sábado, 15 de junho de 2024

os padeiros...

 

Uma das palavras de origem mais rica e  bonita  é “companhia”.  Oriunda do latim “com-pane”, companhia significa : “dividir o pão”. Companheiros e companheiras: “aqueles que sabem dividir o pão.”

Além do pão que alimenta o corpo, há também o pão que nutre a alma. O primeiro pão tem preço e se compra com dinheiro, o segundo não se compra ou vende, e somente o tem quem o partilha.

 A falta do primeiro pão gera  fome ; a ausência do segundo produz tristeza,  desânimo, resignação, apatia.

Um ignorante é um desnutrido do pão que alimenta o espírito. E tal ignorante se torna ainda mais   desnutrido quando acumula egoisticamente  o pão que o dinheiro compra muito além das necessidades do  seu estômago .

Do pão que alimenta o espírito, a filosofia e a poesia são as autênticas padarias: nelas podemos achar e saborear esse pão fresquinho, quentinho, recém saído do forno. E mesmo que o livro tenha sido escrito há mais de dois mil anos , como os poemas de Heráclito ou os escritos de Lucrécio, suas ideias-pães  sempre têm o gosto da descoberta e da novidade.

Não por acaso,  “sabor” e “saber” são palavras primas. Por isso, aprender  nada tem a ver com  adestramentos para o "mercado" e suas cartilhas , muito menos bater continência servil em escola militar , mas sim   tomar gosto pelo conhecimento que liberta e  emancipa .

Espinosa e Manoel de Barros são meus padeiros preferidos. O fermento que eles empregam nos pães que produzem  também faz crescer a mente e o coração de quem  se alimenta deles , pois  generosidade é o nome desse fermento.

Além dos pães, Espinosa e Manoel também fabricam sonhos, isto é, algo que nos alimenta de lúdico. Na padaria do meu bairro de infância havia sonhos saborosos, inesquecíveis. Para quem não se lembra ou nunca viu, o sonho é uma espécie de bolinho com um recheio delicioso . Tristes sinais dos tempos: não tenho visto mais sonhos nas padarias, e carente de sonhos também andam as mentes...

Os sonhos que Manoel e Espinosa fabricam não são utopias evasivas  ou fantasias  escapistas. Os sonhos que eles produzem são os afetos ativos que nutrem   nosso sentir e nos dão  forças para perseverarmos  ainda mais vivos: críticos, mas sem perdermos a criatividade; firmes, porém sem esquecermos a gentileza; combativos, mas sem nos privarmos de poesia.






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