Segundo
Espinosa, padecemos, sofremos paixões, em razão de sermos partes da natureza.
Não somos um “todo à parte”, um “império dentro de um império”, somos partes da
natureza e, enquanto tal, sofremos afecções , isto é, ações de outros corpos
sobre o nosso. Dessas afecções podem
nascer ideias confusas e inadequadas na mente.
Por sermos
partes da natureza, também somos parte da natureza social: somos partes da
sociedade, somos seres históricos ( nesse ponto, há o encontro de Espinosa com
Marx...).
Os corpos
sociais agem sobre o corpo individual, produzindo assim ideias na mente que atestam os valores de um determinado campo
histórico, para o bem ou para o mal.
É por essa razão
que Espinosa afirma que não dominamos de forma absoluta os afetos, podemos agir
sobre eles de forma parcial. E a parte de nós que age para corrigir a parte que
padece, essa parte que age é causa de ideias adequadas, não é efeito de
padecimentos.
Há enunciados em Espinosa que mostram que ele também sofreu a influência de sua época histórica. Ele também padeceu e sofreu afecções das quais nasceram ideias confusas que , burlando sua melhor parte, ganharam o caminho do papel e se tornaram letra escrita.
Mas pequenos trechos da letra
escrita , tão somente, não são o testemunho para se compreender o espírito da obra, que é fruto da melhor parte de Espinosa, pela qual fala sua parte eterna que dialoga com todas as épocas históricas, sobretudo aquelas que hão de vir.
Em seu livro
sobre Espinosa, Nise faz uma critica cuidadosa, crítica de amiga, a algumas
ideias confusas da época que aparecem no texto de Espinosa ( embora Nise não
faça a ponderação que realizo aqui).
Nem todos os
críticos de Espinosa têm o cuidado de Nise. Parece que vivemos num período que
se crê o “fim da História”, e assim se converte em juiz, às vezes carrasco, de
todas as épocas históricas que nos precederam, desconhecendo que essa crítica que se auto ignora também é
histórica, e revela mais esta atual época histórica do que a época histórica na qual
viveu Espinosa.
Sem dúvida,
alguns (poucos) enunciados de Espinosa são o efeito do padecimento daquela
época histórica, porém há a virtualidade potente das ideias de Espinosa,
virtualidade ontológica essa que não pode ser reduzida àquela atualidade histórica ( e talvez seja esse o ponto de divergência
em relação a Marx...).
É essa parte
virtual de Espinosa que buscamos para dialogar
com nossa atualidade histórica, para que nossa época possa encontrar , quem
sabe, virtualidades e “linhas de fuga” que nos restituam horizontes e ar.
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