A filosofia tradicional nos habituou
a imaginar que nossa essência pode ser definida de forma imutável, eterna,
levando em consideração apenas sua forma, tal como na clássica definição
aristotélica: “O homem é um animal racional”.
Espinosa subverte radicalmente essa
visão[1].
Para ele, nossa essência é o desejo, e o desejo é que aquilo que nos esforçamos
por fazer, é aquilo que de fato fazemos, aqui e agora. O desejo não concerne
apenas ao corpo, ele diz respeito ao corpo e à mente.
Quando fazemos algo que favorece
nossa essência, esta é afirmada : nossa existência, ou poder de agir, é
aumentada. Quando, ao contrário, fazemos algo que é contrário à nossa essência,
nossa existência e poder de agir são diminuídos ou refreados. Tanto num caso
com noutro, é nosso desejo que está implicado. Assim, nossa essência não é
definida a não ser quando é agida, exercida,
seja afirmando-a, seja negando-a ( no caso, tendo a nós mesmos como partícipes
daquilo que nos refreia , diminui ou boicota, numa espécie de “servidão
voluntária”).
Dessa maneira , nossa essência não é
uma forma eterna[2] e imutável,
ela é uma potência que pode aumentar ou diminuir em seu poder de agir. Quando
ela é aumentada, experimentamos alegria; quando diminuída, padecemos uma
tristeza.
[1] Ética,
Quarta Parte, da proposição 59 à 61.
[2]
Para Espinosa, nossa essência é eterna , mas não pela mesma razão alegada pela
tradição . Nossa essência não é eterna por ser pura forma em si, ela é eterna
em razão de sua causa imanente : Deus ou a Natureza em sua Infinita Potência. Nosso
desejo é a Potência de Deus não enquanto ela é Infinita, e sim enquanto é
afetada pela nossa ideia singular existindo em ato.
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