O poeta-filósofo Lucrécio afirmava
que a natureza não é só infinita, ela também é diversa. Diverso é tudo aquilo
que não pode ser totalizável, isto é, determinado por uma quantidade .
Por exemplo, quando contamos quantos
objetos têm numa caixa, após chegarmos ao último objeto totalizaremos aquela
quantidade de coisas por um número que nos dará a conhecer quantos objetos a
caixa tinha.
Os homens imaginam o universo como
uma caixa semelhante: eles imaginam o
universo como uma caixa que contém uma quantidade infinita de coisas, sendo a caixa uma única coisa.
Por isso, diz Lucrécio, a noção de “universo”
é equívoca, pois nos leva a crer/imaginar que a unidade contém a pluralidade,
tal como uma caixa com as muitas coisas que ela retém dentro dela.
Lucrécio prefere o termo pluriverso: o
pluriverso não contém uma diversidade, pois ele é a relação das coisas diversas
entre si produzindo uma diversidade sempre aberta e não totalizável.
Às vezes, nós mesmos imaginamos nosso
eu como uma caixa que contém ideias, percepções, lembranças, desejos, afetos...Na
caixa-eu estaria nossa identidade retendo-contendo
tudo o que vivemos.
Mas Lucrécio ensina que pensar é
destotalizar-se: sair da caixa e conectar-se diversamente com o diverso, libertando
o diverso que somos da caixa que, às vezes, nós mesmos somos para nós mesmos.
O diverso não pode ser contido, pois
a essência de todo diverso é fluir. Ao
invés da caixa e coisas fechadas, o pluriverso de Lucrécio é feito de fontes,
fluxos, desvios, composições, agenciamentos.
Essa ideia de que somos uma caixa vem
do poder-limitador que , para nos limitar a um tamanho menor do que podemos
ser, nos inculca a crença de que somos algo que contém uma diversidade de
coisas, quando na verdade somos uma
diversidade que sofre contida numa caixa sempre menor do que podemos ser.
O medo, a obediência, a resignação, a
superstição, o egoísmo...não estão no centro de tal caixa, pois esses aspectos limitadores são exatamente o contorno da caixa existencial que limita e diminui o homem para que ele
possa caber nos estreitos limites físicos e cognitivos que o poder dominante o
obriga a caber.
São esses limites que secam as fontes,
aprisionam os fluxos, reprimem os desvios que poderiam levar à direção nova, enfim,
impedem as composições e colocam os limitados em guerra com outros limitados, cada um lutando para manter seus limites,
tanto os indivíduos entre si quanto os Estados.
Porém , ampliar fronteiras é aumentar os limites-cercas,
muitas mantidas com arame farpado. Assim, lutam os homens por sua servidão como
se fosse por sua liberdade.
Mas como ensina o poeta-pensador Manoel
de Barros, somente o horizontar-se conquista a paz e nos desabre, por dentro e por fora.
"Com Epicuro e Lucrécio começam os verdadeiros atos de nobreza do pluralismo em filosofia."(Deleuze)
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