quarta-feira, 27 de abril de 2016

manoel de barros: a empoética terapêutica




(trecho do livro)

Podemos dizer que a poética de Manoel de Barros é uma original “empoética” sem regras ou cânones , uma vez que “empoemar” é um verbo que toda palavra conjuga quando perde seu limite utilitário (...).“Empoemando”, a palavra adquire a potência de expressar. Através desta potência, dá-se “um inauguramento de falas” que “insana”o significado habitual , gramatical e ordinário. Mas essa “insanidade”, ou agramaticalidade, produz uma verdadeira saúde : a de uma linguagem que redescobre a natureza extraordinária, singular, do sentido. Graças a essa poiésis da agramaticalidade,a linguagem é redescoberta como fonte de inauguramento de sentidos: “pelos meus textos sou mudado mais do que pelo meu existir”, revela-nos o poeta.
Empoemar as palavras é subverter os clichês e as representações que as fazem “acostumadas”. Esta empoética não possui regra de fabricação, a não ser o retirar das coisas as suas próprias regras: errar o idioma, fazer agramática.O “errar o idioma” não se faz por uma fala pessoal que se equivoca nas regras, mas por intermédio de uma “fala coletiva” que diz um sentido que foge a toda regra, que leva a própria regra a variar.
Empoemar a palavra é torná-la despalavra, verbo-substantivo onde se pode enxergar “o feto dos nomes”. Empoemar é um verbo que toda palavra pode conjugar desde que “abra seu roupão para o poeta”, e o deixe sê-la.
A essência da poética de Manoel de Barros, sua empoética terapêutica, consiste em produzir uma didática da invenção. Esta nos ensina que não apenas o poema, mas a própria Vida somente se explica como um “milagre estético”:

O menino aprendeu a usar as palavras.
Viu que podia fazer peraltagens com as palavras.
E começou a fazer peraltagens.
Foi capaz de interromper o voo de um pássaro
botando ponto no final da frase.

("O menino que carregava água na peneira", livro: Exercícios de ser criança)


( Ternura, choro de K-Ximbinho, por Conjunto Época de Ouro)




domingo, 24 de abril de 2016

manoel de barros: "o andarilho não precisa do fim para chegar"

"Poeta:
sujeito com mania de comparecer
aos próprios desencontros."

Manoel de Barros




Deixe-me ir, preciso andar...
Se alguém por mim perguntar,
diga que só vou voltar
depois que me encontrar.

Cartola


A linha de fuga é produção de uma desterritorialização
que se reterritorializa em um novo território  que não lhe pré-existe.

Deleuze & Guattari



O andarilho

“O andarilho sabe tudo sobre o nada" ( 1997, p. 47). Este nada é o dos nadifúndios .Ele anda "atoamente" , pois “vagabundear é virtude atuante para ele” ( 1997, p. 47). “Vagabundear” provém de “vaga”, “onda”. O vagar das ondas. Edmond Husserl, em seu livro Origem da Geometria, afirma existir uma proto-geometria cujo objeto de estudo são as “essências vagas”, também chamadas de “essências anexatas”. Não se deve confundir o anexato com o inexato. O anexato é inexato por essência, e não por acidente. Ele não é, portanto, uma cópia imperfeita do Exato. O anexato possui uma forma, mas é uma forma "vaga", e “vaga” é o nome que também se dá ao ritmo do mar, enquanto fluxo. A vaga expressa um ritmo, mais do que um ir em linha reta. O anexato é, como diz Manoel de Barros, uma "forma em rascunho".A forma de tudo aquilo que é anexato constitui uma passagem onde o que lhe está dentro lhe desborda, posto que em intensa variação.Enquanto a forma precária do inexato tende a se apagar, a forma em metamorfose do anexato não pára de se reinventar.
Os andarilhos não são exatamente os que andam em estradas já prontas, eles não são peregrinos ou meramente viajantes. Os andarilhos são os que inventam caminhos, sobretudo os caminhos que inauguram sentidos para a linguagem: sinto que “a estrada bota sentido em mim" ( 2010b, p. 59); o sentido está no meio da estrada, e não no seu começo ou fim.  E é talvez por isso que “o andarilho não precisa do fim para chegar”,(1996 p. 71).Os andarilhos “carregam a liberdade deles nos passos que não têm onde parar” ( 2010b, p. 168): “no fundo os andarilhos só estão apalpando a liberdade. O caminho deserto deles é viver debaixo do chapéu” (2010b, p. 124).O “caminho deserto” é um “espaço liso” no qual se produz uma linha de fuga (DELEUZE E GUATTARI, 1980).Os andarilhos não são retirantes ou imigrantes, eles são itinerantes: eles inventam itinerários.O andarilho exerce a "pré-ciência da natureza de Deus". A "pré-ciência" é conhecimento das "pré-coisas", é conhecimento daquilo que é forma em rascunho.



- Obras de Manoel de Barros consultadas:

Compêndio para uso dos pássaros. Rio de Janeiro: Livraria São José, 1961.
Gramática expositiva do chão. Rio de Janeiro: Ed. Tordos, 1969.
Arranjos para assobio. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1982.
O guardador de águas. São Paulo: Art Editora, 1989.
Gramática expositiva do chão — poesia quase toda. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1992 ( segunda edição).
Livro sobre nada. Rio de Janeiro: Record, 1996 .
Livro de pré-coisas. Rio de Janeiro: Record, 1997a.
O livro das ignorãças. Rio de Janeiro: Record, 1997b .
Retrato do artista quando coisa. Rio de Janeiro: Record, 1998.
Exercícios de ser criança. Rio de Janeiro: Salamandra, 1999.
Ensaios fotográficos. Rio de Janeiro: Record, 2000.
Memórias inventadas – a infância. São Paulo: Editora Planeta, 2003.
Concerto a céu aberto para solos de ave. Rio de Janeiro: Record, 2004.
Cantigas por um passarinho à toa. Rio de Janeiro: Record, 2005.
Memórias inventadas – a segunda infância. São Paulo: Editora Planeta, 2006.
Poemas rupestres. Rio de Janeiro: Record, 2007.
Encontros: Manoel de Barros . Rio de Janeiro, Azougue, 2010a (Org. Adalberto Müller).
Memórias inventadas - as infâncias de Manoel de Barros. São Paulo: Planeta, 2010b.
Menino do mato.São Paulo : Leya, 2010c.
Poesia completa. São Paulo: Leya, 2010d.
Escritos em verbal de ave. São Paulo : Leya, 2011.

Outras referências:

ARNHEIM, Rudolf. Arte e percepção visual: uma psicologia da visão criadora. São Paulo: Pioneira, 2000, 13ª edição.

BARBOSA, Luiz Henrique. Palavras do chão: um olhar sobre a linguagem adâmica  em Manoel de Barros. Belo Horizonte: Fumec/Annablume, 2003.

CAVALCANTI,Ana Símbolo e alegoria – a gênese da concepção de linguagem em Nietzsche. São Paulo: Annablume, 2005

DELEUZE, Gilles e GUATTARI, Félix. Kafka - pour une littérature mineure. Paris:
Minuit, 1975.

_____________. Mille plateaux. Paris: Minuit, 1980.

_____________. O que é a filosofia? Rio de Janeiro: Ed. 34,1992.

LISPECTOR, Clarice.A Descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira , 1984.

