(trecho da Apresentação do livro)
O livro está organizado em duas partes complementares: a primeira nos faz conhecer um Manoel Pensador, enquanto que a segunda parte reúne artigos diferentes entre si, cuja unidade está na riqueza com a qual a obra do poeta dialoga com as mais diferentes artes. Dito bem simples, as duas partes falam da ideia e da imagem, do pensamento e do corpo. Ao modo de Espinosa, podemos ainda acrescentar: o que em Manoel nos faz pensar é o mesmo que nos faz sentir, visto de uma perspectiva diferente; e o que nele nos faz sentir é o mesmo que nos faz pensar, visto de uma perspectiva diferente. É a junção dessas duas perspectivas que faz de Manoel um pop’filósofo.
A Primeira Parte busca no poeta o conceito ainda em rascunho, não mentado, nascido da artesania de Manoel: Uma sabedoria que não vem em tomos. Abrindo essa Primeira Parte se encontra o artigo de Samarone Marinho, O cotidiano primordial de Manoel de Barros. Samarone nos mostra, entre outras coisas, que a poética de Manoel se apoia em uma matéria: o cotidiano. Não o cotidiano da vida acostumada, “mesmal”. O cotidiano do poeta é um espaço de transfiguração e transvisão, no qual se descobre o valor do inútil e das desimportâncias. É nesse lugar, que também é um lugar de linguagem, que o poeta celebra as grandezas do ínfimo. O pensar do poeta não começa no Céu ou nas Abstrações, ele começa no cotidiano. E quem faz do pensar o seu cotidiano nunca mais pensa acostumado.
No artigo seguinte, Geopoética de Manoel de Barros, em dois movimentos e um adagietto , o filósofo Paulo Oneto descobre que o chão de Manoel não é o da pedra nua e fria, mas o da terra úmida, íntima do fluxo das águas, águas estas que animam o chão do pantanal, fazendo-o território liso afim aos nômades, como Espinosa , Deleuze, Nietzsche e , antes de tudo, ao próprio Paulo, que musica esse heterogêneo fluxo, essa heterogênese. Tal geografia dos fluxos constitui uma música dos elementos que o poeta reúne, sem totalizá-los ou sistematizá-los. Por isso, a imagem escolhida pelo autor: os movimentos ou andamentos musicais agenciados ao poeta-andaleço. Música naturante, barroca, barriana.
No terceiro artigo, Manoel de Barros e a Desfilosofia, rascunho uma desfilosofia inspirada na poética de Manoel. A desfilosofia não é uma filosofia poética, tampouco uma poesia filosófica. A desfilosofia é filosofia, porém aberta à sua origem não conceitual, origem essa somente alcançável pela conexão com o prefixo “des”, aqui funcionando como um “agenciador conceitual” extraído da Oficina do poeta.
Fechando a Primeira Parte, no artigo De Viena ao Pantanal – o (in)expresso do pensamento no sentido do poético , o filósofo Antônio Jardim nos apresenta uma rica aproximação entre o filósofo Wittgenstein , um dos mais importantes pensadores da linguagem, e o nosso poeta. No diálogo do filósofo com o poeta, cerzido por Jardim,o tema não poderia ser outro: o que é o sentido?
A Segunda Parte reúne artigos cujo fio condutor é um afloramento de falas que a poética de Manoel suscita e provoca. São ensaios, didáticas da invenção manoelinas, formas em rascunho de ideias, perceptos e sensações, nascidos do agenciamento da poética de Manoel com áreas diversas, unidas ao poeta pelo olhar singular de cada autor.
Para não estragar a surpresa que tais ensaios/didáticas envolvem, deixaremos ao leitor a descoberta a ser feita no encontro com as despalavras da professora e pesquisadora Ieda Tucherman (Devires e revires e de corpos e palavras ou do supremo valor da inutilidade), da bailarina Mariana Hilgert (Ensaio poético-imagético ou um porta-retrato ), do poeta e filósofo Mário Bruno (Passarinhos de uma demolição) e do cineasta Gabraz Sanna (Pequena abertura para o deserto ).
Como Conclusão do livro, o pesquisador Luiz Henrique Barbosa apresenta um muito oportuno estudo cujo título nos lembra a singularidade incomparável do poeta: O não lugar ocupado pela poesia de Manoel de Barros na literatura brasileira.
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