sábado, 30 de novembro de 2019

a utopia imanente


Deleuze e Guattari  diferenciam “múltiplo” de “multiplicidade”. Ambas as ideias podem ser expressas em uma fórmula. A fórmula do múltiplo é “n + 1”, já a fórmula da multiplicidade é “n -1”.  Nessas fórmulas,  a letra “n” significa uma quantidade que não pode ser determinada por um número fixo ou exato, já o número “1” simboliza a ideia de “unidade”. Assim, muitas coisas aparentemente são múltiplas , porém pode ocorrer de uma instância se colocar  acima delas como detentora do  poder sobre elas, isto é, como o “1” excludente querendo-se  superior .Os rebanhos, por exemplo, têm múltiplos elementos, porém um pastor os governa impondo-lhes "Uma" verdade. O risco que  todo partido corre  , mesmo os que se definem como democráticos, é   quando o 1 que se originou  do múltiplo esquece essa origem e passa a se comportar de forma centralizadora,  como se fosse  dono do múltiplo.  E assim nascem os dogmas, as “cartilhas”, bem como as perseguições aos “hereges”.
A multiplicidade é “n-1”: ela é diversidade aberta que impede que se descole dela, querendo pôr-se acima,  algum elemento dela com a pretensão de ser o 1.  O sinal de  menos expressa que a multiplicidade nunca se subtrai a si própria.
 Na fórmula “n+ 1”, o “1”  é o poder e “n” é  o múltiplo governado por esse  poder, ao passo que  “n -1”  expressa a multiplicidade  como potência autogovernada e em expansão, afirmando-se. A democracia representativa é  “n+1”, e é por esse motivo  que se valendo disso às vezes são eleitos tiranos que colocam a própria  democracia representativa sob  risco. Mas a democracia enquanto potência da própria vida  é sempre “n -1”. Espinosa chamava essa democracia de “multitudo”, Deleuze e Guattari a nomeiam “rizoma” : a “utopia imanente”.

(imagem: na ruas do Chile, enquanto  parte da multitudo , a bailarina salta para afirmar a arte contra a barbárie do   "1" que reprime o "n" de onde se originou.A própria bailarina  deu um nome ao seu salto: "O despertar")



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