PESSOA, Fernando. O eu profundo e os outros eus.Rio de Janeiro: Nova Fronteira,2006.

RANGEL, Pedro Paulo. Manoel de Barros por Pedro Paulo Rangel.Coleção Poesia Falada, vol. 08.CD.Rio de Janeiro: Luz da Cidade, 2001.

SOUZA, Elton Luiz Leite de. Manoel de Barros: a poética do deslimite. Rio de Janeiro: 7letras/FAPERJ, 2010.


Francis Bacon Study for a Portrait of Van Gogh II, 1957













O andarilho abastece de pernas as distâncias
Manoel de Barros

sábado, 23 de abril de 2016

para além do preto e do branco...

Que pobreza, meu deus:
reduziram tudo ao preto e branco....
Mas há mais de branco neste preto
e de preto neste branco
do que imaginam aqueles que reduziram tudo ao preto-branco.

As cores ficam para depois, dizem eles.
Para quando exatamente?
Para depois que o preto destruir o branco,
ou o branco ao preto.
Mas terá de ser uma destruição completa,
dizem eles,
sem deixar resíduo do outro,
sem deixar memória, lembrança , rastro...

Assim, quando não houver mais branco para o preto odiar,
e preto para o branco,
somente assim o ódio se extinguirá
e dará vez à Verdade toda branca , se o branco ganhar;
ou toda preta, se o preto vencer.

Enfim, o Paraíso monocolor? Não...
Pois ficará a Verdade do Branco à espreita de divergências pretas,
ou a Verdade do Preto à espreita de dissensões brancas.
 E o branco justificará a impossibilidade da cor em razão do perigo do preto;
e o preto dirá o mesmo....
De tal modo que um precisa do outro ,
como o reflexo precisa do espelho.

 Mas a despeito deste preto-branco
pelo poder incolor,
a vida  reinventa-se múltipla,
mesmo na dor,
e em cor resiste na mão e na vida
dos que estão na margem.











sexta-feira, 22 de abril de 2016

manoel de barros e as "formas em rascunho"








Se  a gente não der o amor,
ele apodrece em nós.

 ***     ***

A maior riqueza de um homem é sua incompletude.

***   ***  
   
Os raminhos com que arrumo
as escoras do meu ninho
são mais firmes do que as paredes
dos grandes prédios do mundo.

     ***  ***

O menino sentenciou:
se o Nada desaparecer a poesia acaba.
E se internou na própria casca ao jeito que o
jabuti se interna.

                                                                                                                                              ***         ***            
                                                                               Não sou da informática:
sou da invencionática.

Manoel de Barros

                                                   

Segundo o poeta Manoel de Barros, somos “formas em rascunho”.Somente quem está pronto se assume assim, como “forma em rascunho" de si mesmo. Pronto não como o que está acabado e não muda mais,  mas pronto como aquilo cujo essência é o produzir e o autoproduzir-se,o autoinventar-se.Se o viver é processo, somente como forma em rascunho estaremos na vida não como a pedra está no rio, ficando imóvel enquanto ela, a vida,  passa. Uma longa tradição nos inculcou que todo rascunhar existe em razão de uma  forma pronta : o “Modelo”, e que , este sim, dá a ver o que de fato somos. Inclusive, esta forma pronta precederia ao rascunho, como a árvore ao grão, como o adulto à criança. Mas só como forma em rascunho aprenderemos a não opor mais  a verdade ao erro, o ensinar ao aprender, a forma ao processo, o modelo à invenção.A forma em rascunho refaz seus contornos em razão de uma potência que lhe é imanente, mas que não lhe é um centro, posto que é abertura.Tudo é forma em rascunho para quem aprende a  viver as coisas de dentro, como processo e metamorfose: o amor, a arte, o pensar, o corpo, o desejo, o cosmos inteiro...tudo é forma em rascunho que de dentro se vive e se afirma.



segunda-feira, 11 de abril de 2016

fiar junto

Pensamos em novelo.
Maria Gabriela Llansol

“Con-fiar”: fiar junto. Fiar é tecer.Fiar não é traçar linhas retas no espaço, fiar é inventar linhas de fuga que dão sentido ao tempo. Ariadne fiava o fio que vencia o labirinto onde o monstro morava, fio da sobrevivência, pois esse fio toma a forma do labirinto sem se perder nele, posto que  é maior do que ele.O fio de Ariadne nasce de um novelo, não nasce de régua e compasso.
Diz a exata ciência que as linhas retas são a menor distância entre dois pontos imóveis. Mas o fio que que tece narrativas alcança os mais distantes pontos e os conecta, os aproxima, para assim criar elos, ampliando-nos até eles, mesmo que eles estejam em espaços que ainda não existem: espaços desejantes de invenção e utopias.
Etimologicamente, novelo é: novo elo. Traçamos fios juntos para criar novos elos.Essa é a razão de ser do novelo: não acúmulo de linha, mas manancial de novos elos, novos agenciamentos. Mesmo um objeto pode ser um novelo, um novo elo, desde que nos coloquemos como agentes produtores dos fios , fios de sentido, que nascem deles.Um objeto não é apenas uma coisa que se usa, ele pode ser um agente de novos elos.
Arthur Bispo do Rosário viu-se preso no labirinto de seus delírios. Porém,o fio da arte o fez achar uma linha de fuga : em cada lençol , em cada roupa, em cada coberta ou casaco que lhe davam no incomunicável quarto do asilo , ele soube achar nessas coisas o novelo ainda ali vivo; na coisa pronta ele soube descobrir o processo que as fez nascer.Não havia mais camisa ou lençol, mas um novo elo para ele se achar no mundo, achando-se em si mesmo. Ele viu o novelo que  ainda vivia nas coisas  como memória, imaginação, potência, invenção, virtualidade, enfim, vida...Sua bordadura poética fez viver de novo o fio que se fiou nas coisas, para assim fazer viver no finito o infinito novelo de qual todas as coisas saíram. E quem  a isso vê, produz em si mesmo uma clínica, uma saúde.Dos fios desfiados de camisas e lençóis já quase em farrapos, Arthur soube com eles fiar as bordaduras de uma existência nova. Dos fios de um uniforme que vestia o louco, ele desfez a forma, libertou o fluxo dos fios, e com estes  inventou a capa multicolorida de um rei.

                                            (Arthur Bispo do Rosário)

São os novos elos que nos possibilitam criar linhas de fuga que vencem os labirintos.Mas não se fia esse fio sem o confiar nos elos, não se fia esse fio sem o agenciamento que todo con-fiar é.
Toda ideia é um fio que se fia junto, e o novelo do qual ela nasce é o pensar. Pois é isto o pensar: ele nada tem a ver com um ponto-ego, dado que  ele é prática de fazer novos-elos, de os criar.
O   amigo  fia a ideia  da amizade ao crer no amigo; o amante  fia o amor para amar a quem ele se une em elo. É a justiça, a ideia da justiça, que dá ao juiz o poder que ele tem, não sua toga ou paramentos: a sentença  somente é justa se for  um fio que se puxa do novelo da justiça.
Os bons encontros de que fala Espinosa são fiações, bordaduras, tessituras das relações que nascem do Novelo infinitamente infinito da Natureza.


