Segundo a mitologia, assim nasceu a
“Theoria”:
Zeus às vezes se comportava como um
machista ao usar artimanhas para
enganar Hera, sua companheira.
Desejando conhecer as faces que Zeus lhe ocultava, Hera quis ter
olhos mais potentes para saber como Zeus
agia e se comportava quando não estava sob o olhar dela.
Hera desejava vencer a ignorância
e encontrar um meio de ver Zeus
de forma mais ampla.
Então, Hera pede ajuda a Panoptes, cujo nome significa
“visão por toda parte” ( a palavra “panóptico” , termo empregado por Foucault, origina-se de “panoptes”).
Para ser o instrumento de
potencialização dos olhos de Hera,
Panoptes se metamorfoseou então num animal : o pavão, em cuja cauda há
infindáveis olhos desenhados.
Quando se abre em leque, a cauda do
pavão lembra , na forma e cores, o nascer do sol. Por isso, em muitas culturas a
cauda do pavão aberta é o símbolo da “iluminação espiritual ” que vence as
trevas.
Os incontáveis olhos do pavão
apreendiam Zeus por vários ângulos, e
viam até mesmo as faces ocultas que são incapazes de ver apenas dois
olhos.
Os gregos chamaram de “theoria” a
esse olhar que vê a realidade sob várias perspectivas, e não apenas a partir do
ego. “Theoria” tem a mesma raiz de “theatro” : “lugar para ver ”.
O oposto de theoria é “doxa”, a mera opinião. A doxa/opinião olha
para as coisas fiando-se apenas nos dois olhos que cada um tem, reduzindo a
complexidade da realidade a uma narrativa
estreita e pobre. Comparada com a theoria, a doxa é uma espécie de cegueira da
alma.
O “lugar de fala” também deve ser um lugar
onde se exerça o olhar: o olhar no qual nasce o sol do conhecimento deve sempre expressar um lugar social plural que promova a educação emancipadora, antídoto
da intolerância e da idiotia obscurantista.
Do lugar estreito da “doxa” quase sempre nasce uma fala egoica e reativa. Quando essa fala adquire poder político ou
militar, torna-se uma fala autoritária e persecutória das falas diferentes dela.
Assim compreendida , a teoria não é
abstração, e sim o que une ideia e ação.
Os meios de luta da teoria são o lápis,
o caderno, os livros, a pesquisa, o
ensino e o aprendizado; já a opinião reativa se arma com intolerâncias, fanatismos, ignorâncias...E
quando se sente acuada, a opinião ressentida nos ameaça com armas literais
mesmo, como as que usam os milicos e a milícia.
Potencializando nosso olhar, a teoria
emancipadora, ao mesmo tempo crítica e criativa, procura abarcar a realidade sob várias e diferentes perspectivas, e é por
isso que da teoria assim compreendida nascem a
educação, a ciência e a filosofia .
( este livro é apenas uma sugestão de
leitura, tive a alegria e a honra de ter sido aluno do grande Junito)
(Imagem: "Hera, Zeus e o pavão" / fragmento de uma pintura de Rubens)
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