riquezas que não vêm da usurpação do
homem sobre o outro, riquezas que são, para a vida digna, verdadeiramente
preciosas: escavando a palavra, o poeta acha nela sentidos novos não
colonizados; escavando em si mesmo, o poeta acha horizontamentos libertários
que partilha com os outros.
Com sua arte que faz
pensar, sentir e desperta, o poeta “desabre” nossos habituais olhos que o leem para
que em nós achemos, quem sabe, olhares novos.
E toda essa riqueza que o poeta acha, e generosamente partilha
conosco, vem da potência transbordante de vida que, empoemando-o, guardou-se
dentro do poeta como tesouro, cujo valor não se mede em moeda, capital ou ouro.
“Na ponta do meu lápis tem apenas nascimento” é um verso de Manoel.
Esse verso pode ser interpretado de muitas maneiras . O lápis expressa o
veículo de expressão do poeta, o instrumento que une sua mente e corpo. Na
ponta do lápis do poeta nascem ideias que fazem nascer também ideias em quem o
lê. Esse ato de dar nascimento a realidades que potencializam a vida pode ser
um antídoto à necropolítica, e é por
isso que esse verso também é, em sua essência, político.
Em breve, colocarei a programação completa do evento.
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