1- Desde
menino, o filósofo Espinosa demonstrava uma capacidade impressionante para “ler” as pessoas, possuindo o que
hoje se chama “inteligência emocional” :
um saber intuitivo acerca da natureza humana, conhecendo o que nela há de luz e de sombras.
Sabedor
disso, o pai de Espinosa, senhor Miguel,
que era comerciante, sempre pedia
conselhos ao seu filho acerca da índole de determinado devedor.
Embora tivesse
apenas 11 anos , com olhos penetrantes o menino Espinosa conseguia
distinguir quem estava em reais dificuldades (cuja dívida era perdoada) , de quem fingia aperto por mera desonestidade.
Certa vez, o
senhor Miguel nutria esse tipo de dúvida acerca de uma senhora que
lhe devia determinado valor. Ele pediu
ao menino Espinosa para ir à casa de tal senhora. O menino foi.
Quando o
menino Espinosa bateu à porta da
residência da devedora suspeita , esta apenas
entreabriu a porta , mal conseguindo
disfarçar certo nervosismo ( ela já adivinhava
o motivo da visita e conhecia a fama do menino...).
Fechando de
novo a porta, falou: “Espera um instante ,
estou lendo a Bíblia, primeiro nossos deveres com Deus”.
Ela leu bem
alto a Bíblia , de fora dava para ouvir. Depois, reabriu a porta já com o dinheiro na mão.
Ao mesmo
tempo em que colocava rapidamente a soma na mão do menino, ela disse: “As
pessoas de bem sempre leem a Bíblia e
falam de Deus, nunca se esqueça disso menino. Agora vá”, e fechou
abruptamente a porta.
Após alguns
segundos, ela ouviu novamente batidas à porta. Quando abriu, viu de novo o
menino Espinosa, que com calma, mas firmeza, lhe falou: “Minha senhora, o valor
que a senhora me deu está faltando” .
O menino
Espinosa estendeu então novamente a mão esperando receber mais do que o dinheiro faltante , ele
queria receber, sobretudo, outra coisa que faltava: a verdade.
2- Manoel
de Barros se formou em Direito. No entanto, seu primeiro cliente foi também o
último. Tratava-se de um comerciante acusado de desonestidade no uso da balança :
na hora de pesar a mercadoria, sorrateiramente ele apoiava o dedo para aumentar
o peso de forma fraudulenta.
Uma senhora
prejudicada pela desonestidade do mau comerciante resolveu
abrir um processo contra ele. Era a palavra do comerciante contra a da senhora que o acusava, pois não
havia testemunha, embora a fama do denunciado
não fosse boa...
Na primeira
vez em que esteve com o tal comerciante, Manoel pediu para conversar a sós
com ele, e indagou: “É verdade o que ela
diz? Você burlou o peso?” E o dissimulado respondeu: “É verdade. Mas fique
tranquilo: pagarei bem a você.”
Manoel
pediu licença ao farsante e foi conversar com o dono do
escritório de advocacia, dizendo: "Desisto do caso, não vou me vender para
defender as mentiras que esse desonesto inventa. A invenção de que gosto é outra: não é
invenção que nega a realidade, é invenção que , através da poesia, amplia o mundo ”.
Este é um
dos melhores documentários sobre a vida e a poética de Manoel:
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