              ( detalhe de Estandarte, obra de Arthur Bispo do Rosário)










terça-feira, 5 de abril de 2016

"é preciso transver o mundo" (Manoel de Barros)







Segundo Manoel de Barros, o poeta é aquele que possui visão fontana, uma visão que é fonte do que vê. Não é uma visão que constata o referente ou objeto; diferentemente, ela é uma visão que vê , antes, o sentido - que é a alma das coisas. Toda fonte se comunica com um fluxo invisível , que é de onde vêm as águas que nela nascem e fluem. Embora possam estar, hoje, sob o chão, tais águas já estiveram, outrora, no céu  - do qual caíram como chuva; elas já circularam também no interior dos animais, como sangue e suor ; já desceram as montanhas quando a neve derreteu; já foram orvalho nas flores, seiva nos troncos e ,nos frutos, o doce sumo; já foram lágrimas de dor, lágrimas de alegria; já foram o meio que alimentou o feto no interior da placenta. Um dia tais águas sustentaram a Terra, como nos faz crer Tales; e Cristo fez delas vinho, o sangue de toda festa; sobre elas o Espírito, um dia, andou ;hoje sobre elas se surfa, se desliza, se mergulha. E todos, insetos e humanos, flores e animais, até mesmo a Terra, todos a bebem. É esse elemento que está em tudo , e que é a Vida de tudo em processo, é este elemento o que o poeta vê e sente , primeiro nele, como metamorfose e encantamento.

