Poucos livros de filosofia nos
auxiliam tanto a compreender essa obscuridade que hoje domina parte do Brasil
quanto o livro “Tratado teológico-político”, de Espinosa.
No Prefácio
, Espinosa descreve o fenômeno da “superstição”. No fundo de toda
superstição vigora o medo. Não o medo que pode nascer em quem enfrenta reais
perigos, mas o medo ressentido que prostra.
Segundo Espinosa, é o medo o sentimento que melhor define a condição de
escravo. Esse medo alimenta a “credulidade”.
“Credulidade” não é a mesma coisa
que “fé”. A autêntica fé não nega o conhecimento, já a credulidade é negacionista
da ciência.
A fé é movida pelo amor, mas é o ódio o combustível da
credulidade. A fé busca a justiça e o perdão, a credulidade troca a cruz por
armas para doentias vinganças. A fé almeja alcançar Deus, a credulidade em tudo
vê o “Diabo”.
A credulidade não é a fé, embora
tente se apresentar como se fosse . A credulidade não é religião, é projeto de
poder obscurantista : poder teológico-político.
A credulidade é rasa, rasteira: por não
conseguir alcançar a profundidade do sentido que há nos textos sagrados, ela imagina
que berrando e gritando se fará ouvir pelo espírito santo.
A credulidade é produtora de fantasia.
Essa fantasia retroalimenta a credulidade, criando assim um
mundo à parte, mas que é visto pela credulidade como o “Mundo Verdadeiro”. Não
por acaso, a palavra “Verdade” está
sempre na boca delirante da credulidade.
Fantasia não é a mesma coisa que
criatividade. As crianças nascem fantasiosas, porém nem todas conseguem
desenvolver a criatividade.
Quando a criança, movida pelo medo,
fantasia haver um monstro debaixo da cama, o monstro é produto de sua fantasia, embora a criança
ignore isso.
Mas se a criança , ludicamente, cria uma história onde há um
monstro, ou simplesmente desenha um monstro e fabula uma narrativa , a criança aprende
que o monstro é criação de sua mente, de tal modo que, se ela o criou, também o
pode derrotar, criando igualmente o personagem corajoso que enfrentará e vencerá o monstro. Criança que assim brinca aprende a esconjurar o medo. O medo apequena
a mente, a criatividade faz a mente crescer.
Toda criança nasce fantasiosa, porém
para haver o despertar da criatividade é preciso criar meios socioeducacionais
que potencializem o imaginar pensante nas crianças.
Não por acaso, “fantasia” vem de um
personagem da mitologia chamado “Phantaso”. Esse personagem gostava de zombar
dos homens soprando em seus ouvidos coisas que hoje chamamos de “fake news”.
Os tiranos estão sempre perseguindo
os criativos e colocando “monstros”
debaixo da cama dos ignorantes, assim infantilizando, pelo medo, os homens.
Homens infantilizados são incapazes
de se autogovernarem, terminando por se
submeterem , pela credulidade, ao poder teológico-político acumpliciado com
tiranos.
“Comunista”, “vermelho”... são os “monstros”
que o poder teológico-político hoje põe debaixo da cama dos acorrentados à credulidade
, para assim fomentar o medo associado à fantasia
mórbida que delira ser um “Messias” o
perverso autoritário.
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