Rizomas são plantas cujas
raízes crescem horizontalmente. As folhas e flores de uma planta rizomática são
pequenas e discretas. Quem olha para a parte visível de um rizoma e o compara
com uma imponente palmeira real [1],
por exemplo, não consegue ver o verdadeiro tamanho e força dos rizomas. Pois as
raízes dos rizomas crescem logo abaixo do chão, na nervura da terra.
Suas raízes abrem-se em
todas as direções , como afluentes de um rio que nunca para. Não raro, a
extensão da raiz de um rizoma suplanta o tamanho visível de uma palmeira real,
revelando que o rizoma expressa outro tipo de nobreza: enquanto a realeza da
palmeira se mede em metros acima do chão , a nobreza dos rizomas se mede pelo
tanto que eles se horizontam cobrindo a terra.
As palmeiras reais são
símbolos do poder de castelos e palácios; mas os rizomas são plantas que
constroem pluralmente um espaço aberto , democrático. Como as árvores, os
rizomas também dão frutos , e alguns passarinhos que nidificam no chão preferem
a horizontalidade de certos rizomas para construírem seus ninhos.
Às vezes , a gente olha
para um campo e vê inúmeras flores , parecendo que cada uma existe isolada como
um ego ensimesmado. Mas se a gente pudesse olhar um pouquinho abaixo da terra,
veríamos que cada flor brota de um mesmo rizoma comum que as mantém conectadas
.
Na Grécia acreditava-se
que nos habitam três tipos de alma: a racional, a animal e a mais originária
delas: a vegetal. Tudo o que em nós é rede que conecta, é a alma
vegetal-rizomática que cuida: rede de artérias
que irrigam o corpo de sangue, ar e
vida; rede de neurônios que conectam ideias; rede de cabelos que ora se trança,
ora se solta ( como Frida Kahlo em “Raízes”...).
E o mais surpreendente é
a arte de que alguns rizomas são capazes: se tem um muro pela frente barrando o
caminho , os rizomas sobem pelo muro , descem pelo outro lado e seguem adiante
; noutras vezes, eles escalam o tronco
de certas árvores, como fazem os cipós. Depois, os rizomas exploram determinado
galho como se examinassem o peso que ele é capaz de suportar . Os rizomas então
se enrolam no galho e descem feito cordas : para que a gente possa fabricar com
elas um lúdico balanço para as crianças brincarem.
São raízes rizomáticas
assim que brotam na linguagem
brincativa-pensante do poeta: “A poesia
que brota de mim tem raízes crianceiras. ”(Manoel de Barros)
( imagem: Deleuze & Guattari
fazem do rizoma a inspiração para a criação de uma nova filosofia)
[1]
Deleuze e Guattari fazem uma distinção entre as “filosofias arborescentes” e as
“filosofias rizomáticas”. As primeiras são filosofias cuja raiz é imóvel, com
seu tronco e galhos configurando um
sistema fechado. E crescem verticalmente visando alcançar uma Transcendência
enquanto espaço antagônico à Terra. Já as filosofias rizomáticas crescem
horizontalmente: elas não se fecham em sistemas, mas se abrem em conexões que
povoam a Imanência, a Terra. Os rizomas
não possuem centro, uma vez que são multiplicidades. Filosofias arborescentes
constroem sistemas de conceitos fechados, já as filosofias rizomáticas às vezes
se expressam por aforismos, séries, cartas,
poemas ( como os pré-socráticos e Lucrécio), enfim, por redes abertas de ideias que se agenciam a redes de Afetos.
( "Raízes"/ Frida Kahlo)
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