Espinosa dizia que há uma espécie de
“trindade obscurantista” que reduz os homens e as sociedades ao pior deles
mesmos, pondo em risco a pluralidade social , a educação e a democracia.
Essa trindade obscurantista é
composta pelos seguintes personagens ou
tipos: o escravo, o tirano e o sacerdote.
O escravo é aquele que se deixa
dominar pelas “paixões tristes”. O escravo
não apenas as sofre, o que é natural de acontecer tendo em vista a
condição humana, porém ele se alimenta delas, como se isso preenchesse algum
buraco em sua vida. O ódio, a ignorância, o medo, o ressentimento... são
exemplos de paixões tristes.
Se uma serpente nos morde, é
inevitável que em nós entre o veneno, cabendo-nos imediatamente buscar o
antídoto. Mas a paixão triste pode fazer
do homem um dependente do veneno que o enfraquece , ao mesmo tempo
maldizendo quem traz antídotos.
O tirano é quem se vale das paixões
tristes para dominar os ressentidos e ignorantes. O tirano canaliza as paixões tristes e as
emprega a seu favor, inclusive politicamente. O tirano chega ao poder não por amor à coisa pública, mas tirando
proveito das paixões tristes e as
fazendo de arma contra os que ele estigmatiza como inimigos.
O sacerdote é aquele que passa a mão sobre a
cabeça do escravo, bendizendo a ignorância .
Em geral, os sacerdotes são pequenos, e só ficam maiores do que os
escravos os mantendo ajoelhados. O sacerdote prega que a tristeza é melhor do
que a alegria, que o obedecer é melhor do que o
rebelar-se, que filosofia, ciência e arte são perigosas, “demoníacas”...
O tirano escraviza o corpo do
escravo, o sacerdote escraviza a alma. “Sacerdote”, aqui, não é exatamente uma
autoridade religiosa literal, mas um tipo
que se aplica a várias espécies de homens. Espinosa chama de poder
teológico-político a essa aliança abominável
entre tiranos e sacerdotes, cuja força cresce quanto mais o escravo
ignora sua escravidão.
O próprio Espinosa foi perseguido por
essa aliança abominável. Tentaram queimar seus livros, bani-lo e até assassiná-lo...
Mas nunca Espinosa se calou diante
desses inimigos do pensamento livre e digno. Hoje, mais do que nunca, vale sua
perseverante lição: não devemos
lamentar ou temer por uma situação
adversa, seja ela qual for; devemos buscar
compreender as causas que produziram tal situação , para assim mudá-la com a máxima potência que tivermos, nisso concentrando
nossos esforços, unindo ideia e ação, não sem
o amor e a alegria por estarmos lutando do lado certo .
Esse concentrar de esforços libertários tem um
nome: filosofia prática.
( o livro de Deleuze é apenas uma
sugestão de leitura).
Nenhum comentário:
Postar um comentário