sábado, 2 de abril de 2016

a ideia de democracia em espinosa

O pensamento político de Espinosa tem um ponto de apoio fundamental: a ideia de um poder instituinte originário. Somente o poder instituinte originário é, de fato, poder ontológica e democraticamente  afirmado. O poder instituinte antecede o poder constituinte: aquele institui, primeiramente, a si mesmo como fonte de todo poder instituído. O poder instituinte é sempre afirmação, jamais negação: ao afirmar-se, ele já faz desparecer todo instituído que o nega, pois nada tem mais força do que o poder instituinte originário, quando este se une a si mesmo. Afirmando-se, ele também se torna constituinte, para assim constituir novas formas de positividade jurídica e social .Todos os outros poderes ( do juiz, do policial, do deputado, do chefe do executivo, etc.) são poderes derivados, isto é, eles não existem por si: eles  somente podem ser exercidos quando não se colocam contra ou ameaçam o poder instituinte originário. Mesmo a lei é um poder derivado. Juízes servem a um poder derivado ( o poder da lex), parlamentares recebem um poder que não lhes pertence e que, por isso, pode lhes ser tirado pelo poder instituinte originário, e tão somente por este ( ou em casos previstos em lei ou regimento).
O poder instituinte é “originário” não porque esteja no passado distante. Na verdade, ele não está no passado histórico ou existe enquanto promessa de um futuro igualmente histórico.  O poder instituinte cria história, desfaz outras, em razão de um tempo que é o das  rupturas inovadoras. Ele é originário em razão de cada um ser parte dele, porém não enquanto cada um é professor, aluno, filiado a partidos ou sindicatos, igrejas ou associações. Ele é originário porque antecede a todas essas determinações sociais instituídas. E se alguém é, o tempo todo, apenas o que instituíram  que ele deveria ser, jamais este compreenderá ou fará parte do poder instituinte originário, ou compreenderá a sua força produtora. O poder instituinte originário  torna a todos artistas, mais do que teóricos ou juristas. Ninguém é, por natureza, médico, policial, deputado, presidente, etc. Tais designações são instituídas socialmente. É  o poder instituinte que institui a sociedade onde passarão a existir designações e práticas instituídas.   Tudo é instituído, menos o poder instituinte. Tudo é produzido, e assim afirma o poder instituinte do qual nasce.Nenhum outro poder  antecede o poder instituinte originário, assim como nenhuma vida pode anteceder a vida , a não ser sendo mais viva.  Manoel de Barros diz que tudo o que vem primeiro “tem primazia”. O poder instituinte originário é  o poder da primazia, e não dos privilégios.
Para a maioria dos pensadores políticos modernos que inspiraram  tanto  liberais  quanto  socialistas , o poder político nasce com a renúncia ao direito natural. Mas em Espinosa o direito natural  é irrenunciável: ele é o direito que precede o chamado direito do Estado , suas leis e sistemas de representação. O povo que renuncia ao poder de instituir torna-se servo consentido da potestas que o enfraquece e entristece.
O direito natural , em Espinosa, tem outro nome: ética. “Direito natural” não significa a existência meramente biológica ou  material. À época em que Espinosa escreveu e viveu, “natureza” era entendida como sinônimo de essência. E a essência de algo é o princípio que a faz ser, existir, agir. Assim compreendida, a natureza implica o corpo e a mente. Outra distinção importante feita por Espinosa é aquela que envolve duas noções: potentia e potestas. Esta última palavra pode ser traduzida por “poder”. Contudo, perde-se completamente o sentido da obra política de Espinosa quando também se traduz potentia por poder.Em latim, potentia também tem por sinônimo jus,  ao passo que lei é a tradução de lex. O direito natural não é lei que obriga isto ou aquilo. O direito natural também não é direito à alguma coisa. O direito natural é a própria existência que, por existir, já é direito a si mesma. Ninguém existe por obrigação, mas por uma espécie de necessidade que não se opõe à liberdade. É a lei instituída pelos homens que determina o que é justo ou injusto. Existir, porém , não pode ser algo justo. Se o fosse, haveria a possibilidade de um existir injusto. O existir é. Ele não é justo ou injusto, embora isso não signifique que existir seja indiferente ao justo e ao injusto que as leis determinam. Pois o injusto é o que diminui o direito natural, ou existência, de cada um ; o injusto é o que ameaça a potência de cada um.
A ética não pertence ao campo dos valores dicotômicos, como bem e mal, justo e injusto, lícito e ilícito. A ética é o campo da existência. Uma existência não é justa ou injusta, ela é potente ou impotente. Ser impotente significa: ser menos do que se pode ser.
 Segundo Espinosa, o homem deseja mais mandar do que obedecer. Por exemplo, a criança cresce querendo mandar, e somente o aprendizado, e não o mero castigo,  a ensina a obedecer. Mas ela não é má por querer mandar , tampouco há mais virtude em obedecer do que em mandar. O viciado obedece ao vício, preterindo o mandar em si.O falastrão obedece sua língua, mas quem sabe  guardar silêncio manda em sua boca. O homem livre não é aquele que manda nos outros, o homem livre é , antes, aquele que manda em si mesmo, que comanda a si mesmo, que tem plena posse de si. Mandar é exercer, agir; obedecer é ser passivo. Todos os homens aspiram a tal poder de comandar, embora confundam como conquistá-lo e exercê-lo, pois imaginam que o poder sobre si virá mediante o poder sobre os outros.
O que vale para um homem vale igualmente para um partido: um partido que não comanda a si mesmo quererá poder para mandar nos outros, subjugando-os. E estes outros partidos também acharão que ter poder é mandar nos outros através do Estado conquistado. Em Espinosa, a lei é um comando, nunca um comandado. Ela é um comando porque expressa um poder originário que a instituiu para ser expressão dele. Se a lei  for apenas comando de alguns, destes ela será uma comandada: ela perderá sua atividade e será, ela própria, um padecer de um poder que se colocará acima dela. Além disso, ela será vista apenas como ordem por aqueles que não a comandam. Contudo, se tal acontece, o problema não está na lei em si, mas naqueles que aceitam , sem resistência, serem comandados, submetidos àquilo que os enfraquece.
Espinosa acredita que o poder social nasceu para que os homens mandem em si mesmos sem que esse mando seja opressão ou repressão de uns poucos sobre muitos ou de muitos sobre poucos. Assim, o único poder que possibilita aos homens mandarem em si mesmos, sem que apenas alguns mandem e outros obedeçam, esse único poder é o da lei, da lex. Somente através da lei os homens mandam em si mesmos e , mandando, são livres, de tal maneira que desobedecer a lei é desobedecer a si mesmo através de uma burla feita a todos. Mas a lei, em Espinosa, não é todo o direito, ela é apenas instrumento do Direito, pois o único direito é o natural.
 A vida social nasce quando delegamos ao Estado o poder de agir por nós. Mas apenas certas coisas podem ser delegadas,  outras são indelegáveis. Nós delegamos ao Estado o poder de agir acerca de tudo aquilo que envolve a sobrevivência do corpo. Todavia, é indelegável o que concerne à existência do espírito, embora as duas existências, a do corpo e a do espírito, estejam interligadas. Delegar não é renunciar.  
As pessoas que recebem nosso poder de agir têm, por isso mesmo, o poder social. Contudo, elas também existem e , por existirem, não renunciam ao direito natural, à potência. Mas quando tais pessoas se valem do poder que receberam e, burlando as regras, tiram o máximo proveito para si mesmas, tais pessoas se colocam em uma obscura região que já não é mais a do direito natural, mas que ainda não é o social.  Essa região obscura, nem jus e nem lex, é o estado de natureza: este não é natural (potência) ou social ( potestas), ele é pré-social. Nele imperam as paixões tristes.Ele é um querer mandar na própria lei, ou um querer dobrá-la usando a força, seja a força física ou a força da moeda corrompedora.
Por natureza, a criança quer mandar, e nisto não há mal, pois não há mal na natureza. Educada, ela aprende a obedecer a lei , compreendendo esta última como comando dela mesma, de sua natureza. Mas o que caracteriza o estado de natureza é que, nele, um indivíduo sozinho , ou um grupo de indivíduos, imagina que pode  desfazer o poder da lei sem evocar a potência da ética. Somente o povo pode,   afirmando a si mesmo,  desfazer o comando da lei, quando esta já não é mais o seu próprio comado democrático, plural. Quando um ou alguns querem fugir da lei, tal ação configura crime. Mas quando o povo desfaz a lex em nome do seu direito, tal ato é uma afirmação da liberdade. Por esse motivo, a causa da corrupção e outras mazelas não é a natureza, tampouco a sociedade . A causa dessas tristezas e ódios é o furtar-se à natureza , bem como o querer comandar sem ser por intermédio das regras .  O direito natural é o campo da potência, a esfera social é o lugar das regras, já o pré-social é a obscura zona da qual alguns se servem para negar ética e regras, jus e lex.Mas quanto mais alguém deseja esconder-se nessa zona, mas este “esconder-se” aparece.
Assim como o direito natural é insuprimível,  a não ser destruindo a vida de alguém ou cometendo o genocídio de um povo,  também não se pode instituir  um campo social imune à possibilidade de alguns viverem no estado de natureza. E é para isso que existe a lex: para a defesa da pluralidade democrática. Ditaduras e fascismos criam apenas indivíduos dóceis ou dissimulados, pois toda ditadura e fascismo crê que o homem é um ser cuja natureza é má. Caberia a um Estado forte corrigir a natureza torta do homem, e extirpar os “incorrigíveis”.
Para Espinosa, a natureza humana não é torta ou reta: ela é. Além disso, a questão fundamental não é defender os contratos, mas sim garantir que eles possam ser suspensos, caso o direito natural de todos corra risco. O direito natural corre risco quando um grupo pretende destruir o instituído pondo-se no lugar da pluralidade instituinte.Apenas um indivíduo, ou um grupo de indivíduos, não têm poder para suspender o instituído pela multiplicidade instituinte. Somente  a potência instituinte tem esse poder. Por outro lado, não é por um contrato que a sociedade nasce, ela nasce por uma delegação de um comando, e não pela obrigação de obedecer a contratos.
Os contratos jurídicos são precedidos por um contrato social, assim professam os filósofos políticos clássicos. Ora, todo contrato envolve, no mínimo, duas partes, separando-as. Espinosa recusa esse modelo contratualista como fundador do liame social. Pois se a sociedade nascesse de um contrato,  de um lado se encontraria  o povo enquanto multiplicidade heterogênea, e do outro estaria o Estado (o "Um"). Mas como poderia haver contrato entre o povo e aquilo que nasce por delegação dele? Não pode o mais potente se submeter ao menos potente. Mais potente, em Espinosa, é quem é mais direito. 
Um partido, um juiz, um presidente, um deputado, etc.  recebem um poder que somente pode existir em razão da potência ou direito natural do povo ( embora a palavra "povo" não traduza muito bem a multiplicidade instituinte que constitui a multitudo). Quando  o direito instituído perde sua relação com o direito natural ( que é, inclusive, o único direito de fato ), Espinosa afirma que é preciso, nesse caso, fazer retornar  o poder àqueles que , ontologicamente, o possuem : o povo. O povo não é uma classe, o povo é uma multiplicidade heterogênea. Aqueles que mais ambicionam existir como um todo à parte, seja sob a capa de um partido ou de uma instituição do Estado, estes sempre temem a multiplicidade, e contra ela sempre acham justificativas para evitar que o poder volte à potência que o gerou.
Em certas situações onde dois ou mais grupos querem existir à parte, pondo em risco o existir plural de todos, nessas situações, preconiza Espinosa, é preciso desfazer a potestas instituída. Porém não a serviço de um grupo ou outro, mas a serviço do povo, para que novamente se ordene, planeje, proponha-se, através de ideias , e não da força, outras maneiras de instituir nova potestas por intermédio de meios legais, incluindo eleições gerais. Pois o poder nunca é posse ou um fim em si, ele é produção de meios que favoreçam a existência. Não há direito natural que possa existir sem uma sociedade, embora toda sociedade exista em razão de um direito natural que não deixa com que ela se feche ou se autodestrua em virtude de bandidos e corruptos.
Quando uma sociedade perde o vínculo com a ética, isto é, com o direito natural enquanto afirmação da heterogeneidade, quando isso acontece grupos em confronto arvorarão para si uma razão exclusiva, em guerra civil com a razão do outro grupo .Mas a razão nunca briga consigo mesma, apenas paixões brigam entre si, sobretudo as paixões tristes do ódio e da vingança  E mais violento será o confronto quanto mais todas as cores possíveis forem reduzidas ao preto e branco, ao sim e não, ao pró ou contra.

