domingo, 17 de outubro de 2021

a academia, o liceu e os jardins

 

Na entrada de sua  Academia, Platão afixou a seguinte placa: “Não entre aqui quem não for geômetra”. Isso porque na Academia só se estudavam coisas exatas:  artes  e poesia eram barradas na porta. 

Já Aristóteles criou o “Liceu”. Aristóteles preferia a biologia à matemática, e dizia  que na natureza impera também uma Ordem,  não menos  que na matemática. Para provar sua teoria, Aristóteles recolhia do jardim flores  de uma mesma espécie e dizia: “apesar de cada indivíduo ser diferente, todos nasceram de um mesmo molde : tudo o que existe se subordina a um Padrão". Quando algum aluno mais curioso e questionador aparecia com uma flor única e rara, Aristóteles tomava a flor da mão do aluno e atirava no lixo, dizendo que a diferença e a singularidade eram um erro , uma anomalia da natureza.

Havia um ponto comum entre Platão e Aristóteles: suas escolas ficavam perto do centro da cidade, próximas ao mercado.

Muito diferente era a escola dos estoicos, cujo nome se origina   de “stöa”: “portal”. Esse nome expressava o lugar no qual os estoicos abriam suas escolas: como as cidades no passado eram muradas, os estoicos escolhiam abrir suas escolas perto do portal da cidade, lugar de passagens e aberturas. Segundo eles, deve ser isto a educação: um lugar de abertura para vencermos os  muros que limitam e cerceiam. A escola  estoica era uma abertura ao cosmos, ao outro, ao corpo, enfim, à diferença: perto da Vida incercável, longe do mercado que em tudo põe um preço.

Epicuro, por sua vez, ensinava em jardins. Em vez de construir jardins em prédios de escola, Epicuro fazia dos jardins uma escola.  Enquanto Aristóteles impunha um   Padrão, Epicuro ensinava aos alunos a verem as coisas únicas . Aristóteles alfinetava num quadro borboletas mortas, ao passo que  Epicuro caminhava com seus alunos por entre borboletas voando livres. E a flor  diferente que Aristóteles jogava fora e expulsava de sua Ordem Homogênea, Epicuro a salvava e cuidava, e com ela ensinava sobre a diferença. Ser educador, para Epicuro,  era ser uma espécie de jardineiro em cujo jardim florescem flores raras.

Academia e Liceu são os nomes , até hoje, das instituições de ensino. Mas e as práticas educacionais dos estoicos e Epicuro, elas  desapareceram?  Foram extintas?

Creio que elas ainda permanecem vivas quando recriadas  nas práticas educacionais libertárias que abrem portas e cultivam a heterogeneidade : para que horizontamentos   e jardins plurais vivam ,e resistam,  na sala de aula.


“Borboleta é uma cor que avoa.”(Manoel de Barros)


( imagem: “Jardim florido com caminho”/ Van Gogh)





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