Segundo alguns pensadores gregos, o
tempo não tem apenas três dimensões, mas quatro. Além de passado, presente e
futuro, existe também uma quarta dimensão chamada “Kairós”. Em latim, a palavra
kairós será traduzida pelo termo “oportunus”, que também era o nome do vento
que reconduzia o navio perdido em alto mar de volta ao porto. Assim, kairós é “momento
oportuno”.
Mas quando é o momento oportuno? Não
há livro que ensine teoricamente quando é o momento oportuno. Não há fórmula ou
receita que explique como criar um momento oportuno.
Na verdade, qualquer momento pode ser
um momento oportuno, desde que saibamos nos libertar do passado e sair da
passividade no presente, para assim construirmos, aqui e agora, aquilo que
desejamos ser nosso futuro. O momento oportuno é um vento, um “Pneuma”
libertário, que nos reconduz a nós mesmos.
Descobri Godard naquela idade das
necessárias descobertas: terminando o antigo segundo grau . Era a época dos
cineclubes, espaços que nada deviam às bibliotecas enquanto lugar para
despertar o pensar. Foi nos cineclubes que descobri também Glauber Rocha , Visconti, Ettore Scola, Fellini
...
Quando a luz do filme invadia o
escuro da sala de exibição, mais do que nunca experimentávamos a metáfora do
casulo: chegávamos lagartas, porém passávamos por uma intensa metamorfose ao sermos
mudados pela luz dos filmes, saindo do
casulo do cinema com um desejo irrefreável de voar.
Antes de conhecer teoricamente Sartre
na faculdade de filosofia, foi com Godard que aprendi, vivendo, o que é o
existencialismo.
“A existência precede a essência”,
ensina Sartre. Na filosofia, é a essência que pretende definir o que um ser é.
A essência é como uma etiqueta que nos põem antes mesmo de nascermos.
“A mulher nasceu da costela do homem”, eis uma
essência que o poder falocrático
etiqueta na mulher. Mas a existencialista Simone de Beauvoir ensina: “A mulher
é quem ela quiser”.
Sartre e Simone ensinam que primeiro
a gente existe, vive, descobre, aprende, e só depois a gente se define conforme
as nossas escolhas.
Porém a existência não se define, se vive, se
(re)inventa. Não importa a idade que tenhamos: a existência é sempre nova, já,
aqui e agora.
A existência é o lugar no qual
aprendemos, vivendo, a produzir o kairós, não importa onde estejamos, se na sala de aula, na praça,
na rua, em casa ou no espaço virtual.
O filme “Viver a vida”, de Godard,
mostra uma mulher retirando de si, às
vezes com alegria , noutras com dor, as etiquetas que o poder nela colocou .
Ela descobre que viver a vida é
descobrir linhas de fugas em meio a encontros vividos, sem roteiro. Nesses
encontros, momentos oportunos são produzidos como “pneumas” pensantes que
redirecionam seu rumo.
Um dos kairós é vivido numa cena na qual a
personagem encontra um filósofo num café. Foi um kairós para ambos. Vale a pena
assistir a cena e fazer dela um kairós para nós também.
- Infelizmente, a cena completa ( de 10 minutos) não está mais disponível no youtube, apenas um trecho dela:
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