Para Espinosa, existe uma alegria passional que tem por contrário um ódio igualmente passional. Contudo, existe ainda uma alegria ativa que não tem contrário, pois é afirmação da própria vida múltipla. Do mesmo modo, existe uma democracia representativa que tem por contrário tiranias e fascismos de toda ordem. Mas existe ainda uma democracia originária, voz e expressão da multiplicidade ontologicamente existente. Essa democracia originária não é representativa: ela não pode separar-se de si mesma para, em outro plano distante de si, colocar-se como representante de si mesma. Essa democracia originária não é representativa, ela é produtiva: ela produz , sobretudo, os meios que impedem que ela seja negada, dividida em duas partes ou enfraquecida. A democracia originária produz tão somente uma coisa: democracia, pois a democracia é, ao mesmo tempo,  produtora e  produto dela mesma.









sábado, 19 de março de 2016

Cartola:corra e olha o céu ( de outono)





Eu tentei me horizontar às andorinhas.
Manoel de Barros

O plano de imanência é o horizonte absoluto.
Deleuze & Guattari


***   ***   ***




                                                           OS ACHADOUROS


                                                               Quando o sábio se vê reduzido à necessidade,
mesmo aí ele acha mais ocasiões de ofertar do que de receber,
pois ele possui um tesouro que nunca se esgota:
o de possuir a si mesmo.
Epicuro.


No poema Achadouros Manoel de Barros nos fala de uma  senhora, a "negra Pombada, remanescente de escravos do Recife", que  contava aos meninos sobre Corumbá ter “achadouros” , que eram buracos  feitos pelos   holandeses  em seus quintais para esconder suas moedas de ouro, antes de fugirem apressadamente do Brasil. Durante muito tempo em Corumbá, movidos pelo desejo de encontrar tais tesouros , os homens  escavaram  quintais para ver se ali achavam ouro.O poeta é aquele que busca os achadouros também, mas o tesouro que ele deseja é outro : ele escava o ordinário e ali acha o extraordinário; ele escava o habitual e neste acha o incomum; ele cava em si mesmo e dentro de si ele acha o mundo ainda por descobrir. Ele acha, em meio ao barro,  ao húmus, ele acha/inventa o ouro de uma vida da qual nunca cessam os inauguramentos.



(Céu de outono)




( Outono 8 )



( Paisagem de dentro vista de fora)






quarta-feira, 9 de março de 2016

o nascimento da filosofia

Quem o mais profundo pensa,
ama o mais vivo.
                            Hölderlin


A pérola que mais vale a pena buscar não é aquela que se esconde nas ostras que vivem sob as águas; a pérola mais preciosa vive no íntimo da palavra que não é apenas palavra.
                            Maimônides


- Os primeiros filósofos e a filosofia
O nome “pré-socráticos” expressa um conjunto heterogêneo de pensadores.O termo “pré” não significa que eles vieram exatamente “antes” de Sócrates no tempo. Ao contrário, alguns lhe foram contemporâneos. Assim, o termo “pré” designa uma visão da filosofia que toma Sócrates como referência e padrão.Outros ainda empregam  a expressão “pré-platônicos”, uma vez que tomam Platão como o início da filosofia.
É errada a visão que considera inexistir nos  pré-socráticos uma reflexão sobre o ser humano.Entretanto, a maior dificuldade  para a  reconstrução  dessa visão que eles possuíam do homem repousa na escassez de fontes. Poucos escritos dos pré-socráticos chegaram até nós. Sabe-se, por exemplo, que Demócrito , o atomista, teria escrito bem mais que Platão!Todavia, apenas fragmentos nos chegaram.
Segundo  argumentam Deleuze e Guattari no livro O que é a Filosofia? ( Editora 34), é com os pré-socráticos que surge, pela primeira vez, o termo “filósofo”. Este termo nasce  mais especificamente com Tales de Mileto. O filósofo veio ao mundo  antes da filosofia. O filósofo surgiu em um espaço “entre” o Ocidente e o Oriente, pois foi nessa área limítrofe das colônias da Grécia que o filósofo apareceu. Há algo do Oriente em Tales,isto é, há nele um tipo de sabedoria que não se apoia apenas em conceitos.Há nele a poesia, a alegoria, a linguagem simbólica – acompanhadas de uma intuição profunda, quase mística.Enfim, o filósofo também era, em seu berço, um poeta. Muitos pré-socráticos, até mesmo Parmênides, evocam as Musas para inspirá-los. Pitágoras, apesar de matemático, criara uma doutrina esotérica acerca da transmigração das almas, o que faz dele o primeiro filósofo a acreditar na imortalidade da alma .
A filosofia, sustentam Deleuze e Guattari,   nasceu um pouco mais tarde.A filosofia surgiu após já ter nascido o filósofo.  Enquanto este apareceu às margens da Grécia, a filosofia é fruto genuíno de Atenas, o coração do Ocidente. Para a filosofia emergir, foi preciso que o filósofo perdesse essa aura poética e mística,foi necessário que ele deixasse de ser um sábio:foi preciso que ele desse as costas para o Oriente místico.
A filosofia aparece  somente em Atenas, no auge da Grécia Clássica.A filosofia nasceu em um determinado meio político ávido por debates e disputas verbais. A Grécia de então era um meio atravessado por rivalidades de toda ordem. Nesse ambiente  era fundamental a constituição de associações. Nasce então  uma idéia muito especial de “amizade” que será considerada a base da filosofia. A filosofia seria um exercício dialogado entre aqueles que buscam a sabedoria tendo como elo uma forma muito especial, não privada, de amizade.Na Grécia Clássica, o filósofo se torna um “amigo da sabedoria”, um “amigo do conceito”. Enquanto amigo do conceito, o filósofo vai também  defender o conceito dos seus “falsos amigos”:os meros sofistas. Um amigo,um verdadeiro amigo,nunca faz seu amigo de meio para obtenção de coisas materiais. Segundo pensava Platão, os sofistas faziam da sabedoria um meio para obtenção de fama e dinheiro. Na verdade, então, eles não faziam sabedoria,mas”falsa sabedoria”, uma “aparência de sabedoria”. Sócrates, Platão e Aristóteles dedicaram boa parte de seus ensinamentos para refutar esses falsos amigos do conceito.
No Banquete, porém, Platão demonstra que o termo “philia” , presente em “philosophia”, não designa apenas “amizade”. “Philia” também significa , de forma mais profunda, “amor”. De maneira provocativa e sutil, Platão quer com isso dizer que o filósofo não é apenas um amigo do conceito: ele também é um amante do conceito, ele é um enamorado do saber. Enquanto “amigo do conceito”, podem aparecer rivais,como os sofistas.Mas como amante do conceito, o filósofo não tem rivais, uma vez que ele e a sabedoria formam uma unidade cujo elo é o amor. Aqui, Platão reata com certo misticismo pré-socrático de fundo pitagórico , no qual tinha grande importância a intuição silenciosa do Bem,isto é, daquilo que  a mera palavra não alcança (  mais tarde ,  Plotino e Santo Agostinho dedicarão belíssimas páginas a esse tema). Esse aspecto de amante da sabedoria dará ao filósofo uma condição de “estrangeiro”, isto é, de alguém que não se deixa determinar pelas convenções de uma determinada pólis. Sem dúvida, Sócrates é um personagem importantíssimo nos diálogos de Platão, talvez o mais  relevante.Todavia, importante também é o personagem apenas designado como “o estrangeiro”, isto é, aquele que porta uma fala que transcende ao estabelecido pelas leis e costumes que os homens estabelecem, de forma convencionada , em uma determinada pólis. Se a condição de “amigo” liga o filósofo aos homens, nascendo assim questões pedagógicas e políticas,  a condição de “amante” o liga ao divino que imortaliza sua alma, fazendo-a conhecer e viver a união amorosa com o Celeste.

