Uma das palavras
de origem mais rica e bonita é “companhia”. Oriunda do latim “com-pane”, companhia
significa : “dividir o pão”. Companheiros e companheiras: “aqueles que sabem
dividir o pão.”
Além do pão que
alimenta o corpo, há também o pão que nutre a alma. O primeiro pão tem preço e
se compra com dinheiro, o segundo não se compra ou vende, e somente o tem quem
o partilha.
A falta do primeiro pão gera fome ; a ausência do segundo produz
tristeza, desânimo, resignação, apatia.
Um ignorante é
um desnutrido do pão que alimenta o espírito. E tal ignorante se torna ainda
mais desnutrido quando acumula egoisticamente o pão que o dinheiro compra muito além das
necessidades do seu estômago .
Do pão que
alimenta o espírito, a filosofia e a poesia são as autênticas padarias: nelas
podemos achar e saborear esse pão fresquinho, quentinho, recém saído do forno. E
mesmo que o livro tenha sido escrito há mais de dois mil anos , como os poemas
de Heráclito ou os escritos de Lucrécio, suas ideias-pães sempre têm o gosto da descoberta e da novidade.
Não por acaso, “sabor” e “saber” são palavras primas. Por
isso, aprender nada tem a ver com adestramentos para o "mercado" e suas cartilhas , muito menos bater continência servil
em escola militar , mas sim tomar gosto
pelo conhecimento que liberta e emancipa .
Espinosa e
Manoel de Barros são meus padeiros preferidos. O fermento que eles empregam nos
pães que produzem também faz crescer a
mente e o coração de quem se alimenta
deles , pois generosidade é o nome desse
fermento.
Além dos pães,
Espinosa e Manoel também fabricam sonhos, isto é, algo que nos alimenta de
lúdico. Na padaria do meu bairro de infância havia sonhos saborosos, inesquecíveis.
Para quem não se lembra ou nunca viu, o sonho é uma espécie de bolinho com um
recheio delicioso . Tristes sinais dos tempos: não tenho visto mais sonhos nas
padarias, e carente de sonhos também andam as mentes...
Os sonhos que
Manoel e Espinosa fabricam não são utopias evasivas ou fantasias escapistas. Os sonhos que eles produzem são os
afetos ativos que nutrem nosso sentir e
nos dão forças para perseverarmos ainda mais vivos: críticos, mas sem perdermos
a criatividade; firmes, porém sem esquecermos a gentileza; combativos, mas sem nos
privarmos de poesia.
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