Quanto mais lados um polígono possui,
mais próximo ele está do círculo. Um triângulo possui três lados, o quadrado
possui quatro. O quadrado está mais próximo do círculo do que o triângulo. O
hectágono, polígono que tem cem lados, está mais próximo do círculo do que o
quadrado. O megágono, polígono de um milhão de lados, encontra-se mais próximo
do círculo do que o hectágono.Um bilhão de lados possui o gigágono, e isto o
faz estar mais próximo do círculo ainda. Mas acima do gigágono existem ainda
outros incontáveis polígonos com mais lados ainda, todos se superando em estar
mais próximo do círculo. Um círculo, porém, não possui um trilhão ou um
quatrilhão de lados, pois ele simplesmente não possui lados.
Por isso, a única
maneira de um polígono alcançar o círculo é se tornando um, é coincidindo com
ele. Um polígono somente pode alcançar o círculo se libertando do afã de ampliar
seus limites, pois é isto o que acontece quando ele aumenta seus lados.
Coincidir com o círculo é um “deslimite”, diria o poeta Manoel de Barros.
Comparado com um polígono que tem menos lados, o polígono de mais lados parece
que está mais perto do círculo. Mas comparados com o próprio círculo, todos os
polígonos lhe estão a igual distância, dado que o círculo é incomparável.
A ciência tenta alcançar a Vida
aumentando as teorias, tal como o polígono que aumenta seus lados achando que
assim alcançará o círculo. Física, química, biologia, matemática, sociologia,
psicologia, etc., são os lados do polígono-ciência. Contudo, mesmo que se
aumente indefinidamente a quantidade cumulativa de tais ciências, nunca elas
alcançam o todo da Vida, pois este todo é um processo, um devir. Diferentemente
da ciência , a poesia é como o círculo: sua riqueza e multiplicidade não advém
do aumento de teorias. No círculo absoluto da Vida , o pensamento , a poesia e
a vida são a mesma coisa. O círculo da Vida, porém, não tem centro ou perímetro
determinados. A Vida é um círculo cujo centro está em toda parte , sendo seu
perímetro ilimitado.
Olhado apenas nele mesmo , o círculo
é a coisa mais simples que existe. Porém quando intuímos todos os polígonos que
estão virtualmente compreendidos nele, o círculo nos aparece então como a
realidade mais complexa e rica que existe, mas sem deixar de ser simples, como
a Vida.
Não é aumentando seus lados que um
polígono pode coincidir com o círculo. Não é aumentando a inteligência que se
alcança a sabedoria; não é contando todas as estrelas que existem no universo
que se compreende intuitivamente o que é o céu; não é meramente aumentando o
número de ações que fazemos que nos tornamos ativos; não é proliferando o
número de palavras que dizemos que aprendemos a ter o que dizer. Mesmo que
tivéssemos um trilhão de dias para viver isto não significaria que , somando
esses dias, chegaríamos a viver a vida com intensidade. Quando o círculo gira
sobre seu próprio eixo, nasce assim a esfera, tal como o nosso planeta Terra .
O terraplanismo odeia toda essa riqueza ilimitada , e seu ódio-ignorância
também se dirige à própria vida diversa e múltipla, pois “planar” significa
“tornar homogêneo”, “apagar as diferenças”.
(foto: Olavo, o terraplanista...)
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