quinta-feira, 29 de setembro de 2022

fazer outro mundo

 

Manoel de Barros ensina  que a poesia está no “antesmente verbal”. O verbal é a palavra ( escrita ou falada). A poesia existe antesmente à palavra.

Mas esse antesmente onde vive o poético não é  como o esboço que um dia morre quando  o pintor termina o  quadro. Nunca o antesmente se deixa prender   em um atualmente que queira matá-lo .

O antesmente se parece mais com fonte, embrião e semente, dos quais nascem rios, plantas, gente. O antesmente é fonte de onde podem nascer novos mundos : mundos subjetivos ou objetivos , individuais ou coletivos.

As ideias e palavras são coisas que alguém  atualmente  pensa ou fala, porém a poesia , como lugar da criação do que ainda não foi dito ou pensado, é sempre “pré-coisa” em devir inesgotável. 

Essa realidade antesmente verbal só pode ser   experimentada  se nós mesmos  nos colocarmos antesmente a nós mesmos,    junto à vida e perto de tudo aquilo que ainda não tem nome: “As coisas sem nome são mais ditas pelas crianças” , diz Manoel de Barros.

Antes de estar na palavra, o sentido está nesse antesmente : mais como parte de mundos a criar do que como parte de livros já escritos. No antesmente onde habita, a poesia  não  é texto ou palavra ainda : ela é a própria existência que resiste  umbilicada à vida.


 

“O poeta aprende que o essencial está fora do pensamento, naquilo que força a pensar.” (Deleuze)

 

“Ensinar sobre a existência de uma realidade diferente é despertar no outro a experiência dela.” ( Étienne Souriau)

 

( foto: Manoel em seu escritório poético, rebatizado  por ele de “Oficina de Transfazer Natureza”)



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