A filosofia não é apenas teoria. A filosofia também é desejo
de produção de um modo de vida ao mesmo
tempo não servil e não autoritário , e
só a mera teoria não consegue isso.
Por isso, alguns filósofos enfatizam certas condutas a
aprender. Assim é, por exemplo, a "exortação" nos estoicos , ou a
“consolação” em Boécio, ou a "crítica" em Nietzsche, ou ainda a
"fortaleza" em Espinosa.
Talvez tenhamos perdido essa dimensão existencial da
filosofia , mais “clínica” e política do que teorética e acadêmica.
De todas as condutas
filosóficas a aprender para fazer
dela uma prática, talvez a mais necessária seja a “edificação”. É sobretudo em
Epicteto que a edificação alcança sua máxima necessidade: quando se está
perdido, “sem chão e sem teto” , a edificação é a mais necessária das artes a
aprender, dela dependendo nossa sobrevivência em épocas de terror e ocaso, como
foi aquela em que viveu Epicteto, muito parecida com os dias que correm.
A ideia de “edificação” vem da arte de construir. Em toda edificação, seja a de um “edifício” ou a de si próprio, deve-se tornar concreto um desejo para pôr de pé mais do que paredes.
Pois edificar não é fazer subir muros apenas. Edificar é pôr de pé uma
morada, um espaço ao mesmo tempo físico e afetivo, corpóreo e mental; um espaço
onde se habita, se vive, se resiste, se congrega, se recebe os amigos, se
divide o alimento, se descansa da batalha de ontem e se renovam as forças para
a batalha de amanhã.
No deserto, edificam-se fortalezas. Nas variadas formas de
batalhas, edificam-se fronts. E quando nos querem escravos, são Quilombos que
precisamos construir, dentro e fora de nós.
Edificar é a arte de pôr de pé. Quando rastejar, curvar,
prostrar , ajoelhar...são os comportamentos servilmente adaptados a esta
sombria época, edificar-se é fazer-se morada sempre aberta onde a insubmissão
pensante e atuante possa abrigar-se , manter-se viva e resistir. Para Epicteto,
"edificação" é o verdadeiro nome da educação autêntica.
Um povo somente se
põe de pé se o seu projeto maior for
edificar creches, escolas e universidades, e não bancos, quarteis e templos.
“Erguer-se... como se ergue
a aurora do seio da noite.”
(Homero, Ilíada)
Nenhum comentário:
Postar um comentário