Segundo a mitologia, Hades é a
divindade que habita a região trevosa muito abaixo da superfície da terra. Nesse
lugar nenhuma luz entra.
Certa vez, porém, Hades ouviu risos e calorosos cantos vindo da superfície. Ele subiu e viu que era Perséfone que cantava irradiando luz, cor e vida.
Ela estava com sua mãe , a deusa
Ceres. De “ceres” vem “cereal”, pois Ceres é a divindade do plantio e colheita
dos cereais.
Ceres , por sua vez, é filha de Cibele, a divindade da fertilidade. Cibele é o Feminino Ancestral
( os povos originários da América a chamam de Pachamama).
E foi em sua neta Perséfone que a fertilidade
de Cibele se tornou uma força criativa semelhante àquela que vemos no artista,
pois Perséfone é a divindade cuja arte é
fazer nascer flores: múltiplas e heterogêneas, flores de todas as cores.
Perséfone mata outra fome diferente
daquela que Ceres mata: Perséfone mata a fome de arte, de poesia e de
criatividade.
Hades se apaixonou pelas flores e
quis levá-las para enfeitar sua noite eterna. Foi uma imensa surpresa, ninguém imaginava que pudesse nascer no taciturno Hades um desejo por cores.
Num ato condenável, Hades raptou
então Perséfone para fazê-la morar lá embaixo . Porém, naquele mundo carente de
luz , de Perséfone nasciam rosas só com espinhos , sem as pétalas, flores da
dor que elas eram.
Enquanto isso, sentindo a falta de
Perséfone, Ceres ficou deserta : o grão não mais germinava nela. Havia agora
fome de pão e de beleza, de pão e de poesia, e ninguém sabia qual das duas
fomes doía mais: a primeira esvaziava o estômago, a segunda ao coração secava .
A pedido de Ceres, Zeus interveio e
foi feito então um acordo. Durante parte do ano Perséfone viveria lá embaixo
com Hades : sua ausência entre nós recebeu o nome de inverno.
Até que vem o ansiado tempo em que
Perséfone sobe de volta e enche de vida
a terra : tudo recomeça , renovado.
Hoje, as sombras não reinam somente lá embaixo, mentalidades sombrias piores
nos ameaçam aqui em cima . Apesar
disso, nada detém Perséfone , ela já está de nós próxima: nesta semana começa a
primavera, tempo em que Perséfone chega para florir de vida a terra.
Que uma primavera política possamos em outubro também criar , vencendo
nas urnas as trevas.
“O céu da teoria é cinza;
mas sempre verdejante é a árvore da
vida.” (Goethe)
“Eram os passarinhos que colocavam
primaveras nas palavras.” (Manoel de
Barros)
( imagem: “Raízes”/Frida Kahlo)
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