- Principais pré-socráticos
Apesar da diversidade de doutrinas que caracteriza esse grupo de filósofos, uma questão pode ser apresentada como sendo a característica geral dos pré-socráticos: a busca pelo Um. Diante da multiplicidade de aspectos que a natureza apresenta aos órgãos da sensibilidade, os pré-socráticos buscavam a unidade que tornaria essa multiplicidade pensável e inteligível. A esta unidade eles deram um  nome: arqué.Este termo grego possui uma rica carga semântica. Os principais sentidos atribuídos a arqué são: origem, princípio, comando e causa. Os pré-socráticos empregavam arqué no sentido de causa. Perguntar sobre a  arqué era indagar acerca da causa que gerou tudo o que existe.
Diante da multiplicidade de aspectos cambiantes que nossos sentidos testemunham, o pensamento se erguia diante dessa multiplicidade e fazia uma exigência: o Um, a arqué, a causa. A pré-socrática representou o primeiro momento de tematização de um problema que acompanhará toda a filosofia , de Tales de Mileto  a Deleuze: as relações entre o Um e o Múltiplo. Se o múltiplo constitui a realidade tal como ela se apresenta aos sentidos, alcançar o Um exige outro instrumento distinto da sensibilidade. Assim, emerge igualmente nesse período uma visão de que o homem é constituído por dois princípios: a sensibilidade, necessariamente ligada ao múltiplo, sendo ela própria múltipla, e o Logos, este igualmente Um, tal como a arqué. Assim, seria o Logos o instrumento que poria o homem em contato com a arqué, com o Um.
Os primeiros pré-socráticos estão ainda muito próximos da poesia. Há neles uma visão do caráter divino da natureza. Em grego, natureza é “physis”, palavra esta cujo sentido  se reporta ao processo de  “nascer” ou “brotar”. Mais do que se pautarem pela abstração dos conceitos, eles ainda se apóiam em imagens, apesar de já se fazer presente a exigência de racionalização comandada pelo Logos.
Tales de Mileto dizia que “tudo é água”. A água seria a arqué da qual tudo nasceu. Como ele chegou a essa posição?Após a chuva, ele percebia que a natureza se renovava ou renascia. Quando estão saudáveis, os olhos estão sempre umedecidos. Do mar vêm vários seres vivos. A placenta, que é o primeiro berço de todo ser vivo, é um reservatório de água. As fontes trazem vida aos desertos. Assim, onde está a água se encontra  a vida. Por outro lado, Tales  constatou que tudo o que morre e definha vai perdendo água e secando. A terra sem umidade se torna estéril. Enfim, Tales intuiu que a água é o princípio da vida. Então, existe a água visível em suas mais variadas formas. Mas existe ainda a água enquanto arqué ou causa de tudo o que existe. Esta água universal não tem um aspecto particular, e só o logos intuitivo a pode apreender. Ela não é doce ou salgada: ela é simplesmente água, a pura água que apenas o pensamento pode intuir e conceber.
Heráclito, por sua vez, afirma que o fogo é a arqué ou o  Um do qual tudo é feito. Este Um, no entanto, reúne nele o múltiplo, de tal modo que este Um é idêntico ao movimento, ao devir. O fogo nunca fica imóvel, e é por isso que ele também é a imagem do tempo. E é isso que diz o célebre fragmento de Heráclito: “Nós não podemos entrar duas vezes no mesmo rio”. Quando saímos do rio e retornarmos para entrar nele, suas águas já passaram, assim como nós mesmos já somos “outro”. Muda o rio e mudamos nós.Nada é, tudo devém,pensava Heráclito. “Devir” significa: “vir de novo”. Cada “momento” do devir é uma repetição, um re-venir. Cada momento do devir é uma repetição dele mesmo, que sempre se repete diferente, pois nunca ele é o mesmo, assim como as águas do rio do tempo.Segundo dirá Platão, ninguém mais que Heráclito compreendeu tão perfeitamente o mundo sensível, que sempre é regido pela mudança. Hegel, Nietzsche, Bérgson e Deleuze foram muito influenciados por essa intuição heraclítica do devir.
Mas por que as coisas mudam? Heráclito dirá: “não existe um porquê”( Aristóteles , por sua vez, responderá a Heráclito afirmando que as coisas mudam para realizar um fim: a forma). Heráclito dizia que há no devir uma “inocência” pela qual o devir  constrói e destrói, tal como crianças que brincam de construir e destruir castelos de areia. Não raro, Heráclito  era visto observando crianças brincando e jogando. E a muitos ele dizia que aprendia mais com elas do que com os doutos. Para muitos, um obscuro. Para outros, o primeiro dos pensadores trágicos. Com Heráclito teria nascido o primeiro pensamento da imanência. “Imanência” provém de “i-manare”. “Manancial” se origina de manare. Manancial é a mesma coisa que “fluxo”. Assim, imanência é, literalmente, o que existe interior ao fluxo, ao devir, ao tempo. Por oposição, temos o vocábulo  “transcendência”. “Transcendência” é: “ir para além dos entes” ( no núcleo da palavra transcendência  existe o termo “ens”, “ente”).
Vale destacar outro pré-socrático: Empédocles. Ao invés de apontar para apenas um elemento como arqué, Empédocles nos diz que a causa de tudo são as quatro raízes e os dois princípios. As quatro raízes são: a água, o fogo, o ar e a terra. Os dois princípios são o Amor e o Ódio. O Amor é a Vida, ao passo que o Ódio é a morte. Sob o poder do Amor, as quatro raízes se combinam para gerar tudo o que existe, uma vez que tudo o que existe seria a união da água, da terra, do fogo e do ar. O ódio, por sua vez, é o princípio que dissolve o ser organizado e faz as quatro  raízes  voltarem a existir separadas. O ódio faz as raízes existirem sós.O ódio é a solidão.O ódio não destrói as quatro raízes, ele apenas desfaz os seres que nascem de sua união e composição. Além de realidades meramente físicas, Empédocles introduz Afetos (Amor e Ódio) na gênese do mundo. Estes afetos não estariam apenas no homem, eles não seriam tão somente subjetivos. Tais  afetos seriam também cósmicos e presidiriam, ao mesmo tempo, a vida dos homens e a vida do universo.
Outro pré-socrático importante foi Anaximandro. Com Anaximandro, o pensamento atinge graus de abstração nunca antes alcançados. Para este pensador, a arqué não é a água, o ar , a terra, o fogo ou a mera combinação deles. Para ele, a arqué não pode ser nada de determinado, pois tudo o que é determinado possui um limite, uma identidade. E tudo o que possui limites não é o todo. Assim, para ele  a arqué ou causa de tudo será chamada de Apeiron. A-peiron:o que não tem limites.Mas por quê existem as coisas com limites, as coisas finitas? A resposta de Anaximandro introduz um elemento de julgamento moral: as coisas finitas existem por uma culpa. Todo ser finito que se separa do infinito o faz por uma culpa. Dessa forma, tudo o que é limitado, por isso mesmo, sofre. O sofrimento é a condição existencial de tudo o que existe separado. Anaximandro acreditava que a sabedoria seria um processo de reatamento com o que não tem limites, o que implicava em uma regra de vida que se libertasse do império das coisas limitadas. Por exemplo, bens materiais, por maiores que sejam, são coisas com limites.Todo apego ao limitado, seja o limitado das coisas ou o limitado do “ego” ( embora Anaximandro não empregue exatamente esta palavra tão moderna),  todo apego alimenta ainda mais a culpa e o sofrimento.  Por essa razão, impede a liberdade e o pensamento.
Por fim, existiu Parmênides.Para este filósofo , a arqué não é mais nada físico, tampouco a combinação de coisas físicas.A arqué também não é, para ele, algo que se assemelhe a afetos humanos.  A arqué, porém, também não seria o infinito, o que carece de fins. Para Parmênides, a arqué, a causa de tudo, seria o Ser. E o que é o Ser?A resposta de Parmênides é seca,lacônica, e já anuncia,firmemente, o princípio fundante da  lógica: o Ser é o Ser. O Ser é idêntico a ele mesmo. O Ser não devém. Quando a água devém nuvem, ela deixa de ser água para se transformar em outra coisa. Como pode algo deixar de ser?Aceitar o devir é aceitar um paradoxo:afirmar que o não ser é.Assim, pensava Parmênides, o Ser não se move, ele não muda: ele simplesmente É. Os sentidos nos enganam: eles não nos mostram o Ser, eles nos mostram apenas as aparências. Desse modo, existiriam dois caminhos: o da Verdade, caminho este que apenas a alma pode trilhar,  e o da opinião,que é o caminho no qual reinam as aparências e ilusões nascidas de vivermos apenas a vida do corpo. O caminho da Verdade  é o do Ser,ao passo que o da opinião é o caminho da mera aparência, isto é, do não ser. Com Parmênides são esboçadas  as primeiras exigências de um pensamento lógico, que posteriormente será desenvolvido por Aristóteles;em Parmênides também se dá início à célebre  distinção entre Essência e aparência, tema este que merecerá especial atenção de Platão, e que marcará, até hoje, o vocabulário da filosofia.

