Quando bem jovem , aprendi a gostar de rock (
progressivo) , da MPB pensante , de música clássica, de jazz...Mas eu também gostava
da autêntica música caipira, hoje rebatizada de “música sertaneja”. Porém, não
é a mesma coisa a autêntica música caipira e a atual música sertaneja.
Sem dúvida, a autêntica música
caipira também é sertaneja, pois ela nasce desses imensos sertões do Brasil.
Mas o mesmo não pode ser dito da atual música sertaneja.
Um fato pode ilustrar o que quero
dizer: aqui no Rio, em plena Barra da Tijuca, há uma churrascaria famosa
chamada “Montana Grill”. Os donos dessa churrascaria são cantores sertanejos que
posaram recentemente ao lado do miliciano.
O nome da churrascaria revela o
inconsciente colonizado deles: Montana é sertão, mas sertão dos Estados
Unidos...
Além disso, os autênticos caipiras daqui usam chapéus e calçados muito
diferentes do chapéu e botas de vaqueiro do Arizona que tanto gostam de
ostentar os sertanejos adoradores de Montana e do “fascio”.
O Movimento Antropofágico Modernista
dizia que a cultura urbana brasileira nasceu do ato de devorar ativamente a
cultura estrangeira, para assim assimilar o que vem de fora e (re)inventar o nosso jeito, a nossa
maneira.
A música sertaneja cujo referencial é Montana revela algo
antropofágico também, porém de alguém
que foi devorado passivamente pela indústria cultural estadunidense ,
mastigado como chiclete clicheroso e depois cuspido como produto musical descartável.
No ato Antropofágico Modernista somos
nós que devoramos, de forma crítica e criativa, o que vem de fora; já o sertanejo que virou trilha sonora do fascismo
é ele que é devorado pelo que vem de fora, pelo que de pior há nesse fora,
nascendo assim uma traição ao caipira autêntico ( que não devora o que vem de
fora, e sim canta a alma simples , porém
rica, do interior do Brasil, de um Brasil que ainda resiste , na agricultura
familiar , ao poder do agronegócio miliciano-sertanejo ).
Disse isso tudo para revelar que
muito senti outra perda que tivemos ontem: a do artista Rolando Boldrin, grande
contador de “causos” da fala popular-cabocla-caipira, cuja origem remonta à
ancestral cultura oral dos nossos
indígenas.
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