domingo, 14 de maio de 2023

Pachamamas...

 

Eu nasci de cesariana. Para justificar a necessidade da cesariana, o médico disse à minha mãe que eu estava numa posição diferente no ventre dela, parecia que eu queria , ao invés de vir para fora, parecia que eu queria ir para dentro do coração de minha mãe...

Mal sabia o médico que lá de dentro do ventre de minha mãe eu ouvia vozes muito estranhas vindas de fora , vozes de gente autoritária e cheia de ódio, vozes de censura e ameaça. Eram as vozes dos milicos da ditadura que dominavam o país àquela época.

Querendo me afastar daquelas vozes falocráticas, fui cada vez mais em direção ao som do bater do coração de minha mãe, hino amoroso de Gaia e Pachamama, símbolos da Mãe-Terra. Eu queria ir para dentro do coração da Mãe-Terra e nascer dentro dela, pois ali os cultuadores da morte não alcançam.

Sócrates dizia que a filosofia é uma espécie de “maiêutica”. A palavra “maiêutica” significa : “arte de partejar e trazer ao mundo”. Em Sócrates, o parteiro é a razão. Que me perdoe o grande filósofo grego, mas nascem com mais amor à vida os que  são partejados pelo coração da Mãe-Terra, expresso na mãe pessoal de cada um.

Mas descobri que o coração não tem porta: aqueles que nos amam de verdade já nos trazem  lá dentro do coração deles  desde toda a eternidade, ensina Espinosa. Esse guardar no coração é a prática mais potente do cuidado com o outro de nós diferente, seja esse outro o  filho, o amigo ou simplesmente o outro cidadão, espelho da alteridade.

Os médicos tiveram dificuldades para me tirar lá de dentro de minha mãe...rs...Só aceitei sair quando consegui trazer o coração da Mãe-Terra comigo, para ser meu escudo  para me proteger na luta contra os inimigos   do pensamento, da alegria, da educação, da arte, enfim, os inimigos da vida.

E descobri que com esse escudo nunca se luta sozinho: pois atrás desse escudo sempre vêm se juntar os que lutam do lado certo.


( imagem: “O abraço amoroso de Pachamama”/ Frida Kahlo)





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