sexta-feira, 4 de março de 2022

escutas

 

Aristóteles dizia que a matéria mais importante para ser dada às crianças em fase de aprendizagem é a música. Pois com a música a criança dará importância desde cedo ao ouvir: ela perceberá  que o ouvir é meio fundamental de conhecimento.

Quando a criança crescer, ela saberá falar e argumentar bem como cidadão democrático, pois o bom argumentador é aquele que sabe ouvir o outro antes de falar, mesmo que seja para discordar do outro. Em geral, quem fala e argumenta mal é porque  não sabe ouvir.

Os tiranos, por sua vez, dão apenas ordens raivosas porque seus ouvidos são obstruídos à voz diferente do outro. Quem despreza a voz do outro quer sempre ouvir “amém”.

E as “Verdades” dos paranoicos nascem de eles ouvirem  apenas a si mesmos, muitas vezes crendo, delirantemente, que a voz alienada deles é a voz mesma de Deus.  

Quase todas as guerras são mentadas por vozes internas que os paranoicos ouvem ordenando que eles ataquem antes de serem atacados, e muitas vezes os paranoicos creem que essa voz que ordena a violência é a própria “voz da razão”.  

Nietzsche dizia que nossos ouvidos são labirintos nos quais se perdem os tolos que apenas ouvem “para dentro”, escutando somente  a voz reativa do próprio ego. Segundo Nietzsche, somente o Fio de Ariadne , fio vital da arte,  pode nos salvar quando o ouvimos,  inclusive nos salvar de nós mesmos, pois esse fio vem de fora:  fio libertário que vem da Vida e nos leva até ao coração dela.   

Heidegger  ensinava  que o pensar não começa no ego, mas no ouvir a “voz do Ser”. E quem ouve essa voz aprende a ter o que dizer: uns o dizem falando, outros o dizem cantando, e mesmo o silêncio também pode muito dizer. E quem é privado do órgão material da audição  aprende a ouvir com a mente.

Os processos clínicos nos fazem muito falar, para que enfim possamos, com ajuda do terapeuta, começarmos a nos ouvir.

Podem reparar: os intolerantes, os juízes e promotores persecutórios, os machistas, os preconceituosos, os inábeis para a amizade, os ignorantes, os fanáticos de toda espécie, os violentos , os fascistas...Todos esses em geral  falam muito, quase sempre gritando, porém  são surdos existencialmente. Talvez porque , inconscientemente, os desespere o fato de que nada têm a dizer.  

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