“Em busca do tempo
perdido” fala do mais necessário dos aprendizados, um aprendizado tão necessário
quanto difícil.
Não é um aprendizado a
ser feito por crianças a serem educadas , tampouco por adultos que pouco estudaram.
O aprendizado de que
trata a obra deve ser buscado por alguém que sabe usar as palavras e se formou
aprendendo teorias, mas que se dá conta
que as teorias já conhecidas e sabidas às vezes já não dizem nada, nada
ensinam.
Esse aprendizado ,
portanto, não é sobre palavras , ele é um aprendizado sobre o tempo. Mas não se
trata do tempo preso na gaiola
abstrata do relógio , e sim do
tempo concreto , duração intensiva
da vida e do mundo.
“Perdemos o tempo” mais do que o vivemos, enquanto ignorarmos
seu aprendizado.
O primeiro aprendizado
vem acompanhado da angústia em perceber que o “tempo que se perde” somente
sabemos dele depois que ele passa : o “mesmal” do viver resignado nos faz
perder presentemente o tempo, sem disso nos darmos conta.
O segundo aprendizado
pode vir das relações afetivas,
enquanto projetos em comum de futuro.
Quando esses projetos de futuro comum malogram e não vão em frente, tornam-se
tempo perdido que , apesar de passado, ainda pesam no presente. Essa
vivência do “tempo perdido” não se faz
sem decepção e dor. É por isso que o caminho da aprendizagem pode ser , no seu
início, doloroso.
Até que pode advir um
terceiro aprendizado : o do “tempo que se redescobre”. Aqui quem nos auxilia
é uma memória artista e clínica . Essa
memória pode nos ensinar que no passado
vivido havia realidades que não vimos, talvez porque nos cegassem o ciúme
, a insegurança ou o desejo de posse. No
seio do tempo perdido a memória não ressentida redescobre lição nova. Não
podemos mudar o passado, porém podemos evitar que ele seja um peso para o nosso
presente.
A última etapa da
aprendizagem é o “tempo redescoberto”. Esse tempo é redescoberto aqui e agora,
e não no passado. Ele não é futuro planejado , ele é o amanhã criado a partir
de agora, como antídoto à perda presente do tempo e libertação do tempo que passou .
No sentido bem amplo da
palavra, e dito de maneira simples, o tempo redescoberto é a descoberta da arte
em seu sentido existencial, enquanto potência (re)criadora da própria vida,
pessoal e coletiva.
O tempo redescoberto nos
ensina que redescobrir o tempo é redescobrir a nós mesmos, pois no tempo que se
perde e no tempo perdido somos nós mesmos que nos perdemos.
Tempo que se perde ,
tempo perdido , tempo que se redescobre e tempo redescoberto : esse é o caminho
do aprendizado cujo mestre é o tempo.
O filósofo Gilles Deleuze assim resume a lição mais importante desse aprendizado: "O aprender vem antes do ensinar.”
Trecho do filme “Lavoura arcaica” ( no vídeo, o ator Raul Cortez lê um texto de Raduan Nassar):
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