A filosofia não se expressa apenas em
palavras e teorias, pois gestos e cores também são capazes de simbolizarem o
que cada filósofo pensa. É o que faz Rafael nesta famosa obra: cada pensador é
ali representado conforme um gesto, uma expressão facial e a cor da roupa que
veste. Chama a atenção na imagem as duas figuras que estão aparentemente no
centro: Platão e Aristóteles. Os dois aparecem lado a lado, mas sob certa
tensão divergente. Parece que eles conversavam e , de repente, pararam diante
de um impasse irresolúvel. Se ao invés de pintura fosse cinema, veríamos que ,
não faz muito tempo, Aristóteles andava atrás de Platão, como discípulo. Até
que ousou pôr-se ao lado de Platão, agora já não mais seu mestre. Platão que
sempre andava à frente e sozinho, deve ter levado um susto ao ver alguém ao seu
lado, e não para lhe fazer companhia...Platão aponta para o Céu, para um Outro
Mundo como Pátria verdadeira da Alma cativa aqui na terra, enquanto Aristóteles
pondera com a mão espalmada, querendo dizer que a terra também é a nossa casa.
O livro que cada um segura reproduz o gesto da mão . Mas o centro verdadeiro da
obra não é Platão ou Aristóteles, o centro é o espaço “entre” os dois: o centro
é a Diferença. Na pintura, é chamado de “ponto de fuga” a esse centro que se
abre ao infinito. Transpondo esse espaço para a filosofia, ele se transmuta em
“linha de fuga”. Linha de fuga não é fugir ou evadir-se no imaginário, tampouco
fugir do mundo; linha de fuga é fazer fugir algo que estava aprisionado. Linha
de fuga é ato libertário. Nenhum filósofo específico ocupa esse centro, pois
esse centro é acentrado: horizonte aberto onde o pensar encontra a vida
heterogênea e múltipla. A filosofia pode ser identificada academicamente a um
filósofo, porém o pensar é essa abertura onde a própria vida está. Quando lemos
e aprendemos com um filósofo que se abre a esse centro, a gente se sente não
como estando atrás , mas andando ao lado. Ou como fazia Espinosa: conduzindo
pela mão.
“Deprecio tanto seguir como ser
seguido:
para me acompanhar aonde vou, é
preciso aprender a amar andar ao lado.” (Nietzsche)
(na postagem está apenas uma parte da obra, aqui acima está
ela inteira. À direita, vestindo um tom de vermelho mais intenso do que o de
Platão, está Plotino. Mais do que Aristóteles, talvez seja Plotino que realiza
o gesto mais antagônico ao de Platão: Plotino aponta discretamente para baixo com o dedo indicador da mão esquerda, ele aponta para a terra, querendo dizer: a terra é o céu que desceu, tudo é Uno)
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