A servidão involuntária é aquela na
qual um tirano impõe à força sua vontade a alguém ou a um povo , cuja liberdade
é assim roubada. Acontece algo diferente com a servidão voluntária: ela não é a
liberdade roubada, ela é a liberdade alienada . A servidão voluntária tem
várias formas e maneiras de acontecer. Ela ocorre quando alguém se submete a um
tirano por livre vontade , porém com a expectativa de também poder ser tirano e
exercer poder autoritário sobre a vida dos outros. Muitas coisas podem servir
de tirano para os que têm pendão para a servidão voluntária, mas nada faz hoje
tantos servos quanto o cassino financeiro e seus juros, o protofascismo e a
ignorância digitalizada. Há ainda os que se dizem “servos de Deus” somente para
ter poder político e exercer tirania sobre os outros. O mecanismo psicológico e
político da servidão voluntária não é querer ser servo , e sim tirano. Todo tirano
imagina que ser forte é encontrar alguém mais servil e medíocre que se ponha de
joelho diante de sua opinião, credo ou farda. A tirania é , no fundo, uma
fraqueza de ideias, de argumentos, enfim, uma fraqueza de vida que muitas vezes
se esconde atrás da violência e da intolerância. Desconfiem sempre daqueles que
dizem “sou servo da Lei” ou “ sou servo da Verdade” , pois o que estes querem
na realidade é ser tiranos de toga ou de dogmas. Além disso , dizer-se servo da
Lei ou da Verdade não significa a mesma coisa que ter amor à Justiça ou às
ideias, pois amar o que liberta é o
que dá força e justifica o desobedecer que enfrenta a servidão.
“É servo aquele que não se pertence.
É aos escravos, e não aos homens livres, que se dá um prêmio para os recompensar
por se terem comportado bem.” (Espinosa)
Espinosa dizia que ninguém é livre apenas
pensando teoricamente , sem agir ; tampouco é livre quem imagina que
pode agir livremente sem pensar o que
faz. Para Espinosa, quando a gente pensa de forma livre ( isto é, potente)
desse pensar nasce necessariamente um agir que não tem por motor apenas a vontade, mas todo o corpo,
incluindo nosso desejo e aquilo que em nós ainda tem força para se indignar.
Quem apenas pensa ideias libertárias porém não age a partir delas, na verdade
não pensa: apenas imagina que pensa.
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