terça-feira, 13 de fevereiro de 2024

Espinosa e a força dos afetos

 

Segundo Espinosa [1], um afeto de que padecemos somente pode ser refreado ou anulado por um afeto contrário que lhe seja mais forte. Como toda ideia que faz a mente padecer tem seu paralelo em alguma afecção que também faz padecer o corpo , não se refreia ou anula algum afeto que faz a mente padecer sem refrear ou anular a afecção correspondente que faz padecer o corpo.

Espinosa quer dizer que não se vence uma tristeza apenas teorizando sobre ela; não se refreia um ódio somente por meio intelectuais. Isso porque toda paixão triste, como tristeza e ódio, não despotencializa apenas a mente: também despotencializa o corpo. O corpo sofre uma paixão triste quando aquilo que ele faz se explica mais por uma causa externa do que por ele mesmo, tornando-o de alguma forma servo. E a força de uma paixão triste pode ser maior e suplantar a força ou potência que o corpo exerce para se manter na existência. Quando isso acontece, o corpo se mortifica .

Mas não somos apenas o efeito passivo das paixões tristes : também somos causa parcial delas. Ou seja, de certo modo participamos , ainda que parcialmente, daquilo que nos despotencializa. A compreensão desse processo é o grande efeito clínico da ética de Espinosa: não há como libertar/potencializar  a mente  sem libertar/potencializar  igualmente o corpo. 

Contudo, mesmo sabendo teoricamente disso, nada poderemos  se não produzirmos em nós um afeto que seja contrário àquele que nos despotencializa. Não se vence o ódio com o ódio, não se derrota a tristeza com tristeza, não se suplanta a injustiça com injustiça.

É o amor que pode vencer o ódio, é a alegria que pode derrotar  a tristeza, é a justiça que pode suplantar a injustiça. Esses afetos ativos têm paralelo com as afecções do corpo, para assim desapaixoná-lo do ódio, da tristeza e da injustiça, e reapaixoná-lo com paixões alegres que aumentem seu poder de agir, isto é, de existir.  









 



[1] Ética, proposição 7 da Quarta Parte.

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