- O nascimento da pólis
A arte  pode ser também um espelho que reflete não apenas a personalidade daquele que a criou. Ela também pode ir mais além, e expressar a sociedade e a época em que ela foi produzida. Daí a função pedagógica da arte,a sua “Paidéia”[1],que ensina não apenas sobre a sua especificidade enquanto obra de arte, como também sobre o mundo do qual ela foi uma expressão.
Como se sabe, a Grécia Clássica representou o período de surgimento da democracia e da filosofia. O principal fruto da democracia foi a pólis. Esta palavra costuma ser traduzida por “cidade”. Porém, existe ainda um sentido mais rico e pouco conhecido. Trata-se do termo   “organização”. Por exemplo, na palavra “própolis” encontramos esse sentido de pólis como organização ( pró-polis= a favor da organização,uma vez que a colméia é uma organização). Assim, a pólis é mais do que algo físico ou urbano. A  pólis é uma organização  que envolve também um espaço mental[2]. O homem será, ao mesmo tempo, criador da pólis e criatura dela. O homem assim compreendido será chamado de “politikos”. Em português: cidadão.
O centro da pólis era designado como “ágora”. Esta era a praça pública. “Ágora” procede de “agon” , que significa “disputa”. A ágora era um local onde se travavam disputas. O instrumento de tais disputas não eram lanças ou espadas, mas a palavra. A palavra dialogada era a base do exercício do poder na democracia nascente.  Havia uma condição para que se pudesse usar tal instrumento: que o homem que a empregasse  fosse livre e proprietário. Em grego,”propriedade” procede de “oikonomia” ( “oikos” é “casa), de onde nasce economia. Desse modo, emergem a política e a economia como espaços que deveriam ser, no entanto, mantidos separadamente: o politikos não deveria buscar o poder político para obter favorecimentos em sua esfera privada e econômica. A palavra dita em praça pública, e da qual nasciam as leis, deveria ser expressão de sua vontade em agir pelo bem comum.Tal palavra não poderia ser   mero instrumento  de interesses econômicos  particulares. A palavra também não poderia ser veículo da passionalidade,uma vez que a palavra deveria servir à razão. Uma razão política, nascida do esforço para  domar a contingência.
Mas quando surgiu exatamente este homo politikus?Este homem difere daquele que viveu à época mitológica. O homem do período mitológico viveu em um período  no qual imperavam reis e triunfavam guerreiros , enquanto muitos viviam a condição de escravos, submetendo-se àqueles. Inexistia o homem livre,  tal como o concebemos. Isto porque não havia ainda, àquela época, a democracia. O centro da vida de então era o castelo onde morava o déspota, e não a praça pública do povo.Além disso, não havia ainda uma clara delimitação , e separação, entre o universo humano e o dos deuses.Mesmo o guerreiro justificava suas ações pela influência de alguma divindade.
Porém, entre o desaparecimento do  guerreiro e o aparecimento do  cidadão há um período de passagem e transformação. Esta transformação não envolve apenas a política, pois ela também implica uma transformação mental do homem. Assim como a poesia ( a epopéia) é o melhor instrumento para compreendermos a mentalidade do homem que viveu na Grécia mitológica, há  outra arte que desempenhará papel fundamental para compreendermos essa nova mentalidade humana que emerge com a democracia. A arte em questão é o teatro.  Hoje, mal percebemos a importância que já possuiu essa arte. Todavia, essa arte está na base de constituição do homem que passa a viver no período democrático. Este período exigirá do homem uma nova relação com suas ações. Estas não poderão mais evocar a influência dos deuses como co-autores.Doravante, o homem deverá assumir-se como responsável pelos seus atos. E foi no teatro grego que esse processo de passagem foi primeiramente tematizado. Dessa maneira, o teatro também constitui um fator de educação cívica do cidadão, pela qual ele aprendia a evitar os fatores que impediam que ele se assumisse como responsável pelos seus atos. Nasce, nessa época,o primeiro esboço de uma teoria da vontade humana [3] .

- Os sofistas: o homem como o  metron de todas as coisas
Foi nesse ambiente de extrema valorização do indivíduo, e da palavra, que surgiram os Sofistas. A maioria deles veio de fora de Atenas.Por isso, não podiam exercer atividades políticas nesta capital da Grécia. A origem dos Sofistas se liga a Sicília, àquela época uma colônia grega. Nesta cidade um tirano foi deposto pelos cidadãos com a ajuda de um retórico chamado Córax. Este ajudou os cidadãos a como falar bem em público e defender suas causas diante dos juízes. Teria sido Córax o inventor da retórica. Ele teve um discípulo: Górgias. Este  deu à retórica outros fins, fins também comerciais. E foi com Górgias que nasceu o termo “sofista”, que a partir de Platão passou a ter um sentido pejorativo.
Com os sofistas, as questões cosmológicas são substituídas pelos temas antropológicos. O homem passa ao centro da reflexão filosófica. Protágoras , outro famoso sofista, resume bem essa atmosfera com o célebre pensamento: “O homem é a medida (metron) de todas as coisas: daquelas que são,na medida em que são, e daquelas que não são, na medida em que não são”.Platão,ao refutar os sofistas, dirá que apenas a Idéia pode ser a medida das coisas que se podem conhecer.
Filosoficamente, os sofistas inauguram o relativismo e perspectivismo enquanto visões do homem e do universo. Para eles, a verdade nada mais seria do que uma perspectiva que derrotou suas rivais. Eles, no entanto, eram apenas “professores”, já que não podiam exercer atividades políticas. Seus cursos eram procurados avidamente por todos aqueles que queriam vencer seus rivais em praça pública, e assim ver transformado em lei ,  e obedecido por todos, o que nascia apenas dos seus desejos e ambições.Como conseqüência, os preços das aulas subiram de tal modo que apenas os mais ricos podiam pagar. Assim, o poder econômico passou a preponderar sobre o interesse público, o que acarretou em um descrédito nas leis. Resumidamente:o caos passou a rondar a nascente democracia. E os sofistas passaram a ser perseguidos, presos e até mesmo expulsos. É nesse ambiente conturbado, política e eticamente, é nesse ambiente que surge Sócrates.

