No poema “Achadouros” , Manoel de Barros nos fala de uma senhora, a "negra Pombada, remanescente
de escravos do Recife", que contava
aos meninos sobre Corumbá ter “achadouros” , que eram buracos feitos pelos
holandeses em seus quintais para
esconder suas moedas de ouro, antes de fugirem apressadamente do Brasil.
Durante muito tempo em Corumbá, movidos pelo desejo de encontrar tais tesouros,
os homens escavaram quintais para ver se
ali achavam ouro.O poeta é aquele que busca os achadouros também, mas o tesouro
que ele deseja é outro : ele escava o ordinário e ali acha o extraordinário;
ele escava o habitual e neste acha o incomum; ele cava em si mesmo e dentro de
si ele acha o mundo ainda por descobrir. Ele acha, em meio ao barro, ao húmus,
ele acha/inventa o ouro de uma vida da qual nunca cessam os inauguramentos.
Nietzsche dizia que o novo sempre
é novo, o estabelecido sempre o foi.É uma ilusão nascida da idéia de progresso (
e que faz par com a idéia de decadência) supor que o que hoje é estabelecido um
dia foi novo, ou o que hoje é novo um dia será o estabelecido. O novo sempre
foi, é e será novo. Ele antecede, sucede e é coetâneo a si mesmo, como
metamorfose. A infância não é apenas
uma época passada reportada a uma fase
da vida, a infância é "semente da
palavra". Aquilo que é realmente
novo, sempre o foi e será; por outro lado, aquilo que é o estabelecido, o
"acostumado" ( diria o poeta), sempre o foi e o será também. O novo nunca
será o estabelecido, e o estabelecido nunca foi , outrora, o novo.É uma ilusão
nascida do tempo concebido linearmente
supor que o novo hoje será, amanhã, o estabelecido; ou que o estabelecido hoje
foi, ontem, o novo. Essa ilusão escamoteia um pré-julgamento: o que faz do
estabelecido o critério para conhecer o novo. O estabelecido é a gramática, o
"saber em tomos", a "expressão reta"; o novo é a agramática, a ignorãça, a
infância da palavra, o feto dos nomes. O novo nunca é território: ele é
sempre agente de desterritorializações.Os objetos viram sucatas: "Vi que
tudo o que o homem fabrica vira sucata: bicicleta, avião, automóvel (...).Até
nave espacial vira sucata" (2010b, p. 71). Todavia, os desobjetos
poéticos são sempre fontes de invenção, e esta nunca vira sucata.
Nenhum comentário:
Postar um comentário