-Sócrates
Ao surgir, Sócrates teria sido confundido como mais um sofista. Inclusive, alguns inimigos de Sócrates, que são os mesmos inimigos da democracia, fizeram de tudo para manterem essa confusão até o fim , para assim tirarem proveito e condená-lo à morte,como de fato o fizeram.Mas os que se acercavam com sinceridade de Sócrates, e  o ouviam falar e questionar, estes de imediato  percebiam, não sem admirado  espanto,  que o grande dom da palavra que Sócrates possuía servia a outros fins, embora o próprio Sócrates dissesse que “apenas sabia que nada sabia”.
Entre aqueles que dele se aproximaram, havia um jovem que até então admirava os sofistas e pensava em seguir a carreira de autor de teatro. Esse jovem ainda se chamava Aristocles, mas passará à  história com outro nome:Platão. Sob o impacto do contato com Sócrates, o jovem Platão rasga seus poemas e decide se dedicar exclusivamente à filosofia (embora, até onde se sabe, nunca o velho Sócrates  teria exigido que o jovem  discípulo rasgasse poemas...).
Ao conhecer Sócrates, o jovem Platão descobre  seu caminho. Entre as muitas lições que ouviu de Sócrates, e que depois reproduzirá ( nem sempre fielmente...) em seus célebres Diálogos, uma delas merece destaque, pois essa lição também a aprenderá Aristóteles, e esta lição muito o influenciou na invenção da Lógica Dialética. A referida lição é a seguinte: “Para lutarmos contra a palavra mentirosa só temos uma arma: a palavra verdadeira”. A mera força bruta pode fazer calar a palavra mentirosa, mas não extirpa sua raiz da alma. Apenas a palavra que traz a verdade pode derrotar a palavra mentirosa . E a palavra verdadeira deve vencer a mentira à luz do dia, uma vez que a palavra mentirosa teme a luz. Ela vive da ardilosidade, da intriga e da dissimulação, uma vez que a movem interesses que vivem à sombra da razão.Assim, aquele que defende a verdade deve saber usar a palavra, pois aqueles que defendem a mentira só sabem usar a palavra, uma vez que carecem de ideias e virtudes. São as ideias e as virtudes que dão força à palavra que traz a verdade.Ou seja, o que torna as palavras verdadeiras vivamente poderosas é que elas não são apenas palavras ( flatus vocis).
Um fato marcante acerca de Sócrates é que ele dizia ouvir “uma voz interior”. Nele existiam ouvidos para ouvir essa voz que não era humana. Tomando de empréstimo uma expressão que já fazia parte da cultura grega, mas dando a ela outros fins, Sócrates  chamava essa voz interior como sendo a voz de um Daimon. Contextualizando esse termo com outro de nós mais próximo, a voz do Daimon seria a “voz da consciência”, a “voz da interioridade”. Sócrates ouvia essa voz e a  fazia de autoridade: era ela que pautava a sua conduta,e não os valores ( ou a falta deles...) dominantes. Essa interioridade que Sócrates descobre não era uma interioridade meramente psicológica. De forma mais profunda, ela era uma interioridade que o ligava ao Bem. É pelo interior que se alcança, alçando-se, o Bem.
Sócrates evocava a duplicidade de sentidos presente no termo “soma”. De “soma” nasce “somático”. “Soma” significa “corpo”.Mas “soma” também significa, em grego, “túmulo”. Sócrates explorava essa duplicidade do termo soma para indicar que o corpo era o túmulo da alma: quanto mais a alma vive apenas a vida do corpo, mais ela está como que  “morta”, morta em vida, morta para a vida do pensamento e para todos os frutos que ele pode conceber, como o fruto das virtudes; ao contrário, quanto mais a alma busca a vida que é dela própria,mais ela se percebe eterna e ao Bem busca se unir.
Outro pensamento de Sócrates muito sábio:”Conhece-te a ti mesmo”. Para ele, somente quem conhece bem uma coisa pode aperfeiçoá-la. Por exemplo,o bom sapateiro é aquele que conhece bem os sapatos. Por isso, o bom sapateiro sabe não apenas consertá-los, ele sabe igualmente  aperfeiçoá-los. O fim maior de todo conhecimento é o aperfeiçoamento. Assim, conhecer a si mesmo é aperfeiçoar a si mesmo. Sabe-se quem se conhece  pelo esforço que  faz para aperfeiçoar-se. O ignorante,ao contrário,já se acha perfeito, e é por isso que não busca verdadeiramente conhecer-se. O bom sapateiro conhece a essência dos sapatos, e é por isso que ele é capaz de melhorar os sapatos em suas existências imperfeitas. Se todo conhecer é um aperfeiçoamento, este aperfeiçoamento é praticado em razão de algo que já existe perfeito, e que funciona como modelo. Este ser perfeito é o Bem, modelo de todo aperfeiçoamento.    Conhecer a alma é, também, conhecer quem a fez. É o Bem o produtor da alma. E conhecer o Bem é fazê-lo. Sabe o que é o Bem quem o faz, pois o Bem não é matéria teórica,mas prática.
Dessa maneira, as preocupações de Sócrates versam quase que exclusivamente sobre o plano ético-moral.  É Platão que dará um estatuto epistemológico e ontológico às palavras que ouviu do seu mestre. Platão transformará em sistema aquilo que em Sócrates era vida e ação.

Referências:
BORNHEIM, G.Os filósofos pré-socráticos. São Paulo: Cultrix, 1998.
NOGARE, P. Humanismos e anti-humanismos.Petrópolis:Vozes, 1979.
VAZ, C. Antropologia filosófica I. São Paulo: Edições Loyola, 1995.
Filme sugerido:
Sócrates, de Rossellini.




[1] Para saber mais sobre o assunto: WERNER, Jaerger. Paidéia: a formação do Homem Grego. São Paulo: Martins Fontes,2001.
[2] A esse respeito: VERNANT, Jean-Pierre. “O universo espiritual da pólis”, As origens do pensamento Grego.Rio de Janeiro: Difel, 2002.
[3] Em termos estritos, a doutrina das faculdades humanas somente pôde  estabelecer-se quando a filosofia se debruçou sobre o Sujeito, fato este que caracteriza a Filosofia Moderna. No entanto, em termo lato , amplo, já existe desde os gregos , ainda que em esboço, uma tematização  de que o homem é dotado de determinadas atividades, que posteriormente serão conhecidas como “faculdades”. O principal texto a esse respeito é: VERNANT, Jean-Pierre. “Esboços da vontade na tragédia grega”. In: Mito e tragédia na Grécia antiga. Tradução Anna Lia A. de Almeida Prado, Filomena  Yoshie Hirata Garcia e Maria da Conceição M. Cavalcanti. São Paulo: Perspectiva, 1999.